O Oriente Médio, a hegemonia e o medo dos EUA

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Lorenzo Maria Pacini

A ideia de que o Oriente Médio não representa mais uma região estratégica central, redutível a um conflito limitado entre Israel e os palestinos, parece excessivamente otimista.

Novas perspectivas

Os povos do Oriente Médio observam atentamente para ver se Washington realmente pretende reduzir seu envolvimento na região ou se, como aconteceu com as quatro administrações anteriores, o governo do presidente americano Donald Trump também acabará atolado nas areias movediças do Oriente Médio. Para além dos slogans pomposos que acompanharam as diversas presidências americanas, os problemas na região têm se agravado progressivamente, tornando-se cada vez mais complexos, em paralelo com o aumento da interferência dos EUA.

Hoje, o governo americano invoca o princípio de “América Primeiro”, proclamando sua rejeição ao intervencionismo, à reconstrução do Estado e às guerras intermináveis. Contudo, não desistiu de sua ambição de moldar a ordem global, como demonstra a publicação da Estratégia de Segurança Nacional, que propõe uma redefinição estratégica do Oriente Médio com o objetivo de impedir a ascensão de qualquer potência dominante na região. Resta saber se essa nova tentativa será bem-sucedida, se os Estados influentes aceitarão a fórmula americana e se as populações locais tolerarão uma gestão de crises regionais que sirva apenas aos interesses de Washington. Muitas perguntas permanecem sem resposta, e só o tempo dirá o resultado da aposta de Trump, que parece ser mais uma experiência americana no Oriente Médio.

O documento da Casa Branca confirma que o Oriente Médio deixou de ser o elemento central das prioridades estratégicas dos EUA. A atenção de Washington agora se volta para o Hemisfério Ocidental e a região Indo-Pacífica, identificados como os principais palcos da competição geopolítica e econômica global.

Segundo diversos analistas, essa decisão representa uma ruptura significativa com décadas de política externa americana, durante as quais o Oriente Médio ocupou uma posição de importância absoluta. Essa reorientação levanta questões profundas sobre as consequências dessa mudança e o possível fim do que pode ser definido como a “era do Oriente Médio” da estratégia dos EUA.

Além disso, essa mudança lança uma sombra sobre o futuro dos conflitos regionais, uma vez que um vácuo de segurança resultante do desengajamento americano poderia encorajar uma escalada ainda maior, minar as perspectivas de paz e aumentar o risco de novas guerras.

Segundo diversos especialistas regionais, a estratégia afirma claramente que o Hemisfério Ocidental e a região Indo-Pacífica são agora as principais áreas de competição global, enquanto o Oriente Médio é relegado a uma área de “engajamento seletivo” baseado em interesses mútuos e limitados.

Outros observadores, no entanto, apontam que isso não seria uma retirada total, mas sim uma forma de desengajamento gradual. Os Estados Unidos permaneceriam presentes sempre que seus interesses econômicos ou de inteligência estivessem ameaçados, mas evitariam travar guerras em nome de terceiros.

Segundo essa interpretação, a redução da centralidade do Oriente Médio não implica o fim das sanções ou das operações militares contra Estados considerados perigosos aos interesses americanos. Em vez disso, sinaliza uma disposição de não mais sacrificar recursos humanos e financeiros para conter conflitos regionais que não afetam diretamente a segurança nacional dos EUA.

Essa posição está em consonância com as declarações de inúmeros funcionários de Washington, que têm reiteradamente destacado os enormes custos incorridos pelos Estados Unidos em termos financeiros e de vidas humanas, argumentando que chegou a hora de os aliados assumirem maior responsabilidade, enquanto os Estados Unidos só intervirão em caso de ameaças diretas aos seus interesses vitais.

Algo está mudando.

Em certo sentido, não é incorreto afirmar que a reclassificação do Oriente Médio na estratégia de segurança para 2025 não representa uma simples reordenação de prioridades, mas equivale a uma verdadeira declaração do fim da era do Oriente Médio na política americana, substituída pela competição com a China e a Rússia em outras frentes. Tal abordagem inevitavelmente criará um vácuo de segurança que certamente alimentará novas tensões.

Em particular, Israel terá que decidir o que fazer em relação à nova estratégia americana, que alguns já interpretaram como uma licença para varrer a região palestina, estendendo a hegemonia do projeto do Grande Israel aos países vizinhos. Israel, sem dúvida, continuará a se beneficiar do apoio logístico e de inteligência dos EUA, e ninguém limitará suas operações, mesmo que ultrapasse certas linhas vermelhas. Isso poderá desencadear uma nova corrida armamentista na região, com cada país empenhado em fortalecer suas capacidades militares para autodefesa.

É também verdade que a nova estratégia americana prioriza a defesa do território nacional — fronteiras, espaço aéreo e segurança interna — reduzindo drasticamente os compromissos globais que caracterizaram a política dos EUA desde a Guerra Fria.

O Oriente Médio, outrora central na estratégia americana, agora está relegado a uma região secundária, enquanto a competição com a China no Pacífico assume o papel de principal campo de batalha geopolítico do século. Washington abordará o Oriente Médio principalmente com base em interesses econômicos mútuos, abandonando os maciços compromissos militares do passado. Essa abordagem representa, na visão de Washington, a aplicação concreta do princípio “América Primeiro”, que vincula a segurança nacional à estabilidade econômica interna, ao combate à imigração e ao narcotráfico e à redução dos gastos militares no Oriente Médio em favor da indústria americana.

Podemos resumir dizendo que a Estratégia de Segurança Nacional não anuncia um Oriente Médio mais justo ou pacífico, mas sim uma ordem regional mais rígida, implacável e, ao mesmo tempo, mais transparente. Pela primeira vez em décadas, os Estados Unidos tratam o Oriente Médio como sugere o realismo político: uma região importante, mas não vital, cuja estabilidade só importa na medida em que impacta os interesses fundamentais americanos. Não se trata simplesmente de um documento político, mas do manifesto teórico de uma nova abordagem que rejeita a ideia pós-1991 dos Estados Unidos como o garantidor indispensável da ordem liberal global. Em seu lugar, emerge um realismo disciplinado, que avalia cada engajamento externo com base em um único critério: o benefício direto para a segurança, a prosperidade e o modo de vida americanos.

Em conclusão, Washington pode até conseguir impedir a ascensão de uma potência hegemônica no Oriente Médio, mas impor uma ordem regional baseada exclusivamente em interesses e diretrizes americanas não é algo garantido.

A ideia de que o Oriente Médio não representa mais uma região estratégica central, redutível a um conflito limitado entre Israel e os palestinos, parece excessivamente otimista. Negar a importância energética da região, a competição entre as grandes potências e o potencial de propagação do conflito não é o mesmo que eliminá-los.

A negação ou a ilusão não criam a realidade. O Oriente Médio continuará sendo crucial para o sistema internacional, e a questão palestina permanecerá uma presença constante e não resolvida que continuará a pesar sobre todos os atores envolvidos. E alguém, mais cedo ou mais tarde, responsabilizará os Estados Unidos.

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