Os operários, cujos salários foram reduzidos graças
à chantagem do desemprego e da relocalização de empresas (transferência das
plantas para o exterior), não estão sozinhos na rejeição ao livre-comércio. Os
ecologistas, os agricultores e os consumidores se uniram a eles.
por Serge Halimi // http://www.diplomatique.org.br/
Os manifestantes franceses reunidos pelo movimento
Nuit Debout [Noite em pé] esperam que uma “convergência de lutas” lhes permita
ampliar sua audiência a participantes menos jovens, menos estudados, e
inserir-se em uma dinâmica internacional. Uma de suas palavras de ordem poderia
favorecer esse duplo objetivo: a recusa aos tratados de livre-comércio.1
Os meandros dos acordos comerciais desencorajam
frequentemente as mobilizações, pois é difícil determinar qual etapa deve ser
vigiada de perto e descobrir qual dispositivo de aparência técnica dissimula
uma bomba social. Contudo, apesar do empenho dos dirigentes, dos empresários e
da mídia em seu favor, a hostilidade contra eles vai aumentando. As
mobilizações contra o Grande Mercado Transatlântico (GMT, ou Tafta, em inglês)
são imponentes na Alemanha e na Bélgica.2 Nos Estados Unidos, todos os
principais candidatos à presidência passaram a condenar a Parceria
Transpacífica (TPP, em inglês). Ora, desde o fim da Segunda Guerra Mundial o
império norte-americano desempenhou um papel de vanguarda na liberalização do
comércio. A esse respeito, a concordância de pontos de vista tem sido quase
absoluta entre os sucessivos locatários da Casa Branca, democratas ou
republicanos, de John Kennedy a Ronald Reagan, de George W. Bush a Barack
Obama. De repente, a locomotiva liberal parou.
Alegando que “as empresas interessadas unicamente
em baixos salários já se foram”, Obama não convenceu ninguém. É que os acordos
comerciais anteriores deviam já ter trazido empregos em grande número e bons
salários... Não espanta, pois, que homens tão diferentes quanto Donald Trump e
Bernie Sanders tenham lucrado eleitoralmente falando mal desses acordos.
Hillary Clinton, então, viu-se coagida a retirar o apoio que dera ao TPP quando
era secretária de Estado de Obama. Por seu turno, François Hollande apressou-se
a mudar de opinião sobre o GMT, cuja conclusão, há dois anos, esperava
acelerar...
Os operários, cujos salários foram reduzidos graças
à chantagem do desemprego e da relocalização de empresas (transferência das
plantas para o exterior), não estão sozinhos na rejeição ao livre-comércio. Os
ecologistas, os agricultores e os consumidores se uniram a eles. Também os
funcionários públicos, incluindo os bombeiros, se mobilizam, a ponto de um
dirigente patronal norte-americano não se conter: “Nenhum deles enfrenta a
concorrência das importações, mas seu sindicato se mostra solidário com os
outros”.3 A entidade que organiza os bombeiros compreendeu que não conseguirá
defender por muito tempo as garantias e os direitos de seus 2 milhões de
membros se os direitos e garantias dos outros assalariados continuarem
minguando. E eles sabem que a substituição de empresas que pagam impostos por
indústrias improdutivas cerceará os orçamentos municipais, ameaçando muitos de
seus quartéis. Em suma, nesse campo a convergência das lutas existe e já deu
seus primeiros frutos.
Serge Halimi é o diretor de redação de Le Monde
Diplomatique (França).
Ilustração: Jacques-BILLAUDEL/ cc
1 Ver o dossiê “Les puissants redessinent le monde”
[Os poderosos remodelam o mundo], Le Monde Diplomatique, jun. 2014.
2 Ver “Ces Européens qui défient le libre-échange”
[Esses europeus que desafiam o livre-comércio], Le Monde Diplomatique, out.
2015.
3 Noam Scheiber, “Labor’s might seen in failure of
trade deal as unions allied to thwart it” [A força do trabalho promovendo o
fracasso do acordo comercial, com os sindicatos se unindo para frustrá-lo], The
New York Times, 4 jun. 2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12