Patricia Faermann // http://jornalggn.com.br/
Jornal GGN - Antes de passar a fala ao juiz da Lava Jato, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, introduziu afirmando que se as instituições do poder estivessem funcionando adequadamente, o Brasil não precisaria de heróis. "Só se precisa de 'heróis' quando as instituições não funcionam e, parafraseando [Bertolt] Brecht, 'triste é o país que precisa de heróis', nós precisamos mesmo é de instituições", completou.
Em seguida, teve a palavra Sérgio Moro, em evento realizado pelo Instituto de Diálogos Constitucionais, nesta terça-feira (09). Com uma apresentação marcada por demonstrações de vaidades, iniciou falando que descobriu que sempre que é convidado para um evento e não aborda a Operação Lava Jato "há uma frustração".
Em mais de uma hora de palestra no Centro Universitário UniCEUB, em Brasília, Moro fez um resumo e balanço dos casos investigados e julgados até agora pela Vara Federal de Curitiba, relacionados à Petrobras, deixando escapar detalhes sobre a forma controversa de conduzir esses trabalhos.
Lembrou, por exemplo, que em 17 de março de 2014, ele não teria ideia da oportunidade que viria pela frente, no andamento das investigações. "Como todo caso criminal, começou pequeno. Inicialmente se investigavam quatro indivíduos. A Polícia federal no curso dessa investigação literalmente tropeçou na prova de que um desses indivíduos, suposto lavador profissional, teria conexões e relações com um ex-diretor da Petrobras", disse.
Foi nesse momento que, segundo Moro, "o caso foi crescendo e as provas foram se avolumando".
Se já pela metade da explanação o magistrado do Paraná afirma que as delações premiadas, que a seu ver o termo correto seria de "colaboração premiada", são muito importantes para aprofundar a investigação e que não se sustenta a teoria de que elas foram usadas como facilidade para os investigadores alcançarem provas - uma vez que, nas estratégias de procuradores, ainda na fase de acordo com o investigado, são solicitados documentos e provas materiais que corroborem os depoimentos -, Moro ressalta que muitos dos fatos foram descobertos antes do início das delações, no início o juiz deixa escapar outra versão para as colaborações, contraditória à essa visão:
Ao resumir brevemente os trabalhos na introdução da palestra, Sergio Moro ressalta que a Lava Jato só tomou a proporção que tem hoje, quando "algumas pessoas foram resolvendo, também, colaborar com a Justiça". "E foi como se tivessem aberto a caixa de Pandora", mostrou Moro, aí, a importância das delações como instrumento de prova para as investigações.
Em seguida, lembrou que as prisões cautelares existem no Brasil para casos extremos e excepcionais, conforme a crítica às suas conduções revelam, mas que elas podem ser usadas quando existe risco ao processo ou à aplicação da lei penal.
Para ele, os casos em que foram usadas as prisões preventivas nas investigações do esquema de corrupção da Petrobras, foram atendidas essas condições. Citou, para justificar a validade do uso excessivo da medida, um caso de um investigado que foi preso com dinheiro dentro de uma mala quando participava de outro esquema de corrupção no norte do país, e de uma envolvida que viajava para o exterior com dinheiro em espécie.
Argumentou que "dentro de um quadro de corrupção sistêmica", as prisões são necessárias. E que esse cenário "não é algo isolado, é serial", disse.
Durante toda a palestra, o magistrado também enfatizou a importância da colaboração da imprensa, e da publicidade, do caso Lava Jato para os seus processos. Na abertura da fala, por exemplo, recontou o caso Watergate, ao explicar que os delegados da polícia federal, em um primeiro momento da Lava Jato, usaram o rastreamento financeiro, quebras de sigilos bancários e fiscais para "literalmente seguir a recomendação daquele filme famoso sobre o Watergate, que é 'siga o dinheiro'".
Apesar de não mencionar a parte do filme e do livro que trazem o papel de jornalistas para o desvendamento do escândalo político dos anos 70, nos Estados Unidos, gerando a renúncia do presidente americano Richard Nixon, Moro mostrou-se bastante entusiasmado ao comparar o caso histórico com a Lava Jato no Brasil.
Ainda nesse sentido, em uma mistura de excitação, vaidade e o peso da imprensa para o magistrado, Moro mencionou como uma das grandes conquistas da Operação, além das condenações, prisões e ressarcimentos de recursos, o fato de a empreiteira Andrade Gutierrez pedir desculpas ao país por meio de um anúncio nos jornais, em maio deste ano.
"Algumas dessas empreiteiras, apesar de toda a dificuldade e toda a resistência, passaram paulativamente a reconhecer as suas faltas", disse Moro, ao narrar o caso, como um êxito da Lava Jato.
"Dois grandes acordos de leniência foram celebrados entre duas dessas empreiteiras e o Ministério Público Federal, uma delas inclusive concordou com uma indenização que não tem parâmetro histórico anterior comparativo no Brasil, uma indenização de R$ 1 bilhão, por envolvimento em crimes de corrupção, além de se comprometer a abandonar práticas corruptas e de revelar os ilícitos", continuou.
"E essa empreiteira, em particular, fez algo que me pareceu muito positivo, concordou em também publicar como um anúncio nos jornais brasileiros um pedido de desculpas. Claro que isto comparativamente a R$ 1 bilhão é pouco, mas há um simbolismo nesse tipo de comportamento e não temos isso como regra nos nossos processos no Brasil", concluiu o juiz.
Seguindo essa linha de êxitos sentidos pelo magistrado da primeira instância, Moro orgulhou-se ao dizer que, antes da Lava Jato, a "Petrobras tinha uma política de não reconhecer qualquer problema em seus contratos" e, ignorando o impacto da Operação para a imagem da empreiteira, agravando a sua crise econômica e o provocando o rebaixamento da notas da Petrobras por agências de risco, ressaltou que o balanço de 2015 da estatal admitiu R$ 6 bilhões provenientes de corrupção. "Seis bilhões de reais", repetiu duas vezes. "Talvez alguns já tenham se acostumado a ouvir e as pessoas perdem a capacidade de se assustar", completou.
Também nesses "méritos", apontou "cerca de 8 ou 11 sentenças contra dirigentes de empreiteiras responsáveis pelo pagamento de propina", frisando que a força-tarefa venceu a resistência inicial apresentada pelas grandes empresas em "colaborar com a Justiça".
Como forma de desviar as críticas sobre os vazamentos ilegais e, ao contrário, não se posicionar a respeito, Sérgio Moro disse que a Constituição traz "em letras garrafais" a publicidade. "Em letras garrafais não, pois a letra tem o mesmo tamanho, mas tá lá escrito", corrigiu. E ainda retrucou que fica "impressionando" quando vê jornalistas criticarem a publicidade da Lava Jato: "até de jornalista", enfatizou.
Futuro
Como se não bastasse as críticas à forma de condução da Lava Jato, apontada por não garantir o amplo direito de defesa da Constituição e a presunção da inocência, além dos instrumentos considerados coercitivos de prisão e delação para colaborar com a Justiça, Moro elogiou a recente decisão do STF de considerar a prisão a partir da segunda instância, e foi além:
"Há países, como os Estados Unidos e a França, que permitem casos de prisão a partir do primeiro julgamento, e dizer que esses países não respeitam a presunção de inocência seria um disparate", disse.
Auto-elogiando o seu trabalho e o feito pela força-tarefa por ele comandada, Moro também disse que o problema da corrupção não será resolvido por "super juízes, super procuradores ou uma super polícia", mas por meio de um trabalho institucional.
Uma das formas para isso, defendeu, são as 10 medidas contra a corrupção propostas pelo MPF e que agora tramitam em projetos de lei no Congresso Nacional.
Acompanhe a íntegra da palestra (a fala de Sérgio Moro tem início a partir do tempo 2h15):
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