sexta-feira, 2 de junho de 2017

O dia em que "Toninho Malvadeza" se urinou de medo do "Homem da Capa Preta"

O Capa

ALESSANDRE DE ARGOLO
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Antônio Carlos Magalhães, mais conhecido pela sigla de ACM, famoso cacique político baiano, que passou pelos partidos ARENA, UDN, PDS, PFL e DEM, era conhecido pelos seus adversários políticos pela truculência com que defendia suas ideias e interesses políticos, o que lhe rendeu o apelido de "Toninho Malvadeza". Os aliados de ACM o chamavam, em resposta, de "Toninho Ternura".
Ternura ou Malvadeza, o fato que é que ACM não era exatamente um político cordial com os adversários que se colocassem em seu caminho.

É famosa uma entrevista realizada em 1986 nas eleições baianas, quando ACM, então Ministro das Comunicações, foi abordado por um repórter da TV Itapoan de Salvador e, irritado pela recepção pouco calorosa vinda dos apoiadores de Waldir Pires, agrediu verbalmente o repórter que tinha perguntado a ele o que achava da reação dos eleitores presentes, chamando-o de "filho da puta", e, não satisfeito, ainda pisou no pé do jovem repórter, cujo único "pecado" foi perguntar o que o então Ministro ACM achava da reação dos eleitores. Na sequência, o repórter ainda teria sido agredido pelo irmão de ACM, que estava na comitiva que o acompanhava na ocasião.
O vídeo desse episódio pode ser assistido abaixo:

O fato é que esse mesmo ACM, tão valente e disposto contra pessoas mais fracas e incapazes de reagir, no início da década de 60, achou que podia fazer isso com o mitológico deputado federal Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque, que fez carreira política e outras em Duque de Caxias e que também tinha o seu apelido: O Homem da Capa Preta. Tenório Cavalcanti, como era mais conhecido, era natural de Palmeira dos Índios, Alagoas, o mesmo município do qual Graciliano Ramos fora prefeito e produziu os seus famosos relatórios que chamaram a atenção do poeta e editor Augusto Frederico Schmidt. Bem, os alagoanos são, na média, homens humildes. Mas se tem uma coisa que é complicada é querer fazer esse tipo coisa que ACM fez com o repórter da TV Itapoan de Salvador com um alagoano tradicional, como era Tenório Cavalcanti. Não há a menor possibilidade disso. Nem em sonho. Muito menos um homem como Tenório Cavalcanti, que, quando jovem, matou, com uma enxada, em legítima defesa, o homem que matou seu pai e voltou para matá-lo com uma arma de fogo. Só isso. E sua lista de mortes não parou por aí.

No entanto, nem só de mortes viveu Tenório Cavalcanti, o Homem da Capa Preta. Ele foi o advogado de defesa no famosíssimo caso que entrou para a história penal brasileira como o "Crime do Sacopã", em que o tenente Alberto Jorge Franco Bandeira foi acusado de assassinar o bancário Afrânio Arsênio de Lemos, ex-funcionário do Banco do Brasil, fato ocorrido em abril de 1952, tendo como figura central a jovem Marina Andrade Costa, então namorada do oficial. Esse caso teve ampla cobertura da imprensa brasileira da época, principalmente pela revista "O Cruzeiro", durante muito tempo. Todos acompanhavam os desdobramentos do caso. O tenente Bandeira foi incialmente condenado a cumprir pena de 15 anos pelo homicídio do bancário Lemos, mas Tenório Cavalcanti conseguiu no STF anular todo o julgamento, em 1972, por erros de procedimento. O crime prescreveu em 1975 e Bandeira se livrou do "Crime do Sacopã".

O fato é que numa das sessões na Câmara Federal, no início dos anos 60, Tenório Cavalcanti discursava contundentemente contra o ex-presidente do Banco do Brasil e então Ministro da Fazenda de Jânio Quadros, Clemente Mariani, conterrâneo de ACM, acusando-o de desvios de verbas quando era gestor do Banco do Brasil, ao que parece, numa operação de truste. ACM, então jovem e ainda com cabelo, que ouvia o discurso de Tenório Cavalcanti, pediu um aparte e retrucou as acusações de Tenório Cavalcanti. Na tréplica, Tenório Cavalcanti também insinuou algumas ilegalidades em relação a ACM e eis que este rebateu, afirmando que "vossa excelência pode dizer isso e mais coisas, mas na verdade o que vossa excelência é, mesmo, é um protetor do jogo e do lenocínio, porque é um ladrão."

Ao ouvir isso, Tenório Cavalcanti disse "vai morrer agora mesmo", no que foi contido por vários deputados, principalmente pelo deputado Esmerino Arruda, líder do Partido Social Trabalhista, que agarrou o revólver de Tenório, impedindo a morte de ACM, que a essa altura já tinha tido uma incontinência urinária e, diante da impossibilidade de ser alvejado, brandava no microfone "atira, atira". Ao ver a poça de urina no chão, cena constrangedora em que se encontrava ACM, Tenório Cavalcanti começou a rir dele e disse: "Podem sossegar. Eu só mato homem". E guardou o revólver. O caso foi tão sério que o advogado Pedro Aleixo, líder da minoria na Câmara Federal durante o Governo Jânio Quadros, pelo Partido Social Trabalhista, o qual morava vizinho ao apartamento de ACM, resolveu colocar o seu nome em letras garrafais na porta do seu apartamento, tudo para evitar ser morto por engano por Tenório Cavalcanti, que costumava usar a sua lendária "Lurdinha" em ações violentas, uma metralhadora MP-40 de fabricação alemã, usada pela Wermacht na II Guerra Mundial.

Esse fato está relatado em vários livros e diferentes outras fontes. É um caso conhecido. O dia em que "Toninho Malvadeza" literalmente se urinou de medo do "Homem da Capa Preta".

A figura de Tenório Cavalcanti foi eternizada no cinema pelo cineasta brasileiro Sérgio Rezende, no filme de 1986 intitulado "O Homem da Capa Preta", cujo papel principal foi interpretado pelo ator José Wilker, infelizmente falecido em 05 de abril deste ano. Tenório Cavalcanti, "o homem da capa preta", faleceu aos 81 anos de idade no dia 7 de maio de 1987, em sua residência, no Rio de Janeiro, vitimado por uma pneumonia. ACM, o "Toninho Malvadeza", como era conhecido por alguns, faleceu vinte anos depois, em 20 de julho de 2007, aos 79 anos de idade.

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