Comparar-se e competir é um grande equívoco
por Marcos de Aguiar Villas-Bôas
Desde muito novas, a maioria das pessoas é ensinada a comparar-se com as demais e a competir para serem as melhores. Isso é absorvido na infância a partir de comportamentos do pais e de outras pessoas próximas, mesmo que não necessariamente direcionados à criança. A comparação entre si e os demais é uma prática muito comum até para fins de se localizar em seu meio, de se posicionar dentro da sociedade e seus subgrupos, mas que é desnecessária e ilusória, pois, como cada um tem uma trajetória muito específica, não se pode comparar limão com jaca.
Se alguém quer melhorar, basta conhecer-se, saber onde quer chegar e seguir exemplos que parecem ser úteis para esse fim. No momento em que os objetivos de alguém dependem da posição na qual o outro está, grandes riscos passam a ser criados para a própria pessoa, que tende a se perder em sentimentos e emoções de baixa vibração.
A sociedade hoje, não cansamos de repetir neste blog, está muito desconectada do restante da natureza, tendo ficado artificializada em prédios, tecnologias, busca por conhecimento racionalista, competições etc. Isso a levou para longe do que defendia Jean-Jacques Rousseau e muitos outros sábios, quando diziam que o homem nasce mais próximo da pureza, da perfeição, conectado com a natureza, mas a convivência social, na maioria dos casos, cobre a sua consciência de ilusões e crenças limitantes.
Na verdade, a criança, enquanto espiríto reencarnado, tem uma porção de pontos a serem trabalhados, mas a sua pureza infantil dentro daquele processo faz com que tais pontos de atenção manifestem-se apenas mais tarde ou em grau muito menor naquele momento. Com as diversas ilusões e crenças limitantes incutidas nas crianças pela sociedade, muitas vezes surge nelas o que existe de pior naquele espírito, o que, por um lado é bom, pois, ao colocar a sombra na luz, torna-se possível trabalhá-la.
A ideia de que a vida é uma constante disputa, uma competição para ver quem se destaca perante os demais e obtém retornos materiais, é uma dessas ilusões, criada há muito tempo e reforçada pela sociedade capitalista com ajuda recentemente das tecnologias de difusão de informação em massa e de conexão muito veloz entre pessoas até mesmo em pontos distantes do mundo.
A competição exacerbada, a falsa ideia de que uma boa vida é aquela repleta de trabalho que dê fama e dinheiro, gera logicamente a disputa de egos e comparações. Essa desconexão da humanidade com o seu Eu superior, que é parte da consciência suprema, termina provocando similares competições, disputas e comparações até mesmo nos meios espiritualistas, como na disputa para ver quem é o mais ascencionado espiritualmente.
O risco de as comparações descambarem para desequilíbrios psíquicos é muito grande. Ao se comparar e competir, tende-se a buscar exageradamente algo para se ver acima dos demais, mas o equilíbrio é o único caminho profundo, aquele que permite comportar os paradoxos e nos deixar em paz.
Comparar-se e viver em clima de competição gera, quase sempre, frustrações e inveja quando a pessoa não se vê no patamar almejado, que é normalmente aquele acima de todos os demais, sobretudo daqueles com quem estabeleceu uma rixa, competição ou disputa mais próxima.
A necessidade de estar acima turva a visão das pessoas e as suas tomadas de decisão. Até uma simples discordância sobre algo pode virar uma briga enorme, porque um não quer, de forma alguma, dar o braço a torcer perante o outro mesmo quando o óbvio é colocado a sua frente. São imaturidades emocionais que a humanidade precisa trabalhar com certa rapidez.
Muitos deixam de aprender pelo fato de não serem capazes de reconhecer que a posição do outro é mais útil, mais ampla para explicar a realidade, ficando presos ao que pensaram inicialmente devido a não suportarem admitir que poderiam ter construído uma ideia melhor acerca daquilo que era discutido, quando, na verdade, muito mais importante do que ter as melhores ideias intelectuais é ser humilde, flexível, alegre.
Segundo Osho, no livro Compaixão: o florescimento do amor, p. 39:
“Eu sou contra toda essa conspiração. Eu não sou nem gigante, nem pigmeu; não tenho interesses escusos. Eu sou apenas eu mesmo. Não me comparo a ninguém, portanto ninguém é inferior ou superior a mim. Por causa desse simples fato, eu consigo ver diretamente; não há interesses escusos criando divisões no meu modo de ver.”
Apesar de não estar em primeiro lugar em praticamente nenhum ranking de qualidade de vida ou de aspectos sociais, os Estados Unidos vêm sendo tidos pela grande potência mundial nas últimas décadas por terem uma produção (PIB) grande, uma poderosa máquina de guerra, obterem normalmente mais medalhas de ouro do que os demais nas competições etc. A adoração aos ianques é um sintoma claro da mentalidade da humanidade. Pergunta-se: os americanos são os mais sábios e os que vivem melhor?
Parece-nos claro que não. O país revela desigualdades gravíssimas, problemas psíquicos aos montes, sendo alguns dos mais graves os decorrentes de guerras realizadas para dominar outros países, o que leva, por exemplo, a diversos casos de assassinatos e suicídios a tiros dentro dos Estados Unidos, sem falar nos milhares de americanos e de outros seres humanos que morreram nas últimas décadas em várias partes do globo por conta das guerras.
A racionalidade da competição e da comparação deve ser substituída pela racionalidade de cada um fazer o seu melhor, de viver com plenitude e altivez. Até quando se fala das atividades mais simples, é difícil ver alguém que faça algo com amor, procurando dar o melhor de si, e não seja bem sucedido. Um entrave para o crescimento das pessoas hoje é que elas estão sempre se comparando com as outras, tentando derrubá-las ou se culpando por não serem iguais a “a” ou “b”.
É muito comum competir, ver-se como alguém sempre em disputa numa sociedade onde impera a concorrência. De fato, em muitas situações profissionais há uma disputa entre duas ou mais pessoas por um cargo, mas a grande questão é como pensar, sentir-se e comportar-se dentro dessa disputa quando ela realmente existir.
Por mais que pareça óbvio, a maioria da humanidade não sabe diferenciar uma disputa sadia e um competição predadora, e menos pessoas ainda conseguem colocar em prática o fair play, o jogo limpo, o "fazer meu melhor e que vença o mais merecedor", ficando ainda feliz pelo sucesso do outro quando ele o mereceu e procurando se esforçar para reconhecer isso, pois os desejos do ego terminam levando a criticismos e à não aceitação das decisões que os preterem.
Ao se estudar as informações trazidas pelos espíritos desencarnados mais sábios, nota-se que a vida na Terra é desenhada para que aprendamos a nos conhecer melhor como espíritos e, a partir daí, poderemos nos aperfeiçoar. Se verdadeiramente internalizarmos essa ideia, toda a nossa interpretação da realidade exterior e interior se modifica.
Se o objetivo central é aprender e aumentar a nossa conexão interna com o todo, a comparação que deve ser feita é de nós para com nós mesmos. Então, não há razão para ficar olhando a vida do próximo e querendo se sentir melhor do que ele, pois é uma postura imatura, que desvia o foco do automelhoramento e deixa o indivíduo preso ao ego na sua parte mais superficial.
Quanto maior o desejo de vitória sobre os demais, sem a devida consciência para gerar equilíbrio nas tomadas de decisão, maior será a tendência a exageros como ganância, trapaça, traição, corrupção e outros desejos e comportamentos ainda mais desqualificados.
Não é à toa que isso é visto o tempo todo nas notícias, e não somente quando se trata de políticos, mas de empresários, juízes, promotores, policiais etc. Se a racionalidade humana, desde a sua educação, está pautada numa ideia de vencer os demais, de tirar a melhor nota, de ganhar a partida de futebol quase a qualquer custo e assim por diante, é natural que sejam formados adultos com consciências estreitas, que deixam a mente egóica agir livremente atrás das maiores frivolidades e descambando para a degeneração de emoções e atitudes.
Se todos têm sombra e luz, ambos lados úteis desde que bem equilibrados e geridos por uma consciência expandida, que domina a mente, no momento em que se forma pessoas estimulando seu lado sombra, sem trabalhar a consciência, é natural que a mente fique egóica, gerida pelas sombras da pessoa.
No livro de Moore e Gillete intitulado “Rei, Guerreiro, Mago, Amante: a redescoberta dos arquétipos do masculino”, já inicialmente estudado no texto anterior publicado neste blog, além de tratar dos lados luz dos arquétipos, ou seja, daquilo que se espera ver imperar na psique dos indivíduos enquanto crianças e enquanto adultos, são também estudadas as degenerações desses arquétipos, quando os lados sombra deles passam a dominar e a reger os pensamentos, sentimentos, emoções e comportamentos.
A comparação que efetivamente ajuda no processo de aprendizagem vivido na Terra consiste em entender quem somos hoje para verificarmos se hoje mesmo conseguimos avançar um pouquinho mais. Aquele que se compara com o ontem pode acabar recaindo em culpa. Aquele que quer ser melhor amanhã pode acabar deixando de fazer o seu melhor hoje mesmo. Aquele que se compara com o outro esquece de se conhecer e de que o único desafio real é para com ele próprio.
Quem quer se tornar um espírito melhor deve se perguntar: o que eu posso mudar agora para ficar numa melhor vibração? Qual o meu melhor? O que posso transmutar nos meus sentimentos e nas minhas emoções? Quão bom eu sou para mim e para os outros; quão bom eu posso me tornar, em vez de tentar apenas fazer o bem em alguns momentos isolados?
Está na hora de a humanidade rever essa racionalidade e começar a enxergar o mundo de outra forma, de modo que os indivíduos sejam mais autônomos em relação aos demais ao mesmo tempo em que vejam no outro uma extensão deles mesmos, em vez de potenciais adversários, inimigos, pessoas que precisam ser vencidas, colocadas embaixo de si. Quando a humanidade deixar essa postura imatura e animalesca de hoje, viverá de modo muito mais feliz e em paz.
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