Procurador de Curitiba usou até a palavra "sonegação" para se referir a um trecho específico do acordo de colaboração que acabou rejeitado pelo MPF
Por Jornal GGN
Foto: Agência Brasil
Jornal GGN – Procuradores da Lava Jato prevaricaram ao negar acordo de delação premiada ao ex-presidente da Câmara e deputado federal cassado, Eduardo Cunha, sob a alegação de que a negociação não era “conveniente”. É o que revelam mensagens de Telegram expostas pelo Intercept Brasil em parceria com o UOL, nesta terça (10).
Em um grupo formado por procuradores de Brasília, Rio de Janeiro, Natal e Curitiba, membros da Lava Jato e também da Operação Greenfield discutiram sobre a possibilidade de negociar benefícios jurídicos com Cunha em troca de informações. Mas a turma de Curitiba opinou incisivamente para que o ex-deputado não tivesse vez com o Ministério Público Federal – a decisão final era de competência da Procuradoria-Geral da República.
As mensagens mostram que, no começo da negociação, em meados de 2017, havia expectativa de que Cunha, envolvido na política há décadas, teria informações que comprometeriam o Judiciário, a classe política, o Tribunal de Contas e até o MP do Rio. Os procuradores também queriam ouvir relatos implicando a JBS em pagamentos a parlamentares do baixo clero, seguidores de Cunha.

Com o passar do tempo, os procuradores perceberam que a delação de Cunha poderia ser substituída pela de Lúcio Funaro e outros delatores. E o que o político tivesse delatado de novo poderia, ainda, ser discutido com o operador do MDB, que ficaria com o crédito.
Assim, os procuradores de Curitiba foram alimentando a tese de que não precisavam de Cunha, porque ele era vago e não admitia crimes de corrupção, somente de caixa 2. Além disso, fechar um acordo com ele teria impacto negativo para a Lava Jato.
PREVARICAÇÃO
Mesmo tomando a decisão de não seguir com as negociações, o procurador do MPF em Curitiba, Orlando Martello, admitiu que estavam deixando para trás pelo menos 1 anexo da delação que merecia investigação imediata. Tratava-se da denúncia de Cunha sobre suposta fraude ou manipulação, na Câmara, durante o processo que viria a cassar seu mandato.
Martello, inclusive, usou a palavra “sonegação” para se referir ao fato de que a Lava Jato decidiu não entregar esse trecho da delação para que as autoridades competentes pudessem investigar.
“Realmente esse é um fato que talvez não devesse ser sonegado da sociedade. Isso mostra/expõe como ainda somos um País subdesenvolvido, em que os políticos estão tão distantes da realidade”.
O UOL ouviu 2 advogados que avaliaram, sem saber que o caso era sobre a delação de Cunha, que houve prevaricação por parte dos procuradores.
Isto porque o MP não pode escolher o que ou quem investigar. Se tomou conhecimento de um suposto crime, deveria ter entregue à Justiça pelo menos este trecho da delação e fechar o acordo com Cunha na proporção do que foi reportado.
Essa opinião ficou ainda mais forte depois que o Supremo Tribunal Federal decidiu, em 2018, que a Polícia Federal também pode fechar acordo de delação premiada com investigados, pois o instrumento é “meio de prova”, não deve ser usado como produto final – como faz, muitas vezes, a Lava Jato.
UOL também lembrou declaração do ministro do STF Marco Aurélio Mello, apontando que procuradores tem o “dever” de levar ao Judiciário a proposta de um candidato a delator quando vislumbrar necessário. As mensagens dos procuradores lamentando que a suposta fraude no Conselho de Ética da Câmara ficaria na gaveta vão de encontro ao entendimento do ministro.
Procurados, os procuradores disseram, por meio de assessoria, que “em negociações de possíveis acordos de colaboração, quando os fatos revelados envolvem mais de uma jurisdição, é comum que os respectivos procuradores manifestem-se sobre a conveniência de eventual acordo tendo vista as investigações que conduzem.”
A defesa de Cunha frisou que a delação de seu cliente não foi aceita pelo MPF porque o ex-deputado não seguiu o script de interesse dos procuradores.
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