segunda-feira, 15 de julho de 2024

Episódios stalinistas no Brasil

Imagem: Karolina Grabowska

Por ANGELA MENDES DE ALMEIDA*
aterraeredonda.com.br/

Uma história costurada com inverdades, mas que, muito tempo depois, acabaram por sair à luz do dia

A tentativa insurrecional comunista de novembro de 1935 foi selada pela tragédia da repressão policial do governo de Getúlio Vargas. Repressão que ceifou vidas e mutilou corpos, através da barbárie do Chefe da Polícia do Distrito Federal, Filinto Müller, e da pusilanimidade de Getúlio Vargas, entregando Olga Benário e Elise Ewert à Gestapo, o que significou condená-las à morte. Porém, enquanto a tragédia se desenrolava no Brasil, principalmente durante 1936, as intrigas do aparelho stalinista continuavam acontecendo. Em dezembro de 1935, o dirigente soviético Kírov foi assassinado em Leningrado, o que foi o sinal para iniciar o que se convencionou chamar de “Grande Terror”, com os processos de Moscou e a repressão massiva da Iejovschina.

Quanto à tentativa de insurreição, seria inútil repetir aqui o seu caráter quimérico, expresso até mesmo nos títulos dos livros que trataram especificamente desse acontecimento.[i] Ilusão, sonho… Polêmicas desnecessárias têm sido travadas em torno da questão de saber se esse movimento emergiu das lutas sociais específicas no Brasil, ou se aconteceu sob os ditames da Internacional Comunista que viabilizava a voz de Moscou.

Se o cenário da insurreição de 1935 foi, ainda, o de uma rebelião tenentista, movimento que havia agitado o país durante a década de 1920, os planos estratégicos para depois da insurreição vitoriosa tinham tudo a ver com a Internacional, inclusive em sua linha “frentista”. Esta ficou materializada na proposta de um “Governo Popular Nacional Revolucionário”,[ii] da Aliança Nacional Libertadora, organização criada em 23 de março de 1935 por tenentistas e comunistas, que conseguiu grande adesão popular, mas que, ao ser suspensa, em julho, pelo governo Vargas, volatilizou-se.

A intervenção da Internacional Comunista, pelo envio de quadros e fundos, bem como pelo acompanhamento detalhado do trabalho deles já está bem documentada. A questão é saber como se deu o entrosamento entre uma estratégia predeterminada sob a forma de uma imposição doutrinária e a aplicação dessa estratégia face às circunstâncias reais. Em relação à forma das intervenções da Internacional Comunista, ao seu caráter de ordem a ser cumprida quaisquer que fossem as circunstâncias, a experiência da revolução chinesa, durante os acontecimentos do fim da década de 1920, têm muito a mostrar.

Em 1927, a ordem de Stálin era sublevar Cantão (Guangzhou), mesmo que não houvesse condições de vitória. A insurreição durou dois dias no mês de dezembro e cobriu de sangue a cidade, a repressão contra os milhares de sublevados foi de uma violência inaudita, todos os presos com vida foram executados pelas formas mais brutais.[iii] Essa dramática experiência viria a ser lembrada pelos enviados ao Brasil.

Para colaborar na empreitada brasileira, que tinha como chefe Luiz Carlos Prestes, já mítico no Brasil, a Internacional Comunista enviou vários militantes de peso, alguns das suas estruturas, outros ligados aos diversos serviços secretos soviéticos na qualidade de agentes. O mais importante deles era o alemão Arthur Ernst Ewert (“Negro”), que viajou para o Brasil usando um passaporte americano falso, que já havia usado na China, em nome de Harry Berger. Veio com sua esposa, a alemã Elisabeth Saborovski Ewert, conhecida como Sabo, que viajava com documentação americana falsa em nome de Machla Lenczycki.[iv]

Eles haviam passado os anos da Primeira Guerra Mundial no Canadá, onde se tornaram fluentes em inglês. Voltaram para a Alemanha, e em 1920 Arthur Ernst Ewert aderiu ao KPD (Partido Comunista Alemão). Em 1925, foi eleito para o Comitê Central.[v] Antes disso tinha sido da tendência de esquerda liderada por Ruth Fischer e Arkádi Maslow, mas se afastou dela, juntamente com outros militantes como o austríaco Gerhard Eisler, irmão de Ruth Fischer, e Heinz Neumann. Os três confluíram para a chamada tendência dos “conciliadores”.[vi]

Em 1928, na 9ª Plenária da Internacional Comunista, os dirigentes internacionais tomaram posição clara contra os “conciliadores” do Comitê Central do KPD e eles foram excluídos. Em seguida, fizeram a autocrítica protocolar e foram reintegrados. Mas não desistiram de se contrapor à linha que considerava a social-democracia como o pior inimigo, dando pouco importância à luta contra o nazismo. Para isso, tentaram utilizar o “caso Wittorf”, a descoberta de um ato de corrupção de um cunhado do dirigente Thälmann, líder do Comitê Central do KPD. No entanto Stálin interveio diretamente em favor deste e o caso de corrupção foi abafado. Em 1928, Ewert foi eleito deputado do Reichstag, o Parlamento alemão, pelo KPD e atuou até 1930. No fim de 1928, ele foi também indicado como representante do KPD no Comitê Executivo da Internacional Comunista.[vii]

Jan Valtin descreve seus vários encontros com Arthur Ernst Ewert, um dos poucos comunistas a quem se refere com respeito e mesmo carinho. Primeiro o encontrou como professor na Escola Internacional Lênin, em Moscou, durante o inverno entre 1925 e 1926, querido pelos estudantes por sua “infatigável serenidade”. Depois, em 1929, cruzou com ele em Paris. Ewert pediu que se encontrassem em particular e se abriu com ele. Disse que estava lhe falando porque ele era jovem e tinha a chance de poder voltar à Alemanha.

Arthur Ernst Ewert estava em conflito com a linha aplicada no seu país, que considerava que o maior inimigo era o “social-fascismo”. Ao contrário, ele defendia que o maior inimigo era o nazismo e propunha uma frente com os sociais-democratas. Disse que estava sendo obrigado a fazer uma autocrítica, publicada depois na revista Inprekorr, da IC, em fevereiro de 1930. Confidenciou ainda que a direção internacional o estava isolando, enviando-o para a América do Sul, sobre a qual não sabia nada. Como militante então disciplinado, Valtin defendeu o partido alemão e a Internacional.

Logo em seguida, seu contato na França, Roger Walter Ginsburg, na verdade Pierre Villon,[viii] exigiu que ele relatasse em detalhes tudo o que Ewert tinha lhe dito. Em seguida, obrigou-o a ficar na casa onde estava alojado, sem possibilidade de transmitir a Ewert o que tinha revelado. Apesar de ter delatado a conversa, seu conteúdo ficou profundamente marcado em sua consciência. Jan Valtin também foi enviado à América do Sul, em 1930, para levar encomendas para o Burô Sul-Americano em Montevidéu e envelopes com dinheiro para Chile, Argentina e Uruguai, entregues aos mensageiros de Arthur Ewert.[ix]

Este tinha sido o responsável, juntamente com o letão Abraham Iákovlevitch Guralski (“Rústico”), por ganhar Luís Carlos Prestes para o comunismo durante essa temporada em Buenos Aires e Montevidéu. Em 1932, Ewert foi enviado à China para ser o representante da Internacional Comunista no Partido Comunista Chinês. Viajou com sua esposa Elise e ficaram nesse país até 1934, voltando então à União Soviética, de onde partiram para o Brasil.[x]

O segundo militante de peso era o argentino Rodolfo Ghioldi (“Índio”, “Altobello”), dirigente do Partido Comunista Argentino. Tinha sido do Burô Sul-Americano juntamente com Arthur Ernst Ewert. Veio com um passaporte em nome de Luciano Busteros. Com ele veio sua esposa, Carmen de Alfaya Ghioldi, que ao contrário das regras mínimas de conspiração, viajou com seu passaporte pessoal onde constava o nome de Ghioldi.[xi] Veio também o casal de soviéticos Pável Vladimirovitch Stuchevski e sua esposa Sofia Semionova Stuchevskaia, que usava os passaportes belgas falsos em nome de Léon-Jules e Alphonsine Vallée, nomes pelos quais ficaram conhecidos na história da insurreição de 1935 até a implosão da URSS, em 1991.

Pável Stuchevski, de família judia, tinha nascido na Ucrânia e estudado em Genebra antes da Primeira Guerra Mundial, onde adquiriu um francês tão perfeito que nem a polícia francesa o reconhecia. Teve atuação em vários países como diplomata, porém pertencendo primeiro ao INO (Departamento de Inteligência no Estrangeiro), do GPU,[xii] depois ao Quarto Departamento do Exército Vermelho (Inteligência Militar), sendo enviado mais tarde como agente ilegal para a França, onde foi preso em 1931 e condenado a três anos. Cumprida a sentença, foi deportado para a União Soviética, integrado à OMS (Seção de Ligações Internacionais) da IC e enviado ao Brasil, com as funções de comunicações, finanças e controle da rede sul-americana.[xiii]

Sua esposa, Sofia Semionova, também nascida na Ucrânia de família judia, estava empregada no Quarto Departamento. Tinham se conhecido durante a guerra civil russa, quando Pável Stuchevski foi ferido e levado para um hospital, em Kharkov. Por ocasião da deportação de Pavel Stuchevski para a URSS, Sofia ficou mais um tempo, o suficiente para colocar seu filho, Eugène, em uma escola interna em Genebra. Além desses, a Internacional enviou também um técnico em radiocomunicações formado em Moscou, o americano Victor Allen Barron, que veio com o nome James Martin e usou no Brasil o nome de guerra de “Raymond”.

Tinha a missão de montar um rádio emissor-receptor, que conseguiu completar pouco antes da insurreição e da repressão que se seguiu. Enviaram, ainda, um especialista em explosivos e sabotagem, o alemão Johann de Graaf, chamado de “Jonny”, que usava o passaporte austríaco falso em nome de Franz Paul Gruber, simulando ser um industrial. Com ele veio a jovem alemã Helena Kruger, sua companheira, que não era militante, à qual foi dado um passaporte falso em nome de Erna Gruber. Ficou conhecida no Brasil como “Lena”.[xiv]

Enviaram também como “instrutor militar” o militante italiano Amleto Locatelli, “Bruno”, indicado e defendido por Palmiro Togliatti face às críticas do partido italiano, de que ele “não era sólido” o suficiente, eufemismo para designar a homossexualidade.[xv] Outros militantes enviados da Argentina participaram ocasionalmente, como o argentino-polonês Marcos Youbmann, conhecido como “Arias” e entre os brasileiros como “Ramón”. Tinha a função de mensageiro e teve um final dramático.[xvi]

Por fim, como guarda-costas de Luiz Carlos Prestes, veio aquela que se tornaria depois sua esposa, a judia alemã Olga Gutmann Benario. Era agente do Quarto Departamento do Exército Vermelho e já tinha feito uma ação corajosa e importante na libertação do dirigente Otto Braun, seu namorado na época, da prisão de Moabit, em Berlim, em 1928. Ela entrou no Brasil com um passaporte português verdadeiro, combinando com o de Prestes, simulando ser sua esposa. Ele com o nome de Antônio Vilar e ela com o nome de Maria Bergner Vilar, passaportes conseguidos no consulado português de Rouen, cidade do norte francês, graças à generosidade do cônsul.[xvii]

A insurreição de 1935 foi um acontecimento de curtíssima duração, centrado na efervescência de militares, sobretudo os de baixa patente. Porém teve efeitos duradouros. Começou espontaneamente, sem nenhuma consigna da direção do PCB, que havia escrito a Moscou, através de um telegrama enviado por Prestes e Ewert, que pensavam passar a “ações decisivas” somente entre dezembro e janeiro do ano seguinte. Além disso, o partido havia recomendado que nada fosse empreendido sem uma ordem expressa sua.[xviii] Foi em Natal, capital do Rio Grande do Norte, em um clima já agitado por disputas eleitorais, que os militares do 21º Batalhão de Caçadores se rebelaram primeiro, no dia 23 de novembro, um sábado.

Em poucas horas, conseguiram tomar o quartel e rumaram para a cidade da qual ficaram senhores, com amplo apoio de população. Houve comícios, agitação, saques em lojas, arrombamento de bancos. Criaram um Comitê Popular Revolucionário e constituíram duas colunas enviadas em direções distintas ao interior do estado. Mas, apesar desse sucesso inicial, a rebelião ficou isolada pela chegada de diversas tropas de outros estados. Os combates duraram até o dia 27 de novembro.[xix]

O poder popular durou cerca de quatro dias. A notícia da rebelião em Natal chegou a Recife no mesmo dia, à noite, e no dia seguinte, 24 de novembro, um domingo, rebelaram-se os militares da Vila Militar de Socorro, do 29º Batalhão de Caçadores. Não houve apoio popular apesar de terem sido distribuídas armas. Mas enquanto em Natal a rebelião foi espontânea, no Recife foi bastante influenciada pelo Secretariado do Nordeste do PCB.[xx] Apesar da pouca adesão, houve luta até quarta-feira, dia 27. Considerando o estado atrasado e precário das comunicações, as notícias das rebeliões no Nordeste só chegaram ao Rio de Janeiro nesse domingo, dia 24, e os dirigentes brasileiros e internacionais só tomaram conhecimento delas pelos jornais, como todo mundo.

A cúpula, isto é, a direção do PCB (Partido Comunista do Brasil) representada, no caso, por “Miranda” (Antônio Maciel Bonfim), secretário-geral, e Prestes, juntamente com os dirigentes internacionais Arthur Ewert e Rodolfo Ghioldi, além da presença incidental de Locatelli, reuniu-se na noite do dia seguinte, 25, segunda-feira, e decidiu, em apoio e solidariedade ao Nordeste, preparar em pouco mais de um dia uma insurreição no Rio de Janeiro, fixada para ter início no dia 27, às primeiras horas da madrugada.[xxi]

Os centros da rebelião previstos no Rio eram o 3º Regimento de Infantaria, na Praia Vermelha, e a Escola de Aviação Militar, no Campo dos Afonsos, na zona oeste, onde a rebelião nem começou. Na Praia Vermelha os rebeldes, comandados pelo tenente Agildo Barata, tomaram o quartel, mas este rapidamente foi cercado por diversas tropas mobilizadas pelo general Eurico Gaspar Dutra, feroz anticomunista, que atacaram, causando várias mortes. A situação ficou pior entre as onze horas e o meio-dia, quando chegaram os aviões do Campo dos Afonsos, metralhando, e o quartel foi arrasado. Os rebeldes tiveram que se render.

A tentativa durou cerca de 13 horas. Além dos mortos em combate, milhares de pessoas foram presas: comunistas, tenentistas, parentes e vizinhos de presos. As prisões ficaram cheias e foi preciso utilizar o navio “Pedro I”, ancorado na Baía da Guanabara, para receber mais gente.[xxii] Apenas no Rio de Janeiro foram presos imediatamente e nos meses seguintes mais de três mil pessoas, boa parte delas militares.[xxiii] No Rio Grande do Norte, foram indiciados em processos cerca de mil e duzentas pessoas, enquanto em Pernambuco, 415. No Rio de Janeiro, foram indiciadas 839 pessoas, bem menos que o número de presos, pois muitos ficaram detidos “por mais de um ano sem culpa formada”. Cerca de uma centena de militantes que participaram do levante foram “fuzilados ao se render, assassinados na polícia ou enterrados sem nome”.[xxiv]

Nos dias seguintes à rebelião sufocada, a cúpula do partido e os militantes internacionais não tinham sido atingidos. E, apesar do susto da derrota e sobretudo do perigo que corriam, não houve uma consciência clara da natureza do que tinha acontecido. Ressurgiu o mesmo ânimo e a intenção de continuar aplicando a mesma linha. Prestes teria explicado, em entrevista bem posterior, à historiadora Marly Vianna, que eles “achavam que mais adiante a coisa poderia tomar outro vulto”. Nos números posteriores ao levante do jornal do partido, A Classe Operária, insistiam que a revolução apenas começara, a derrota “continha grandes premissas da próxima vitória”.[xxv]

À oferta de um simpatizante de retirá-lo do Brasil, Prestes respondeu que não podia, pois “esperava um novo levante da ANL”.[xxvi] O primeiro militante a conseguir chegar em Moscou, o arguto observador Amleto Locatelli disse, em sua narrativa, que ouvira Prestes comentar que não aceitava a proposta de Ghioldi de sair do Brasil, porque “dentro de um mês, a situação já podia ser outra e dentro de um mês já se teria surpresas”. Segundo essa mesma narrativa, Ewert “confessou-se surpreso também com a ‘falta de reação’ ao levante” por parte do governo.[xxvii] Talvez pensasse na brutal repressão contra os sublevados em Cantão, em 1927, imediatamente mortos com requintes de crueldade.

Depois da derrota da rebelião, dia 27 de novembro, Ewert e Sabo, bem como Prestes e Olga continuaram nas mesmas casas situadas no bairro de Ipanema, os primeiros na rua Paul Redfern, o casal Prestes na rua Barão da Torre, a poucas quadras uma da outra. Continuavam se visitando, como antes o faziam perigosamente, continuaram com as respectivas empregadas, amigas entre si. Os Ghioldi, bem como Barron, moravam na vizinha Copacabana e os Stuchevski pelas redondezas. Só Pavel Stuchevski tomou a providência, depois do dia da derrota, de alterar os endereços telegráficos e de correspondência, mandando também Barron avisar Moscou e desligar o rádio.

Prestes e Ewert mantiveram nas suas residências copioso material composto de documentos, declarações, jornais comunistas, etc., o primeiro talvez acreditando que o dispositivo para a explosão do armário onde estavam funcionasse, como prometido por Gruber, porém repetindo depois o erro quando se transladou para o bairro do Meier.[xxviii] Parecia como se andassem em um delírio tropical, entorpecidos pelo calor, caminhando à beira do precipício, em um Rio de Janeiro maravilhoso nos anos 1930.

Esse entorpecimento foi brutalmente interrompido com a prisão de Ewert (Harry Berger) e sua esposa Sabo, no dia 26 de dezembro. Em pouco tempo, o saldo destas imprevidências seria um militante internacionalista do calibre de Arthur Ewert, torturado até perder a razão. Filinto Müller, chefe da polícia do Distrito Federal, utilizou um membro da Gestapo para prender e torturar Ewert e sua esposa Sabo com choques elétricos, unhas arrancadas com alicate e uso de maçarico para ferir e queimar a pele. Ela foi estuprada na frente dele diversas vezes. Nenhum dos dois entregou qualquer dado.

Outra vítima dos verdugos de Getúlio e dessas imprevidências foi Victor Allen Barron, torturado até a morte e “suicidado”, jogado do segundo andar do prédio da Polícia Central. Tinha 26 anos. O argentino “Arias”, Marcos Youbmann, simplesmente desapareceu, tendo sido publicado, semanas depois, em jornais de São Paulo, que ele tinha se “suicidado” quando se encontrava sob a guarda da polícia.[xxix] Em setembro de 1936, Olga Benario e Elisabeth Saborovski Ewert foram deportadas pelo governo Vargas para a Alemanha nazista.

Assim relata Margarete Buber-Neumann, uma dos militantes comunistas alemães presos na União Soviética e entregues por Stálin a Hitler: “Foi no campo de Ravensbrück que chegou, em um certo dia de 1941, uma mulher alta, com cabelos castanhos e com grandes olhos azuis. Eu me lembrava de tê-la encontrado em Moscou, no restaurante do “Lux”. Era Olga Prestes-Benario que, junto com Elisabeth Sabo, mulher de Arthur Ewert, tinha sido entregue à Alemanha depois de sua prisão no Rio de Janeiro. Elisabeth Sabo tinha morrido em 1940, em Ravensbrück, pouco antes de minha chegada ao campo. Olga foi vítima, em 1941, da primeira campanha de exterminação dos “indivíduos racial e biologicamente inferiores”. Foi assassinada, juntamente com todas as judias que tinham sido internadas em Ravensbrück por razões raciais e políticas”.[xxx]

Na verdade, as execuções por câmeras de gás se realizavam no hospital de Bernburg, embora as mortes fossem anunciadas como tendo acontecido em Ravensbrück, por uma causa médica inventada. No caso de Olga, a razão alegada foi “insuficiência cardíaca causada por oclusão intestinal e peritonite”. Quanto a Elisabeth Sabo, já estava tuberculosa quando chegou ao campo, em 1939, e pesava cerca de quarenta quilos. Apesar disso, foi colocada em uma turma de trabalho que carregava pedras pesadas. No inverno de 1939-1940, contraiu pneumonia e faleceu.[xxxi]

Por sua vez, Ewert havia sido tão maltratado durante o seu tempo de prisão que o famoso criminalista Heráclito Sobral Pinto, advogado de Prestes, invocaria a Lei de Proteção aos Animais para defender para ele um tratamento digno. Ele denunciava que Ewert (Harry Berger) era mantido “debaixo de um socavão de uma escada, na Polícia Especial”. Estava há meses “sem instalações sanitárias, sem cama, ar fresco ou luz do sol, sem roupa para troca ou espaço para se mover, sem material de leitura ou de escrita”.[xxxii] Em 1936, quando Ewert se tornou um morto em vida, tinha 46 anos.

Ao final da guerra mundial, em 1945, todos os comunistas presos foram anistiados por Getúlio, inclusive Prestes e Ewert. Este, no entanto, nunca mais recobrou a razão. Nos últimos anos, estava internado no Manicômio Judiciário do Rio de Janeiro,[xxxiii] conhecido local para fabricar loucos. Depois da anistia concedida foi levado para a RDA (República Democrática Alemã, ou seja, a Alemanha Oriental). Lá permaneceu até a sua morte, em 1959, internado por problemas mentais.

Alguns autores dizem que a prisão de Ewert, no dia 26 de dezembro de 1935, o primeiro acontecimento que desencadeou uma trágica sucessão de outros, não está esclarecida. Ou então atribuem essa prisão à de dois membros do PCB capturados um pouco antes. Isso apesar de insistentes indícios conhecidos desde a época, de que o governo de Vargas tinha informações gerais, fornecidas pelos serviços secretos ingleses através de embaixadores, sobre uma ação do Komintern no Brasil por aqueles dias. O British Intelligence Service é citado até como tendo ajudado o DOPS, em dezembro de 1935, a estudar relatórios e interrogatórios.[xxxiv]

Esse desconhecimento permaneceu, mesmo depois que uma suspeita, sempre repetida por várias fontes ao longo do tempo, veio a se confirmar. A suspeita voltava-se para um agente infiltrado nos serviços secretos soviéticos, chamado equivocadamente de “agente duplo”, quando na verdade era um agente inglês no seio do serviço secreto soviético. A confirmação veio com a publicação da biografia do próprio infiltrado, o suposto austríaco Franz Paul Gruber, na verdade, o alemão Jonny de Graaf. É claro que se Jonny era um agente inglês, quem, senão ele, teria fornecido o endereço exato de Ewert? Quem senão ele poderia dar também o endereço preciso de Victor Allen Barron, com quem se encontrava sempre? Afinal, estava ali para fazer isso. Sua prisão e a de “Lena,” por uma noite, sua libertação com um pedido de desculpas e sua volta à polícia para conseguir visto de saída, obtido facilmente, já falavam mais do que alto.[xxxv]

Voltando um pouco no tempo: depois da prisão dos participantes no levante e dos militantes e simpatizante públicos da ANL, o aparelho do partido e os internacionais ainda não tinham sido atingidos, quando, em meados de dezembro, foi preso “Bagé” (José Francisco de Campos). Sabe-se que mencionou ter visto, em uma reunião, um estrangeiro que falava em inglês. Não era informação que levasse a um endereço preciso. Depois foi preso um militante não identificado que tinha levado, juntamente com o membro da direção, “Martins” (Honório de Freitas Guimarães), as granadas não utilizadas no levante para o “arsenal” do partido, “uma casa de família no Grajaú”, onde moravam o militante espanhol, vindo de São Paulo, Francisco Romero, sua mulher e cinco crianças.

Na época, havia ainda no local grande quantidade de dinamite, detonadores e armas. Era óbvio que o aparelho tinha que ser desmontado. Conseguiram para isso um pequeno caminhão que ficou estacionado a certa distância, enquanto arrumavam a mudança. Era 24 de dezembro, véspera de Natal. Um militante não identificado, que ajudava na mudança, ao descer uma escada, foi atingido por uma explosão que o jogou longe, no jardim. A explosão feriu a esposa e duas crianças de Romero. Os vizinhos acorreram para ajudar, mas quando viram armas e munições em quantidade chamaram a polícia. O militante que foi jogado no jardim fugiu, quase sem roupa e chamuscado, mas conseguiu avisar o partido. Romero e a família foram presos.[xxxvi]

Que melhor especialista que Jonny de Graaf/ Franz Paul Gruber poderia preparar os explosivos de tal maneira que explodissem facilmente em hora indesejada? Mais de uma vez já tinha havido pequenos acidentes nos cursos de sabotagem que ele dava, queimando rosto e mãos de um aluno e dele próprio, Romero perdera três dedos.[xxxvii] E quem estaria mais capacitado para preparar para Prestes um armário para guardar documentos que, se aberto por outra pessoa, explodiria, mas que não explodiu? Romero e a família foram muito torturados, porém, embora conhecessem Ewert, estavam longe de saber o seu endereço, pelo que se sabe.[xxxviii] Todas essas conclusões lógicas partem do pressuposto de que o agente inglês estava lá para isso, o seu trabalho era sabotar a insurreição comunista.

Na época, as suspeitas sobre Jonny de Graaf/Franz Paul Gruber foram muitas. Conforme a historiadora Marly Vianna, o dirigente “Miranda” (Antonio Maciel Bonfim), preso, mandara dizer através de Elza, sua companheira, que “um estrangeiro foi preso e logo solto”, o que ele achava muito estranho. Mais adiante, Elza repetiu que “Miranda” mandara dizer que “um estrangeiro fornecera muitas indicações à polícia e que parecia ser que fosse alemão”.[xxxix] Com efeito, o casal Gruber ficou apenas 12 horas preso.[xl] Pouco antes de cair nas mãos da polícia, Prestes recebeu um recado da escritora Eneida de Moraes, avisando que Caio Prado vira no gabinete de Macedo Soares, ministro da Justiça, um relatório de doze páginas sobre o PCB.

Macedo Soares teria dito que o autor era alguém que se ligava diretamente a ele. Caio julgava que o autor era estrangeiro, parece que alemão.[xli] Pável Stuchevski também desconfiava de Jonny/Gruber e no caminho de volta a Moscou, na Argentina, armou-lhe uma cilada, perguntando-lhe se chegara a se encontrar com Barron antes de sua prisão. Pela resposta, percebeu que estava mentindo e concluiu, em telegrama enviado para Moscou, que se tratava de um espião. Em relatório apresentado depois a Moscou, qualificou-o de espião, porém dos russos brancos.[xlii]

O historiador americano Robert Levine citou, pela primeira vez, em 1970, cópia de um telegrama do embaixador do Brasil em Londres, Sousa Leão, a Getúlio, mencionando um pedido do consultor do Foreign Office inglês para que se evitasse, em 1940, a deportação de Gruber para a Alemanha nazista.[xliii] O jornalista Waak, que cita este dado, considera-o impossível, porque, confiando no último registro sobre o interrogatório de Jonny/Gruber em Moscou, deduziu, com bastante probabilidade, que ele tivesse desaparecido nos expurgos sangrentos do Grande Terror.[xliv] Mas o agente inglês “renasceu das cinzas” em 2010.[xlv]

A dúvida instalada na década de 1930 permaneceu, e as prisões continuaram a ser atribuídas a confissões de militantes brasileiros brutalmente torturados, sobretudo “Miranda”. Muitos chegaram à conclusão de que esse mistério nunca seria esclarecido. Por isso surpreendeu a publicação nos Estados Unidos, em 2010, de uma biografia de Jonny de Graaf, com trechos autobiográficos. O livro foi rapidamente traduzido e publicado no Brasil.[xlvi] Na historiografia dedicada aos serviços secretos ingleses, o nome do agente é “Jonny X”, sem h, como também o é na historiografia brasileira, o que não acontece na biografia.[xlvii]

Seu principal autor é o acadêmico D. S. Rose, que partiu de descoberta feita nos arquivos da polícia política brasileira, em 1991. O segundo autor é o escritor Gordon D. Scott que, em menino, conviveu com o ilustre espião inglês em Montréal, no Canadá, maravilhou-se com a sua história e, entre 1975 e 1976, gravou artesanalmente entrevistas, conseguindo “uma montanha de fitas”, cuja transcrição perdeu-se parcialmente. Jonny morreu com 86 anos.

D. S. Rose, que escreve a “Introdução”, reconhece que o biografado tem um percurso complicado. “Evitava os judeus, podia ser vingativo e provavelmente assassinou uma de suas mulheres. […] mas o que fez pelo governo de Sua Majestade, supera as falhas e justifica contar a história”.[xlviii] Tanto respeito por Sua Majestade faz da biografia uma narrativa hagiográfica dos fastos memoráveis do agente inglês.

O livro tem essencialmente por base as entrevistas gravadas por Rose e o interrogatório a que Jonny foi submetido pelo FBI, em 1952, em Montréal, quando desempregado do MI 6 inglês (Military Intelligence – 6), ofereceu seus serviços aos americanos. Tem o mérito de elucidar a cronologia das viagens de Jonny. Fora isso a narrativa indigesta do agente inglês é um amontoado de mentiras e bobagens, onde transparece o lado imoral da personagem: vingativo, mercenário, intrigante, com tendências pedófilas, partidário sempre do lado do mais forte, autoelogiando-se em todos os episódios narrados.

Foi pela primeira vez à URSS, em 1930, e desde então nasceu o seu ódio ao regime comunista, mantra que ele repete a cada ocasião, talvez para bem impressionar os interrogadores do FBI.[xlix] Depois de algumas tentativas para se tornar “agente duplo”, finalmente encontrou na embaixada inglesa de Berlim, em junho de 1933, o serviço secreto que o empregaria até pouco depois da Segunda Guerra Mundial: o MI 6 – SIS (Secret Intelligence Service), na figura do agente do SIS, Frank Foley, que formalmente exercia a função de controle de passaportes.[l]

Jonny tinha muitas vinganças a executar, especialmente contra Artur Ewert. Historiando suas desavenças com ele, como a se justificar de tê-lo entregado a uma polícia sanguinária, Jonny menciona episódios de confronto na Alemanha, em 1923, depois na China, para onde também tinha sido enviado. Aproveita para fazer várias acusações graves a Ewert sobre esse período, inverificáveis, relativas a complicações de dinheiro e à tentativa de seu assassinato.[li] Para quem ainda duvide que a queda de Ewert deveu-se a Jonny/Gruber, ela está assinalada até na historiografia dedicada aos serviços secretos ingleses.[lii]

Além de Ewert, Jonny também entregou “Miranda”, comunistas chineses e o Comitê Central do Partido Comunista Argentino.[liii] As indisfarçáveis tendências pedófilas de Jonny de Graaf/Gruber não conseguem ser esmaecidas, apesar da condescendência de seus biógrafos. Contado por ele a Scott, Jonny, com 33 anos, em 1927, viu, em um comício, a menina Helena Krüger, de 9 anos. Deu um jeito de ficar íntimo da família, remotamente ligada ao KPD, mediante somas em dinheiro. Levou-a para a Inglaterra como companheira, quando ela tinha apenas 14 anos. Como que justificando moralmente o posterior assassinato dela, vai pontuando o seu cansaço de “Lena” e sua inclinação pela irmã mais nova, Gerti, também de 9 anos, que começou a seduzir em 1931.

Entretanto acaba ficando com “Lena” para o empreendimento Brasil. Logo depois da tragédia das prisões que se seguiram ao levante de 1935, Jonny e “Lena” foram para a Argentina, ainda em janeiro de 1936. Instalaram-se com luxo em uma casa na Calle Florida. Em novembro desse mesmo ano Jonny recebeu ordem de Moscou para voltar com Helena. Em 3 de dezembro, segundo seu relato, ela se suicidou com o seu rifle Winchester. Ou melhor, ele a matou com seu rifle, como se pode concluir por elementos da própria biografia, a seguir relatados. Em suas memórias, recolhidas pelo autor Scott, ele não fala sobre a morte de Helena. Com estudantes universitários de Montréal, disse, certa vez, que matou uma mulher que Moscou tinha infiltrado para espioná-lo.

Em seu interrogatório pelo FBI, em 1952, Jonny não ia falar nada aos investigadores, quando foi surpreendido com a pergunta deles sobre se Helena tinha se suicidado. A versão mais citada, entre as diversas que deu, foi que ela tinha se suicidado depois de ele ter descoberto que ela tinha um amante, um médico do exército argentino. A explicação não tem nenhuma lógica como causa de um suicídio. Os seus biógrafos fazem piruetas para contar todas as versões estapafúrdias que circularam e chegar à conclusão de que Jonny “pode ter matado” Helena. Ela tinha 19 anos. Nisso tudo permanece o mistério de como as autoridades argentinas engoliram a história do suicídio, apenas pedindo que ele saísse do país, como nada foi publicado sobre esse caso em qualquer jornal e como os registros policiais correspondentes foram queimados.[liv] São milagres que só podem ser atribuídos à força do MI 6 – SIS inglês naquele país.

Se tivesse chegado a Moscou, “Lena” teria muita coisa interessante a contar à comissão que interrogou Jonny, formada, segundo ele, por Stella Blagoeva, Gevork Alikhanov e outro membro do Departamento de Quadros do Comitê Executivo da Internacional Comunista. Afinal, ela foi a motorista de Prestes antes e durante o levante de 1935. Jonny chegou a Moscou em 5 de março de 1937. Houve muitos interrogatórios e meses de espera, segundo ele. Só conseguiu sair em 18 de maio de 1938. Alikhanov chegou a apontar dez pontos inverossímeis na trajetória de Jonny, conforme documentos russos.

O mais instigante é o fato de ele só ter relatado o suicídio de “Lena” ao chegar lá. Além disso, os soviéticos se impressionaram com o fato de seu passaporte, em nome de Gruber, não ter visto de saída da Argentina.[lv] Mas Jonny conseguiu livrar-se de todos os questionamentos e sair da URSS. É um milagre, ainda maior que o da Argentina, que Moscou tenha deixado escapulir-lhe pelos dedos um agente do MI 6 – SIS infiltrado no comunismo, que arruinara o partido brasileiro. Como é que Moscou, tão exigente e detalhista com o casal Stuchevski,[lvi] diante das histórias retorcidas e aberrantes contadas por Jonny, caiu nessa esparrela?

Tudo o que Jonny conta dessa estadia na URSS serve mais para inglês ver. Até as personagens que ele cita como seus protetores já tinham sido engolidas pelo Grande Terror. Segundo ele, funcionaram como referência positiva para o seu caso Pável Vassíliev, seu professor na escola de sabotagem na URSS, e o general Berzin, que esteve com ele desde os primeiros dias de sua estadia até o último, conforme alega. Ora, Berzin estava na Espanha e foi chamado de volta, como já dissemos, em maio de 1937. Foi condecorado com a Ordem de Lênin mas logo em seguida foi envolvido pelo Grande Terror. Em novembro seguinte, estava preso e foi fuzilado em julho de 1938.[lvii]

Quanto a este Pável, deve tratar-se, na verdade, de Boris Afanássevitch Vassíliev, que desde 1925 atuava no aparelho do Komintern e que dirigiu, até 1935, o departamento de organização, também se ocupando de formação militar técnica. De fato, ele participou dos preparativos para a insurreição brasileira, juntamente com Piátnitski e Sinami (pseudônimo de Georgi Vassílievitch Skalov). Mas foi atingido pelo Grande Terror, no processo que levou à queda em desgraça de Piatnitski, em 1937. Sinami foi fuzilado antes, em 1936.[lviii] É bastante difícil imaginar que a liberação de Jonny tenha acontecido por causa de seus dois supostos protetores, já presos.

Foi depois dessa sobrevida oferecida por Moscou que Jonny voltou ao Rio de Janeiro, agora a serviço apenas do MI 6 inglês, para atuar como provocador dentro dos grupos nazistas do Brasil. Foi dessa vez que experimentou, em 1940, um pouco da tortura esmerada a que tinha arrastado Ewert, nas mãos do feroz torturador Cecil Borer.[lix] Foi salvo pelo SIS, que interveio diretamente junto ao presidente Getúlio Vargas, através de seu embaixador em Londres.

Por outro lado, duas personagens se destacam no conjunto de acontecimentos dramáticos da repressão do governo de Vargas, que se seguiu à derrota do levante de 1935: “Miranda” (Antonio Maciel Bonfim), que usava os nomes de Adalberto de Andrade Fernandes, “Américo”, ou “Keirós” na URSS, secretário-geral do PCB, o posto mais importante nos partidos comunistas; e sua companheira “Elza Fernandes” (Elvira Cupello Calonio), a “Garota”, uma mocinha com idade variando, conforme a fonte, entre os 16 e os 21 anos, analfabeta ou precariamente alfabetizada, irmã de três militantes operários de Sorocaba[lx] e que o secretário-geral levava a todas as reuniões e encontros.

Em 13 de janeiro de 1936 o casal foi preso. Era a primeira prisão importante entre os comunistas brasileiros. A partir dessa data o resto do Secretariado Nacional se comunicava com Luís Carlos Prestes, vivendo em uma pequena casa no Meier, bairro então afastado do Rio de Janeiro, através de cartas e bilhetes várias vezes ao dia. O tema principal era o caso “Garota”. E isso continuou até a prisão de Prestes, em 5 de março, e a confiscação pela polícia do seu arquivo, inclusive dessa correspondência.[lxi]

O que aconteceu nesse interregno permaneceu, e em certa medida permanece ainda, envolvido no maior mistério. É aí, nesse período de medo, incerteza e incompreensão, que os procedimentos stalinistas de militância chegaram ao paroxismo. Durante muito tempo, os acontecimentos relativos ao caso “Garota” foram omitidos por uma história que se quer séria e não trata de crimes da vida cotidiana, ou por um corporativismo de partido próprio do método stalinista de apagar fotos e reescrever histórias. Esses acontecimentos também foram, quando era difícil ocultar, revelados aos pedaços, consolidando inverdades que se repetiram ao longo de décadas. Nessa trajetória das histórias, “Miranda” foi escolhido como bode expiatório, procedimento típico do stalinismo.

Ele não era um tipo fácil. Depois da sua prisão as caracterizações as mais diversas possíveis choveram. Em Moscou, onde participou na chamada “Conferência dos Partidos Comunistas da América do Sul,” impressionou pela capacidade de argumentar em francês sobre a maturidade da revolução no Brasil.[lxii] Os julgamentos internos eram severos. Para uns era “fanfarrão”, “parlapatão, baiano demais”, “parlapatão, bem-falante, vaidoso e aventureiro”.[lxiii]

Na prisão, Graciliano Ramos se impressionou com o alarde que “Miranda” fazia das marcas de suas torturas, um “profissional da bazófia”. Com o tempo enxergou nele “inconsistência, fatuidade, pimponice. Vivia a mexer-se, a falar demais, numa satisfação ruidosa, injustificável”. Critica-lhe, no discurso, “erros numerosos de sintaxe e de prosódia […] deformando períodos e sapecando verbos”. Da crítica à falta de qualidade da sua prosa, Graciliano Ramos transita para o amálgama. Um comentário infeliz de “Miranda” o convence “de que não nos achávamos diante de um simples charlatão. Em quem deveríamos confiar? Felizmente aquele se revelava depressa”.

E de amálgama em amálgama, chegou-se à calúnia. Por exemplo, com o militante Leôncio Basbaum, para quem “Miranda” era, desde 1932, quando foi eleito para a nova direção do PCB, um “provocador profissional”, “o famigerado Américo Maciel Bonfim, aventureiro típico que, conforme se soube mais tarde, depois do levante de 27 de novembro de 1935, era um agente de polícia”. E essa versão não era só sua, espalhara-se, tomando ares de verdade verificada, por exemplo, na nota de rodapé do livro do brasilianista Chilcote.[lxiv] A culpabilização de “Miranda” servia para justificar, a posteriori,o assassinato de sua companheira, a jovem “Elza”, a “Garota”, ou ocultar esse fato num emaranhado de suspeitas jamais comprovadas.

Mas com o tempo e as novas informações, sem a paixão das antipatias, o julgamento se moderou. Mesmo a prova cabal de que “Miranda” colaborava com a polícia – uma carta oriunda dos arquivos policiais, supostamente dele para o chefe de polícia, Filinto Müller, datada de 11 de julho de 1942 – protestando juras de fidelidade e críticas ao bolchevismo em um estilo mais próprio dos próceres do governo – foi desmistificada pela militante comunista de 93 anos, Sara Becker, contemporânea de “Elza”.

Entrevistada em 2009 pelo jornalista Sérgio Rodrigues, achou incoerentes os termos utilizados em carta de um ex-militante e notou que a assinatura que estava em baixo da carta era de um nome diferente do dele: ele não era “de Bonfim”, e sim Bonfim. “Quem erra o próprio nome?” exclamou. Para ela, “Miranda era um homem bom”. No livro sobre “Elza”, o jornalista abordou ainda o momento da carta: naquele início de julho a facção do governo de Vargas, favorável à aliança com os Aliados na guerra, estava vencendo a facção que puxava o governo para uma aliança com os nazifascistas do Eixo, entre eles, Filinto Müller, que estava a ponto de perder a chefia da polícia. Tinha interesse em reavivar o perigo do comunismo.[lxv]

Para a historiadora Marly Vianna: “Antônio Maciel Bonfim foi muito torturado. Adotou, diante da polícia a posição de confirmar tudo aquilo que ela já soubesse e calar o que pudesse fornecer-lhe novos elementos. […] Não houve prisões por indicação de Miranda, mas havia nomes e endereços em seu arquivo – como, aliás, nos de Berger e de Prestes – e pessoas foram presas. […] Foi somente depois de saber do assassinato da companheira que “Miranda”, transformado num trapo humano, passou a colaborar com a polícia. […] Ao ser libertado, com a anistia de 1945, Antônio Maciel Bonfim estava tuberculoso, sem um rim – que perdera nos espancamentos sofridos na prisão – e na mais absoluta miséria. […] Voltou para a Bahia, onde morreu em Alagoinhas pouco tempo depois”.[lxvi]

A história que se quis ocultar iniciou quando “Elza” foi solta, em 26 de janeiro de 1936. Segundo ela contava, a polícia lhe dissera que podia visitar “Miranda”, o que ela fez, trazendo para os dirigentes do partido recados dele e papeizinhos com mensagens sobre o que estava acontecendo na prisão. Normalmente, “Miranda” deveria estar incomunicável, mas provavelmente a polícia esperava retirar alguma informação da situação. Desse fato se passou às suspeitas: “Elza”, a “Garota”, como a chamavam nas cartas trocadas entre Prestes e o Secretariado Nacional do partido, trabalhava para a polícia. Os bilhetes não eram de “Miranda”.

Como poderiam ser se ele deveria estar incomunicável? As quedas, que continuavam, eram atribuídas a ela. Caiu uma casa em Copacabana cujo endereço só era conhecido de “Miranda” e mais dois dirigentes: Prestes, que achava que os dirigentes não quebram, concluiu que a “Garota” devia também conhecer o endereço. Os militantes soltos resolveram então tirar “Elza” de circulação, um verdadeiro sequestro, ainda que parecendo alojamento e proteção a alguém que não tinha onde morar. Foi levada para a casa de “Tampinha” (Adelino Deícola dos Santos), que era do Secretariado Nacional, em Deodoro.

Seguiu-se a frenética troca de cartas e bilhetes sobre a “Garota”. De um lado, os membros do Secretariado Nacional – “Martins” (Honório de Freitas Guimarães), “Bangu” (Lauro Reginaldo da Rocha), “Abóbora” (Eduardo Xavier) e “Tampinha”, excluído da direção “Brito” (José Lago Morales), que ficara indignado com os procedimentos que se anunciavam. De outro Prestes, na casa do Meier, onde também estavam Olga e os Stuchevski. Eles queriam ter uma prova de que “Elza” trabalhava para a polícia e tentaram confundi-la para que se traísse, o que não aconteceu. Houve vacilação em certo momento, mas a conclamação à firmeza própria de todo comunista, evocada por Prestes, e o apelo a deixar de lado sentimentalismos de qualquer ordem resolveu a questão.

Afinal, nos primeiros dias de março, com a presença e a ajuda manual de todos os já citados, membros do Secretariado Nacional, e mais “Gaguinho” (Manuel Severiano Cavalcanti), “Elza” foi estrangulada por “Cabeção” (Francisco Natividade de Lira) com uma corda de varal. Enterraram o corpo no quintal da casa. Diz a historiadora Marly Vianna: “Nem sequer estavam convencidos da culpabilidade da moça”.[lxvii] Reza a pequena história que “Abóbora” não aguentou a brutalidade da cena e, em um canto, pôs-se a vomitar.[lxviii]

Quando o conjunto das cartas trocadas sobre o caso “Garota” caiu nas mãos da polícia, o sentido delas e o fato em si não ficaram claros. Mas em 1940 os membros do Secretariado Nacional foram presos e barbaramente torturados. O assassinato de “Elza” e o local onde seu corpo foi enterrado foram descobertos e o sensacionalismo ganhou as páginas dos jornais.[lxix] Foi nessa época que ficou esclarecido também outro crime dos comunistas, atribuído por eles à polícia. Em 1934, no Rio de Janeiro, havia grande agitação e começaram a aparecer cadáveres em decomposição na floresta da Gávea, de “numerosos elementos proletários”, conforme os comunistas.

Um dos corpos encontrados, crivado de balas, em 26 de outubro, era o do estudante Tobias Warchavsky, da Juventude Comunista. Era filho de imigrantes judeus, considerado um comunista radical e com grande talento para desenhar. A morte dele foi denunciada pelos comunistas como obra do governo varguista.[lxx] Mas em 1940 foi esclarecido que o autor era o PCB, que o tinha considerado um espião. O executor foi o mesmo “Cabeção” (Francisco Natividade de Lira), mas “Martins” (Honório de Freitas Guimarães) foi considerado o responsável e condenado a 30 anos.[lxxi]

Um boletim do PCB, de dezembro de 1940, condenava os trotskistas por explorarem a “farsa” desses julgamentos, afirmando que Prestes e os seis comunistas tinham sido condenados por crimes que, na verdade, tinham sido cometidos pela polícia.[lxxii] Não era essa a opinião de Stela Blagoeva, a búlgara do Departamento de Quadros da Internacional Comunista. No final de 1936, tomando conhecimento por “Abóbora” (Eduardo Xavier), recém-chegado a Moscou, que além de Elza, o partido havia assassinado Warchavsky, deu-lhe um conselho: não era correto liquidar provocadores e atribuir esse mérito à polícia.[lxxiii] A liquidação era uma glória que devia ser assumida com orgulho. Eis como se fez uma história costurada com inverdades, mas que, muito tempo depois, acabaram por sair à luz do dia.

*Angela Mendes de Almeida é professora de História na PUC-SP. Autora, entre outros livros, de Do partido único ao stalinismo (Alameda). [https://amzn.to/3SuChJB]

Notas

[i] Marly de Almeida Gomes Vianna, Revolucionários de 35 – Sonho e realidade. São Paulo, Companhia das Letras, 1992; Paulo Sérgio Pinhero, Estatégias da ilusão. A revolução mundial e o Brasil (1922-1935). São Paulo, Companhia das Letras, 1991.

[ii] Michael Löwy (org.), O marxismo na América Latina. Uma antologia de 1909 aos dias atuais. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 2000, p. 127.

[iii] Margarete Buber-Neumann, La révolution mondiale. Histoire du Komintern (1919-1943) racontée par l´un de ses principals témoins. Tournai: Castermann, 1972, pp. 191, 193, 202.

[iv] Fernando Morais, Olga. A vida de Olga Benario Prestes, judia comunista entregue a Hitler pelo governo Vargas. São Paulo, Editora Alfa-Omega, 1985, p. 68.

[v] Boris Volodarsky, Stalin’s Agent – The life and death of Alexander Orlov. Oxford: University Press, 2015, p. 595.

[vi] Margarete Buber-Neumann, La révolution mondiale…, op. cit., pp. 100, 211-213.

[vii] Ossip K. Flechtheim, Le parti communiste allemand sous la République de Weimar. Paris: Maspero, 1972. pp. 132, 167, 185, 312, 314.

[viii] Dictionnaire Biographique des Kominterniens. Belgique, France, Luxemburg, Suisse. Collection Maitron, Les Éditions de l’Atelier.

[ix] Jan Valtin, Sans patrie ni frontières. Paris: JCLattès, 1975, pp. 141,183-184, 187-189, 194, 228.

[x] Fernando Morais, op. cit., pp. 71-73.

[xi] Ibid., p. 68.

[xii] William Waak, Camaradas: nos arquivos secretos de Moscou. A história secreta de revolução brasileira de 1935.São Paulo, Companhia das Letras, 1993, pp. 105-106.

[xiii] Boris Volodarsky, Stalin’s Agent …, op. cit., pp. 513-514.

[xiv] William Waak, op. cit., pp. 77, 105-106, 154; R. S. Rose e Gordon D. Scott, Johnny. A vida do espião que delatou a rebelião comunista de 1935. Rio de Janeiro, Record, 2010, p. 292. Na historiografia brasileira e inglesa o nome é escrito sem o h.

[xv] William Waak, op. cit., pp.172-173.

[xvi] Ibid., pp. 154, 290

[xvii] Fernando Morais, op. cit., pp. 37 e 56-57.

[xviii] William Waak, op. cit., pp. 174, 215.

[xix] Daniel Aarão Reis, Luís Carlos Prestes. Um revolucionário entre dois mundos. São Paulo, Companhia das Letras, 2014, pp. 183-184.

[xx] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 217-218.

[xxi] Daniel Aarão Reis, op. cit., pp. 184-185.

[xxii] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 258-259, 267.

[xxiii] Fernand Morais, op. cit., p. 175.

[xxiv] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., 217, 270, 300.

[xxv] Ibid., pp. 277, 280-281.

[xxvi] John W. F. Dulles, O comunismo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1985, p.19.

[xxvii] William Waak, op. cit., pp. 244, 254.

[xxviii] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 139, 285; William Waak, op. cit., 176, 247, 251.

[xxix] Daniel Aarão Reis, op. cit., p.191; William Waak, op. cit., p. 300.

[xxx] Margarete Buber-Neumann, La révolution mondiale …, op. cit., p. 353.

[xxxi] Anita Leocádia Prestes, Olga Benario Prestes – Uma comunista nos arquivos da Gestapo. São Paulo, Boitempo, 2017, pp. 75-78; Rochelle G. Saidel, As judias do Campo de Concentração de Ravensbrück. São Paulo, Edusp, 2009, pp. 44, 62.

[xxxii] Citado por John W. F. Dulles, op. cit., pp.97-101.

[xxxiii] William Waak, op. cit., p. 343.

[xxxiv] Jonh W. F. Dulles, op. cit., p. 19.

[xxxv] William Waak, op. cit., pp. 273-277, 282.

[xxxvi] Ibid., pp. 248-250, cf. relatório específico de “Martins” (Honório de Freitas Guimarães); Jonh W. F. Dulles, op. cit., p. 17.

[xxxvii] William Waak, op. cit., pp. 135-136, a partir de relatório de “Martins”; John W. F. Dulles, op. cit., p.18.

[xxxviii] Willaim Waak, op. cit., p. 258.

[xxxix] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 293, 297.

[xl] William Waak, op. cit., p. 276.

[xli] Marky de Almeida Gomes Vianna, op. cit., p. 299.

[xlii] William Waak, op. cit., pp. 307, 321.

[xliii] Robert Levine, O regime de Vargas, editado em 1980, citado por ibid., p. 366.

[xliv] Ibid., p. 277.

[xlv] Dainis Karepovs, “Mentiras e mortes,” Teoria e debate, 30 de agosto de 2011 – https://teoriaedebate.org.br/estante/johnny-a-vida-do-espiao-que-delatou-a-rebeliao-comunista-de-1935/.

[xlvi] R. S. Rose e Gordon D. Scott, Johnny. A vida do espião que delatou a rebelião comunista de 1935. Rio de Janeiro, Record, 2010.

[xlvii] Cf. Keith Jeffery, MI6: The History of the Secret Intelligence Service (1909-1949) London, 2010, citado por Boris Volodarsky, Stalin’s Agent …, op. cit., pp. 192, 594.

[xlviii] R. S. Rose e G. D. Scott, op. cit., pp. 21, 22 e 23.

[xlix] Ibid., pp. 154, 166, 226, 496, n.19.

[l] Boris Volodarsky, Stalin’s Agent …, op. cit., p. 192.

[li] R. S. Rose e G. D. Scott, op. cit., pp. 139, 150, 221, 241, 245, 247, 248, 251.

[lii] Boris Volodarsky, Stalin’s Agent …, op. cit.,p. 193.

[liii] R. S. Rose e G. D. Scott, op. cit., pp 251, 278-9, 284.

[liv] Ibid., pp . 147, 210, 285, 291-294, 519.

[lv] Ibid., pp. 297-298, 302.

[lvi] William Waak, op. cit., pp. 329, 331-332.

[lvii] Boris, Volodarsky, El caso Orlov …, op. cit., pp. 206-207.

[lviii] Pierre Broué, História da Internacional Comunista (1919-1943). 2 tomos. São Paulo: Sundermann, 2007. t. 2, p.1336.

[lix] R. S. Rose e Gordon D. Scott, op. cit., pp. 351-354.

[lx] Sérgio Rodrigues, Elza, a Garota – A história da jovem comunista que o partido matou. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2009, pp. 8-10; Leôncio Martins Rodrigues, “Sindicalismo e classe operária (1930-1964)” in: História Geral da Civilização Brasileira – III O Brasil Republicano – 3 – Sociedade e política. São Paulo, Difel, 1986, p.379.

[lxi] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 287, 292, 300.

[lxii] Raimundo Nonato Pereira Moreira, Thiago Machado de Lima, Letícia Santos Silva, Iracélli da Cruz Alves e Cláudia Ellen Guimarães de Oliveira, “O célebre Miranda: aventuras e desventuras de um militante comunista entre a história e a memória”. Práxis – Revista eletrônica de história e cultura. http://revistas.unijorge.edu.br/praxis/2011/pdf/62_oCelebreMiranda.pdf.

[lxiii] Citados por Sérgio Rodrigues, op. cit., p. 73.

[lxiv] Leôncio Basbaum, História sincera da República – vol. 3 De 1930 a 1976. São Paulo, Alfa-Omega, 1975-1976, pp. 75-76; Ronald H. Chilcote, Partido Comunista Brasileiro – Conflito e integração. Rio de Janeiro, Graal, 1982, p. 79, n. 59.

[lxv] Sérgio Rodrigues, op. cit., pp. 112-114.

[lxvi] Marly de Almeida Gomes Vianna, op. cit., pp. 288, 297-298.

[lxvii] Ibid., p. 297.

[lxviii] Fernando Morais, op. cit., p. 160.

[lxix] John W. F. Dulles, op. cit., pp. 200-204.

[lxx] Cláudio Figueiredo, Entre sem bater – A vida de Apparício Torelly, o Barão de Itararé. Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2012, p. 233.

[lxxi] John W. F. Dulles, op. cit., pp. 205, 207, 209.

[lxxii] Citado por ibid., p. 209.

[lxxiii] W. Waak, op. cit., pp. 319, 324, 332.


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