Especialistas discutem alternativas ao
aquecimento global Segundo Ignacy Sachs, é preciso
reduzir o consumo da energia, e não só substituir o petróleo. Para Ladislau
Dowbor, os biocombustíveis podem ser socialmente benéficos se a agricultura
familiar for integrada.
Bernardo Kucinski e Flávio Aguiar
Carta Maior
SÃO PAULO – Dando início a uma
série de debates sobre alternativas ao aquecimento global, a Carta Maior
reuniu no dia 10 de março, em seu estúdio, os professores Ignacy Sachs e
Ladislau Dowbor, entrevistados por Flávio Aguiar, editor-chefe, e Bernardo
Kucinski, editor-associado. Na pauta de discussões, as possibilidades de
substituição dos combustíveis fósseis por renováveis e a sustentabilidade desse
processo.
Para o eco-sócio-economista Ignacy Sachs, da Escola de Altos Estudos
Na mesma linha, o economista
Ladislau Dowbor, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP),
avalia que é possível aproveitar “essa demanda, essa valorização, em termos de
produção de renda, que a associação da agricultura com a produção de matéria
energética através de culturas consorciadas, de se associar a agricultura
alimentar com a produção energética”.
Ele ressalta, porém, que se
apenas os interesses empresariais prevalecerem, a monocultura pode ser
destrutiva, como ele já presenciou in loco ao trabalhar em países
africanos. Dowbor, formado na Polônia e na França, tem 25 livros publicados e é
renomado especialista em economia solidária e organização do trabalho.
Sachs, nascido em Varsóvia, em
1927, é professor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais
de Paris desde 1968. Tem mais de 20 livros publicados e dirige o Centro de
Estudos sobre o Brasil Contemporâneo na França. É um dos maiores especialistas
do mundo em desenvolvimento sustentável. A seguir, a primeira parte da
entrevista com os pesquisadores, que também será editada em DVD oportunamente.
Flávio Aguiar – O aquecimento global e seus efeitos nocivos são um consenso hoje?
Flávio Aguiar – O aquecimento global e seus efeitos nocivos são um consenso hoje?
Ladislau Dowbor – Acho que sempre é muito extenso o tempo que os cientistas levarão para adquirirem uma razoável certeza (e quando são responsáveis nunca têm completa certeza, mas apenas uma razoável certeza, o que é um problema) sobre o aquecimento global, e isso alcançar formadores de opinião e depois evoluir para o nível político, onde se possa tomar decisões. E esse processo se torna muito mais lento no caso do aquecimento global, devido a iniciativas como, por exemplo, a da ExxonMobil, que gastou rios de dinheiro metendo matéria na imprensa tentando desacreditar a idéia mesma de aquecimento global (1).
Ignacy Sachs – Acho que o
trabalho desse grupo de cientistas internacionais está talvez sendo usado como
um pretexto para não se passar ao debate político, que tem que ser feito agora.
Porque sempre vai haver diferenças de opinião entre os cientistas. Não podemos
nos dar ao luxo de esperar até que eles acabem por estar todos de acordo para
tomar decisões. Agora, ao mesmo tempo é muito perigoso exagerar essa questão da
falta de tempo, porque se não há mais tempo para fazer o que quer seja, a
melhor coisa é preparar-se para o fim. Na época da Guerra Fria, circulava no
leste da Europa uma piada. O que fazer se começar um alerta atômico? Sem
pressa, para não gerar pânico, ir ao armário, pegar o melhor terno, botar
camisa branca e gravata escura, e dirigir-se sem correria ao cemitério mais
próximo [Risos]. Se não há mais outra coisa a fazer, só nos resta isso. Acho
extremamente perigoso este alarmismo. Ele já prejudicou o debate nos anos 70
com o Clube de Roma, que nos dizia que no fim do século XX só haveria uma
alternativa: ou morrer por falta de recursos ou morrer por excesso de poluição
(2).
Bernardo Kucinski – Queria
lembrar outras previsões catastrofistas, como, por exemplo, a explosão
demográfica. Mas também nós tivemos algumas histórias de sucesso, como aquela
do gás da geladeira (3).
Sachs – Porque era simples
e coincidia com os interesses econômicos de um grande grupo industrial.
Kucinski – Exatamente.
E queria chamar atenção para um outro fato. A expressão aquecimento global é
globalizante, mas os efeitos não são os mesmos nas diferentes regiões da Terra.
Sachs – Nem serão
imediatos. Quando nos dizem que os oceanos vão aumentar em um metro, por
exemplo, parece que haverá um aumento imediato, mas não é assim...
Kucinski – E lamentavelmente parece que os efeitos no hemisfério norte, que é onde estão os centros de poder, são muito menores do que serão nos países tropicais. Então, há menos urgência nestes países. Está correta essa afirmação?
Kucinski – E lamentavelmente parece que os efeitos no hemisfério norte, que é onde estão os centros de poder, são muito menores do que serão nos países tropicais. Então, há menos urgência nestes países. Está correta essa afirmação?
Sachs – Não sei. A única
coisa que nós podemos dizer com certeza é que haverá mudanças climáticas e que
elas vão se caracterizar pelas amplitudes cada vez maior dos fenômenos. Mais
seca, mais inundação, mais tsunami etc. Agora, nós não sabemos como isso vai
incidir sobre diferentes áreas. Um exemplo é o da Corrente do Golfo. Uma das
hipóteses discutidas é a de que com o derretimento das geleiras da Groenlândia
e mesmo da calota polar a Corrente do Golfo vai mudar de rumo. Se isso
acontecer, o aquecimento global vai provocar o resfriamento do clima na Europa
do Norte.
Kucinski – Agora, por
exemplo, professor, dizem que essas repetidas secas no Rio Grande do Sul
significam que já houve uma mudança de padrão climático. Elas não são
episódicas. Já fazem parte de um novo padrão.
Dowbor – Acho que o que o
Ignacy diz é forte. De um lado, nós temos um processo real que exige tomar
medidas. Por outro lado, a gente tem que evitar que isso vire um chavão de um
tempo, e que tudo mundo liga qualquer problema que acontece a esse processo
global e a gente evita de tomar as medidas racionais.
Aguiar – Se nós
olharmos o cinema de hoje, por exemplo, existe disseminada uma estética do fim.
O fim pode ser bonito. Seja o do Titanic, que mostra o fim de uma época, seja a
o da Guerra dos Mundos, que mostra o impasse de uma civilização. O fim, como é
uma coisa extrema, motiva atitudes moralmente dignas ou indignas. Mais do que
uma preocupação, existe uma verdadeira estética do fim. Está cada vez mais
difícil nós termos uma estética da continuidade da vida. Como nós podemos
pensar isso?
Sachs – A síndrome do Titanic, aliás, é o título de um livro de um ambientalista francês, Nicolas Hulot, muito influente. Mas o fim não é um fenômeno esteticamente agradável. Agora, é claro que a arte vai sempre exagerar.
Sachs – A síndrome do Titanic, aliás, é o título de um livro de um ambientalista francês, Nicolas Hulot, muito influente. Mas o fim não é um fenômeno esteticamente agradável. Agora, é claro que a arte vai sempre exagerar.
Kucinski – E também não
é novo, né? A idéia do fim do mundo já ocorreu várias vezes na história da
humanidade.
Sachs – Não é novo. Se nós
temos que saber quantas décadas nós temos para fazer a adaptação, é
absolutamente fundamental para desenhar o processo. Se me dizem que em dez anos
tem que mudar tudo, digo: “Vamos para o cemitério mais próximo”. Agora, se me
dizem que eu tenho meio século, um século... O seu exemplo demográfico era
muito bom. Falava-se da explosão-bomba da população. Como se controla a
explosão demográfica? Através de medidas autoritárias, como ensaiou a China, ou
através de uma política social, pela melhora das condições do campo, a melhora
da educação das meninas, a melhora das condições sanitárias, com menor
mortalidade infantil, com redução da taxa de natalidade? Se eu tenho trinta ou
quarenta anos para essa mudança social, valer uma estratégia. Se eu não tenho
esse tempo, vale uma outra. Por isso, eu acho: não há dúvida de que temos que
mudar o padrão energético deste mundo em que vivemos e reduzir o uso das
energias fósseis. Dispomos para isso de algumas décadas. Temos que sair do
petróleo antes que ele se esgote completamente. Não é pelo esgotamento do
petróleo que temos que sair dele. Ao contrário, é por causa dos efeitos
nefastos da energia fóssil. E eu diria: viva a crise do preço do petróleo! O
alto preço do petróleo permite fazer coisas que deveriam ter sido feitas já
antes. Elas não estavam sendo feitas num mundo que continua a se organizar ao
redor de decisões que são tomadas unicamente em função de resultados econômicos
de curto prazo. Enquanto o petróleo estava barato, não se fazia nada. O
petróleo focou caro, os biocombustíveis estão competitíveis, e todo mundo de
repente descobre a necessidade de sair da energia fóssil...
Kucinski – Mas o petróleo não está mais caro. O petróleo ainda custa hoje menos do que custa um litro de água mineral.
Kucinski – Mas o petróleo não está mais caro. O petróleo ainda custa hoje menos do que custa um litro de água mineral.
Sachs – O petróleo está
hoje mais caro do que estava há três anos atrás.
Kucinski – Mas não mais
caro do que estava há 15 anos atrás.
Sachs – Mas isso não tem
importância. O petróleo hoje está acima do patamar de competitividade do
etanol. É por isso que todo mundo está falando do etanol. O etanol é
competitivo a partir de 35 dólares o barril do petróleo. O petróleo está acima
de 50. Há razões para pensar que ele nunca mais vai baixar abaixo de 50. Talvez
suba até 100, ou mais. Portanto, gerou uma situação onde se pode fazer os
biocombustíveis.
Dowbor – Basicamente, na
visão positiva, que é a que nos interessa, o fato do aquecimento global estar
se tornando uma preocupação planetária está, pela primeira vez, agregando
diversas forças, está colocando a longo prazo a necessidade de pactuações de
interesses planetários. Porque nós falamos de aquecimento global porque a
questão emergiu, porque tem o filme do Al Gore (4). Mas, na realidade, nós
temos a destruição dos recursos de vida nos mares, temos o problema nas
florestas, o esgotamento do solo, esterilização. Quer dizer, nós termos um
conjunto de processos. Então o avanço da capacidade planetária, da gente
começar a tomar medidas pactuadas e organizadas, é vital. Agora, eu queria puxar
uma pergunta para o Ignacy, que me parece central, que é o seguinte: no caso da
gente transitar para os diversos usos da agricultura, agora reforçando sua base
de fonte energética, isso tanto pode ser um bem, de um lado dinamizava o
conjunto de atividades agrícolas, como pode se transformar, especialmente no
caso do Brasil, em mais um ciclo de monocultura destrutiva em termos ambientais
e econômicos e de concentração de renda. Quais são as opções de organização que
a gente estaria recomendando?
Sachs – Você está botando
o dedo na ferida. Eu acho que, primeiro, não devemos reduzir o problema da
saída da energia fóssil unicamente ao problema da substituição. Temos que
começar a colocar no centro da estratégia a redução do perfil do consumo da
energia, o aumento da eficiência do uso final da energia, e só depois colocar,
em terceiro lugar, o problema das substituições. Agora, contrariamente ao que
se afirma em muitos lugares, eu acho que existem condições para compatibilizar
um aumento forte da produção dos biocombustíveis com o objetivo da segurança
alimentar. Isso não se fará automaticamente. Requer uma política, na qual a
ênfase seja posta sobre sistemas integrados de produção de alimentos e energia
adaptados aos diferentes biomas, em que se busca produzir a bioenergia a partir
da recuperação de áreas degradadas com plantas oleaginosas, robustas, como o
pinhão manso, que não tem muita preferência aos olhos dos agrônomos
brasileiros, mas que é considerada como a principal planta do biodiesel, por
exemplo, na Índia, e em vários lugares na África (5). Temos que pensar muito
mais no aproveitamento de florestas plantadas consorciadas. O conceito da RECA
(Reflorestamento Econômico Consorciado Adensado)(6). O Brasil desmatou tanto
que tem muito espaço para reflorestar. Se a gente pegar tudo isso, e sobretudo,
atentar ao fato que estamos nas vésperas de uma revolução tecnológica, mas isso
são os próximos cinco anos, vamos passar ao etanol celulose, onde todos os
resíduos florestais e vegetais passam a ser a matéria-prima. Acho que a
contradição entre a produção de bioenergia e a produção de alimentos pode ser
administrada. Segundo problema, vamos ou não desmatar para fazer isso? Aí, a
minha resposta é muito mais cautelosa, para não dizer pessimista. Não é que
tenhamos que desmatar. Tem espaço fora das florestas. A questão é se a ânsia do
lucro não vai precipitar mais desmatamento, porque as terras de lá são mais
baratas que as terras em outro lugar. Portanto, temos um problema. Mas, esse
problema, conhecemos por muitos lados. O Banco Mundial acaba de financiar um
empréstimo para botar matadouros na Amazônia. Quando todo mundo sabe que a
principal fonte do desmatamento é a poupança sobre quatro patas do pequeno, que
começa a fazer a roça, depois transforma a roça num pasto sujo, depois bota
neste pasto sujo algumas vacas, e vai continuando. A soja chega já, em cima do
pasto, mas esse ciclo tem que ser controlado. Não vai haver controle do
desmatamento da Amazônia sem um severo controle da pecuária extensiva na
Amazônia. E o banco vem, de repente, financiar um elemento que vai criar um
incentivo para mais desmatamento. Portanto, esse é o outro lado. Dito isso,
para mim, a bioenergia aparece como uma extraordinária janela de oportunidade
para mudar o modelo social do campo brasileiro. E essa é a questão central do
momento. Em que tipo de modelo vai gerar o boom da bioenergia? Nossos colegas
da UNICAMP dizem: “Vamos passar de 6 milhões a 30 milhões de hectares da cana”,
30 milhões de hectares da cana seria uma França e meia agrícola. Um mar de
cana. Estamos com seis, vamos multiplicar por cinco, qual será o modelo social
nestes 24 milhões adicionais de cana?
Aguiar – Aí eu tinha
uma pergunta a fazer para o Ladislau. O que o professor Ignacy está chamando a
atenção é que não basta mudar o conteúdo da produção. É necessário mudar o
modelo produtivo. Não basta trocar os antigos capitães de indústria por
cooperativas operárias ou de trabalhadores. É necessário mudar a cadeia de
produção. Mas nós vivemos num mundo que está indo na direção contrária a isso.
Um mundo cada vez mais individualizado. Cada vez mais, a agricultura produtiva
é vista como sendo a agricultura extensiva. Cada vez mais se aproximando deste
modelo monocultural, pelo menos em escala regional. Como é que se altera isso?
O que é necessário fazer para criar esta política que o professor Ignacy está
apontando?
Kucinski – Eu queria
complicar um pouco mais a sua questão. Acho que há uma questão também de
mudança não só do padrão de produção, mas também do padrão de consumo. O grande
vilão desta história toda é o automóvel. Dizem que agora vamos chegar a 2
bilhões de automóveis. Esse complexo, a indústria automobilística, o transporte
individual, a mudança de carro todo ano, todo esse padrão, essa sedução de
consumo, junto com o complexo da indústria petrolífera, que são as refinarias,
os super tanques, os petroleiros, todo esse complexo comandou o processo até
agora. Isso criou uma deformação, na verdade, inclusive na qualidade de vida
das cidades. Se você não muda esse padrão de consumo, a gente é prisioneiro de
uma coisa que vai crescendo cada vez mais.
Dowbor – Deixa-me
comentar, primeiro pelo lado da produção. Trabalhei muitos anos na África.
Passei sete anos montado sistemas de planejamento. Vi o impacto da monocultura,
a destruição radical das capacidades agrícolas do país em detrimento da
produção alimentar. Todos nós conhecemos os grandes ciclos da cana, cacau, e
outros, como a monocultura pode ser destrutiva, por exemplo, agora no caso da
soja, com a dupla face: rende divisas, mas com um impacto para o país. Acho que
uma das propostas centrais, que o Ignacy tem trazido com muita força, é que
você pode aproveitar essa demanda, essa valorização, em termos de produção de
renda, que a associação da agricultura com a produção de matéria energética
através de culturas consorciadas, de se associar a agricultura alimentar com a
produção energética. Isso implica dinamizar em cada localidade um sistema
integrado de desenvolvimento que permita que haja um equilíbrio. O grande perigo
deste processo é que eu tenho que pensar o que está na cabeça de uma visão do
tipo estritamente empresarial, que só se preocupe com as dezenas de milhares de
hectares necessárias para a produção de etanol. O tipo de conta que se faz pode
ser diferente. Por exemplo, o Ignacy estava fazendo. Bom, você tem que ter 200 hectares de soja
para gerar um emprego. No caso do óleo de palma, 10 hectares . Do ponto
de vista do empresário, ele calcula, “para mim não interessa se estou gerando
emprego, interessa só o quanto isso rende”. Do ponto de vista de uma política
de governo que queira absorver o excedente de mão-de-obra que temos, ou que é
subtilizado, você vai ter que fazer um cálculo mais inteligente: diversificação
das culturas, torná-las associadas, priorizar cultivos que absorvam mais
mão-de-obra. Ou seja, interessa a nós todos a utilidade sistêmica para o país,
e não apenas, digamos, mais um horizonte econômico para a monocultura.
Sachs – Há duas
observações sobre isso. O problema da mudança da estrutura do consumo
evidentemente é aquele do primeiro nível da política energética. E a questão
quanto aos automóveis individuais e o transporte coletivo é uma questão
extremamente importante. Em cima dela vem um problema: vai se trocar o
automóvel por que tipo de consumo? Por exemplo, os projetos norte-americanos
sobre a redução da dependência em relação ao petróleo, começam por esse lado:
reduzir pela metade o consumo do automóvel graças a uma nova geração de
automóveis ultraleves. Isso faz parte da solução. Agora, voltando ao problema
da produção e o que queremos. Um conceito que circulou pouco no Brasil, e que
merece a maior atenção, é o que se chamou de uma “revolução duplamente verde”.
Porque tivemos a primeira revolução verde, que vocês chamam aqui de agricultura
produtivista. A produtividade aumentou muito, mas aumentou através do ganho por
insumos de agrotóxicos, fertilizantes e dispêndio de capital. E, num dado
momento, a gente andava dizendo que a revolução verde ajuda aqueles que não
precisam ser ajudados, porque já têm aquele capital que permite entrar na
produção, marginalizando os pequenos. Daí surgiu o conceito da revolução
duplamente verde. Um dos grandes teóricos desta revolução é o agrônomo indiano
mundialmente conhecido M. S. Swaminathan(7), que diz: maior produtividade,
total respeito à natureza e orientada para o agricultor familiar. E o Brasil
tem condições, mais do que qualquer outro do mundo, de avançar neste caminho.
Aguiar – Mas aí é um
problema político?
Sachs – Obviamente. São
políticas.
Kucinski – As soluções
científicas e técnicas existem. O problema é político. Por isso, a gente tinha
que discutir algumas experiências que se originaram do saber científico e deram
politicamente certo. Acho que a experiência do protocolo de Quioto, apesar da relutância
dos EUA, é uma experiência interessante.
Sachs – Mas eu acho que
antes de discutir o internacional, nós temos que reafirmar com toda a força que
nesta época da globalização é extremamente importante ter políticas nacionais
de desenvolvimento. E ver quais são os instrumentos para esta política.
Voltando ao que Ladislau estava dizendo, há o critério de eficiência
energética, ou seja, quanto de energia fóssil é necessário para produzir a
bioenergia. Os americanos estão num caminho totalmente absurdo, do ponto de
vista da eficiência energética. A relação de substituição é de 1 tonelada de
energia fóssil para produzir 1,4 tonelada de bioenergia a partir do milho. Na
cana, essa relação é de 1 para 8. No dendê, essa relação é de 1 para 5. Na
soja, é bastante medíocre, acho que de 1 para 3. Segundo critério: o ambiental.
Como isso afeta os gases do efeito estufa? Mas também se deve perguntar como
isso afeta as poluições locais. Porque não adianta discutir a redução dos gases
do efeito estufa com o álcool, o etanol de cana-de-açúcar, sem olhar os efeitos
ambientais da queima do canavial. Portanto, você tem os critérios ambientais,
entre os quais está a produtividade por hectare, para poupar terras para a
agricultura. Você tem menos de mil litros por hectare da soja, e 6 mil litros
do dendê. Entra o problema de água, que não vamos discutir, e entram os
critérios sociais. Você gera um emprego por duzentos hectares de soja, um
emprego por dez hectares de dendê. E tendo todos esses critérios em vista, além
dos critérios tradicionais do custo-benefício, é que deveriam ser tomadas as
medidas para autorizar ou não autorizar tais ou tais projetos da expansão da
produção da bioenergia. E ainda entra em conta o problema da desnacionalização
de um setor da economia que, bem ou mal, era 100% nacional. Hoje empresas
internacionais estão comprando e instalando usinas... Onde vamos parar neste
processo?
Notas
(1) Segundo a Union of Concerned Scientists (www.ucsusa.org ), com sede em Cambridge, Massachussets, nos Estados Unidos , a ExxonMobil ou Exxon Mobil Corporation investiu 16 milhões de dólares em 43 organizações, entre 1998 e 2005, para gerar uma campanha que desacreditasse a ligação entre efeito estufa e consumo de combustíveis fósseis.
(2) O Clube de Roma é uma
organização fundada em 1968 e integrada por economistas, políticos proeminentes
das mais variadas tendências, cientistas e outros pensadores acadêmicos (dele
fizeram ou fazem parte a rainha da Holanda, Fernando Henrique Cardoso, Mário
Soares, o presidente do BID Enrique Iglesias, José Aristodemo Pinotti, a
economista Hazel Anderson, entre outros). O Clube mantém um grupo chamado de
Think Tank Thirty, com 30 membros na casa dos 30 anos, que elaboram anualmente
um relatório sobre problemas mundiais. Em 1972 o relatório, assinado por
Donella Meadows, Dennis Meadows, Jorgen Randers e William Behrens III,
chamava-se /Limits to growth/, e previa um cenário catastrófico de
desorganização mundial pelo esgotamento das fontes de energia, entre outras
causas. O livro publicado a partir do relatório vendeu 12 milhões de
exemplares.
(3) Em 1987, pelo Tratado de
Montreal as empresas produtoras de geladeiras, aparelhos de ar condicionado e
de aerossol concordaram em substituir o gás clorofluorcarbono (CFC) que, quando
liberado na atmosfera, contribui para destruir a camada de ozônio, pelo
hidrofluorcarbono (HFC), que não tem o mesmo efeito. No Brasil essa
substituição se completou em 1999. Entretanto, geladeiras antigas ainda
funcionam com o CFC, motivo pelo qual deve-se tomar precauções severas em caso
de conserto, para não deixar escapar o gás.
(4) “Uma verdade
inconveniente”, direção de Davis Guggenheim, sobre o aquecimento global.
5. O pinhão manso (jatropha curcas) é o fruto de uma árvore atarracada, que lembra mais um arbusto de copa larga, comum no sudeste, centro-oeste e nordeste do Brasil, de onde é natural. O fruto é parecido com um jiló.
5. O pinhão manso (jatropha curcas) é o fruto de uma árvore atarracada, que lembra mais um arbusto de copa larga, comum no sudeste, centro-oeste e nordeste do Brasil, de onde é natural. O fruto é parecido com um jiló.
(6) O RECA partiu de um
projeto piloto para combater/reverter o desmatamento intensivo e extensivo
praticado na Amazônia em função da agropecuária. Foi adotado pela primeira vez
em 1987 no município de Nova Califórnia, em Rondônia, divisa com o Acre.
(7) Presidente da Comissão
Nacional para Segurança na Agricultura, Alimentação e Nutrição na Índia.
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