José Carlos Peliano (*) Carta
Maior
A semana passada foi
especialmente rica em declarações sobre a economia brasileira. De 17 a 21 de
março fontes insuspeitas e diferenciadas apontaram pelo menos dois pilares que
sustentam o desempenho do país e, apesar disso,
um vírus que tenta desarticular as contas públicas. Tudo isso a mercê
dos vendavais que vira e mexe sacodem as expectativas, as previsões e as
manchetes.
De início, o Nobel de economia,
Paul Krugman, na abertura do Fórum Brasil em São Paulo, destacou a visível e
duradoura vitalidade de nosso parque econômico. Este o primeiro pilar de
sustentação. Contrariamente aos arautos oposicionistas de catástrofes
iminentes, registrou em especial a capacidade de adaptação da economia
brasileira aos trancos e barrancos da crise mundial e às opções e aos rumos
seguidos pelo mercado interno. Chamou-lhe a atenção em particular a
flexibilidade demonstrada pela política econômica e pela economia em responder
aos cenários negativos. E se sair bem.
Enumerou o economista americano
três vantagens em relação às demais economias em crise que não se recuperam
mesmo em cenários de juros baixos e inflações no chão tampouco conseguem
estimular investimentos.
A primeira vantagem é a nossa
menor exposição aos riscos cambiais por conta de uma dívida externa levada a
rédeas curtas. E de uma reserva cambial sólida e crescente. O lado externo,
portanto, não assusta mais como em décadas anteriores.
As duas vantagens complementares
são a inflação controlada e a política fiscal bem administrada. De fato, esses
pilares econômicos têm mantido nosso país resistindo a ataques especulativos, a
reduções de exportações e a pressão de importações. O lado interno vira gente
grande em contraste com administrações federais de períodos passados.
O único senão anunciado por
Krugman foi a dinâmica econômica da China cujo motor pode eventualmente
desacelerar mais e afetar negativamente nossa pauta de exportações de
commodities. E daí conturbar a balança de pagamentos. Enquanto a economia
mundial não voltar a crescer, todo o cuidado com a expansão chinesa é pouco. No
mais, segundo ele, pista livre para os motores de nossa indústria, serviços e
agricultura permanecerem ligados e operando nos limites de suas capacidades.
Nessas condições, portanto, o
lado econômico de nosso país caminha bem e ainda com fôlego para continuar
roncando motores pelas pistas mesmo experimentando terrenos difíceis e muitas
vezes velocidades menores. Mas ainda assim à frente dos motores em ritmo de
tartaruga da maioria das demais economias.
E o lado social? O lado social
igualmente vai indo bem e com bons resultados. Este o segundo pilar de
sustentação. Repisando caminhos anteriores, o Brasil conseguiu reduzir
marcadamente a desigualdade nos últimos 10 anos. Um dos elementos fundamentais
dessa conquista foi a retirada de famílias da pobreza para inserção nos
mercados de trabalho e consumo. Intento sem precedentes na histórica econômica
do país e sem comparação no mundo moderno.
Esse intento foi lembrado também
na semana anterior quando ocorreu o lançamento no Rio de Janeiro do Fórum de
Aprendizagem Sul-Sul sobre política social. Ministros de 70 países, cerca de
200 responsáveis de políticas públicas e mais peritos internacionais participaram
do evento intitulado Mundo Sem Pobreza. A ideia é de viabilizar um Portal
Virtual para a obtenção de informações sobre programas e projetos para a
redução da pobreza e da desigualdade social.
Apoiado pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Pobreza, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e
Banco Mundial, o encontro destacou-se pela apresentação da experiência
brasileira com o Programa Bolsa Família que conseguiu viabilizar a entrada na
sociedade de consumo de cerca de 50 milhões de pessoas possibilitando melhoria
de renda e obtenção de trabalho.
A ministra de Solidariedade
Social de Djibouti destacou ser a ferramenta virtual um dos instrumentos mais
importantes para a construção de sistemas de proteção social. Já a diretora do
Banco Mundial no Brasil, Deborah Wetzel, afiançou ter sido oferecida uma
oportunidade para acelerar e expandir as lições de aplicação de política social
no país.
Por fim, a menção ao vírus
completa os destaques da semana anterior, quando o Sindicato Nacional dos
Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), através da campanha “Quanto custa
o Brasil para você?”, divulgou que em quase 100 dias neste ano o país perdeu
cerca de R$ 106 bilhões com a sonegação de impostos. Muito dinheiro fora dos
cofres públicos que ficou nos caixas de empresas e bolsos dos cidadãos.
O tamanho da sonegação, o
Sonegômetro, placar que registra o quanto de tributos devidos não chega aos
cofres públicos pelo recolhimento dos contribuintes (pessoas físicas e
jurídicas), calculou que em 2013 o total atingiu cerca de R$ 415 bilhões, o que
representa perto de 8,6% do PIB.
Argumenta o sindicato com razão
que o dinheiro sonegado, que poderia vir a ser investido na saúde ou educação,
sai pelo ralo e perde uso coletivo. A administração pública não consegue ir
atrás dos grandes devedores sacrificando assim cada vez mais os pobres e a
classe média.
Dos três eventos citados acima
sobre o desempenho da economia brasileira fica a lição: apesar dos sonegadores
minarem os cofres públicos, ao reduzir os recursos que poderiam ser aplicados
em ampliação de programas sociais e reforços de gastos de custeio e de
investimentos, o país segue economicamente seguro e socialmente responsável.
Cumpre bem seu papel entre os países emergentes e dá lição de competência na
administração econômica e na proteção social. Mas como santo de casa não faz
milagres, é preciso que os de fora tratem o país como gente grande, exemplo a
ser referenciado e parceiro confiável.
Imagine se o sonegômetro viesse a
registrar valores menores de ano a ano, a economia brasileira continuasse a
resistir à crise mundial e a desigualdade social mostrasse uma cara menos
sofrida e mais saudável? Com certeza teríamos condições seguras e razoáveis de
pensar em nos mostrarmos ao mundo como sociedade mais justa e igualitária e
nação mais forte e exemplar.
(*) Economista
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