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Em um primeiro momento é importante tentar ser, pelo menos, um não-hipócrita: cá no nosso Brasil, dito libertário e carnavalizado, se alguma blogueira fizer isso, certamente não passará por poucos problemas. Não dispomos autonomamente dos nossos corpos, as mulheres (muito) menos do que os homens, certamente. O papel da mulher está menos pior neste canto do mundo em relação às arábias? Talvez, como já esteve pior em certa parte da história, não somos especiais, a conjuntura que desfavorece menos as mulheres ocidentais tem pouco a ver com alguma práxis social iluminada, mas sim com muita luta e algumas contingências históricas que o Poder certamente não controla, nem é capaz de controlar.
Considerando, ainda, que apontar toda a problemática religiosa e/ou moralista no Egito não é, pelo apontamento dessas ambivalências, causa de qualquer desencanto: não há espaço para encantamentos e mistificações em relação a processos revolucionários, o problema é ser contra eles pelos motivos errados - o que é frequente. Só uma mente torpe é possível imaginar uma revolução de contos de fada, revoluções são feitas de ambiguidades porque as pessoas de verdade são assim. Por fim, também não é o caso de dizer que transformações sociais para melhor só sejam possíveis no Ocidente, basta pegar o mesmo exemplo da participação da mulher em revoluções, e Olympe de Gouges não me deixa mentir, para saber que a conversa é outra.
Voltemos, pois, a Aliaa Elmahdy, a moça em questão. Uma jovem de vinte anos, com seus olhos grandes e assustados, longos cabelos cacheados, de uma beleza comum. A nudez que ela compartilha é espontânea - e é perfeitamente a espontaneidade e a partilha que o poder, cá e lá, não pode tolerar. O corpo não pode estar livre, não pode ser mostrado, se se rompe a ilusão de que realmente podemos fazer o quiser com ele - atearmos nele fogo, em uma situação limite, que seja, como no caso de Mohamed Bouazizi e seu providencial suicídio, do eventos chave da Revolução dos Jasmins na Tunísia.
A questão que a Revolução Egípcia, uma revolução de multidões no contexto de uma multidão de revoluções, é mais complexo que a mola mestra dos acontecimentos, a Tunísia: muito mais pobre do que a vizinha, o Egito possui menos organizações no qual uma revolução poderia se apoiar; enquanto tunisianos possuem, bem ou mal, sindicatos fortes, organizações estudantis capazes e um movimento hacker potente, os egípcios vivem às voltas com a ambiguidade das suas forças armadas (a mais poderosa organização do país), movimento islâmicos mais ou menos radicalizados em maior profusão - como forma de apassivamento da massa de explorados - e um cenário mais degradado.
Quem fez a Revolução no Egito? Jovens como Aliaa. Com menos apoio do que na Tunísia e vivendo lado a lado com organizações até ontem anti-Mubarak, mas que eram incapazes de articular qualquer reforma que fosse; todos partilhavam de tamanho imobilismo conservador que aderiram à Revolução apenas no seu curso, felizes pela oportunidade e desesperados pela caixa de pandora libertária aberta - sobretudo em relação à condição da mulher. Nesse sentido, gestos libertários como esse marcam um corte importante: o Egito que alguns pretendem construir é o mesmo, só que com eles no comando. Mubarak é e sempre foi um títere, um Berlusconi árabe, o que se enfrenta realmente não é uma pessoa, muito menos a dele, mas um sistema.
Nesse sentido, não é de se estranhar que as Forças Armadas, sorrateiramente, tenham se apoderado do Estado e, como se nada estivesse acontecendo, começaram a pôr em prática uma ditadura militar. O exército de Tantawi, tão anti-sionista quanto consumidor voraz de armas americanas, segue na sua arrogância, produzindo mortes sobretudo nos últimos e agitados dias: com dezenas de mortos na Praça Tahrir, caíram os ministros civis do regime e agora pesa sobre os líderes do país o peso de realizar eleições.
As relações de poder que os revolucionários precisam desconstituir são poderosas e complexas ao extremo. Com ou sem as necessárias eleições. O pode que eles enfrentam só caiu porque foi surpreendido, seu tapete foi puxado de forma magnífica, deixando seus próceres e apoiadores mundo adentro em pânico. Mas a capacidade de reconstituição e rearticulação dessas forças é imenso, vide a situação atual. Em uma sociedade que pode nos investigar e encontrar em qualquer parte e de qualquer forma, o devir partisan passa por se mostrar mais ainda: como Wikileaks, ou o começa dessa história toda, prova, o sistema contemporâneo é tanto mais um vampiro do que qualquer outra coisa, incapaz de lidar com a luz sobre si mesmo ou sobre os nossos corpos e mentes.
A questão que a Revolução Egípcia, uma revolução de multidões no contexto de uma multidão de revoluções, é mais complexo que a mola mestra dos acontecimentos, a Tunísia: muito mais pobre do que a vizinha, o Egito possui menos organizações no qual uma revolução poderia se apoiar; enquanto tunisianos possuem, bem ou mal, sindicatos fortes, organizações estudantis capazes e um movimento hacker potente, os egípcios vivem às voltas com a ambiguidade das suas forças armadas (a mais poderosa organização do país), movimento islâmicos mais ou menos radicalizados em maior profusão - como forma de apassivamento da massa de explorados - e um cenário mais degradado.
Quem fez a Revolução no Egito? Jovens como Aliaa. Com menos apoio do que na Tunísia e vivendo lado a lado com organizações até ontem anti-Mubarak, mas que eram incapazes de articular qualquer reforma que fosse; todos partilhavam de tamanho imobilismo conservador que aderiram à Revolução apenas no seu curso, felizes pela oportunidade e desesperados pela caixa de pandora libertária aberta - sobretudo em relação à condição da mulher. Nesse sentido, gestos libertários como esse marcam um corte importante: o Egito que alguns pretendem construir é o mesmo, só que com eles no comando. Mubarak é e sempre foi um títere, um Berlusconi árabe, o que se enfrenta realmente não é uma pessoa, muito menos a dele, mas um sistema.
Nesse sentido, não é de se estranhar que as Forças Armadas, sorrateiramente, tenham se apoderado do Estado e, como se nada estivesse acontecendo, começaram a pôr em prática uma ditadura militar. O exército de Tantawi, tão anti-sionista quanto consumidor voraz de armas americanas, segue na sua arrogância, produzindo mortes sobretudo nos últimos e agitados dias: com dezenas de mortos na Praça Tahrir, caíram os ministros civis do regime e agora pesa sobre os líderes do país o peso de realizar eleições.
As relações de poder que os revolucionários precisam desconstituir são poderosas e complexas ao extremo. Com ou sem as necessárias eleições. O pode que eles enfrentam só caiu porque foi surpreendido, seu tapete foi puxado de forma magnífica, deixando seus próceres e apoiadores mundo adentro em pânico. Mas a capacidade de reconstituição e rearticulação dessas forças é imenso, vide a situação atual. Em uma sociedade que pode nos investigar e encontrar em qualquer parte e de qualquer forma, o devir partisan passa por se mostrar mais ainda: como Wikileaks, ou o começa dessa história toda, prova, o sistema contemporâneo é tanto mais um vampiro do que qualquer outra coisa, incapaz de lidar com a luz sobre si mesmo ou sobre os nossos corpos e mentes.
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