quinta-feira, 5 de abril de 2018

Supremo de que, este STF?, por Pedro Augusto Pinho


Supremo de que, este STF?

por Pedro Augusto Pinho

Em 03 de abril, véspera do julgamento do habeas corpus de Lula, o inteligente e arguto Fernando Brito postou, no seu Tijolaço, o seguinte artigo: "Como decidiria o STF sem governos petistas?"

E mostra que os quatro ministros não designados por Lula e Dilma concederiam por 3 a 1 o habeas corpus ao ex-Presidente. Já os sete ministros, por eles designados, imporiam a derrota de 4x3 ao pleito do Lula.

Que loucura é esta? Molecagem jurídica? Incapacidade de identificar o direito e as razões? Ou a traição que o medo, a vaidade, a venalidade impõe aos Judas de sempre, principalmente quando se manifestam próximos da Semana Santa.

Não sou analista de baixarias nem me coloco, como certo articulista de império midiático, como especialista em Supremo Tribunal Federal (STF).

Com o acompanhamento dos eventos nacionais, algumas experiências internacionais, tentarei apresentar as considerações que me parecem mais evidentes e pertinentes.

A primeira é o baixíssimo nível do STF desde a chegada do Gilmar Mendes. Não o cito por qualquer motivo pessoal, nem por considerá-lo pouco capaz, mas, simplesmente, para fixar um tempo. Todas as escolhas de Lula e Dilma mostraram um profundo desconhecimento do que é um órgão jurídico com as características deste tribunal brasileiro e das qualificações exigidas para a designação.

Permitam-me breve digressão no campo do direito. O direito é, sempre foi, instrumento da classe detentora do poder. Existe para defender seus privilégios e impunidades. Muda quando muda o poder. Não poucas vezes se transmuta e retorna, passada a tormenta, às mesmas garantias, às mesmas velhas razões.

Creio que observar o direito esclarece, mais do que a própria economia, qual é o efetivo poder. Rousseau já distinguia a "vontade geral" da "vontade de todos". Ou seja, o interesse comum da soma dos interesses particulares.

O conhecido jurista alemão Friedrich Müller, em "O povo como instância global de atribuição de legitimidade" (Quem é o povo?),diz que é o povo que justifica o ordenamento jurídico e que ele não deve ser impedido de revoltar-se contra determinadas instituições.

Estamos diante de situação que bem cabe este enunciado. Que garantia jurídica existe desde que os órgãos jurídicos, as instituições jurídicas, foram partícipes de golpe articulado, planejado e executado a partir do exterior e por interesses contrários aos nacionais brasileiros?

Vejamos o julgamento do HC 152752, o Habeas Corpus (HC) do Lula.

Mostrando a insegurança em seu conhecimento jurídico e a falta de liderança entre os pares, a Ministra Cármem Lúcia fez uma introdução à sessão, poucas vezes vista, talvez para se justificar, junto à Globo, por um eventual insucesso em sua missão condenatória ou para mostrar a presença de quem não inspira confiança.

Sem surpresa e dentro de sua capacidade, o relator Edson Fachin estreitou a análise do HC à pretensão individual do Lula, descartando a repercussão do caso na compreensão jurídica da prisão, antes de esgotados os recursos. Se o caro leitor considera descabidos os recursos, eu concordo, mas é o procedimento que o poder encontrou para a impunidade dos "homens de bem", dos "bem nascidos", dos asseclas e capitães do mato do poder.

O Ministro Gilmar Mendes, que antecipara seu voto a favor da concessão do HC, feita a crítica ao Partido dos Trabalhadores (PT), lançou no ventilador todas as mazelas que o atual modelo jurídico do País engloba. Nem a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) foi poupada e, muito menos, as procuradorias e os magistrados. Mostrou decisões contraditórias em abundância, as falhas de ordem gerencial-administrativa da justiça, estatísticas prisionais absurdas, as instáveis decisões do STF e de outros tribunais superiores.E, como cereja do bolo, apontou a enorme distância entre o sistema jurídico e a realidade social brasileira. Um discurso que boa parte da esquerda nativa subscreveria. E citou nominalmente a/o Globo como instigador de pressões, sendo mesmo uma indesejável ameaça ao direito e ao STF.

Este humílimo escriba, perplexo, ouvia até a salvadora citação do alemão Karl Larenz, como um "en passant" metodológico. Estava aberta a proposta que, com extraordinária inteligência, num processo que mobiliza o País, ele deixa quase ingênua, na pauta de um dos poderes da República.

Permitam-me uma breve súmula do pensamento de Karl Larenz. Apenas sua "Metodologia da Ciência do Direito" (Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa), citada pelo Ministro, está disponível em português. Mas o cerne de seu pensamento está em Direito Justo (Richtiges Recht. Grundzüge einer Rechtsethik, 1985), com tradução para o espanhol (Civitas, Madrid, 2001). Aí propõe um poder, que manteria as mais elevadas conquistas civilizatórias, composto de "juristas, pensadores" acima do "bem e do mal" (sic). Eles cuidariam do direito justo que o comum dos mortais não são capazes.

"O Direito Justo não vigora pela autoridade de um legislador, nem por convicção jurídica generalizada, mas por causa de sua justeza". "Só o direito justo pode assegurar a paz jurídica duradoura".

É incrível, para quem não vincule a triste realidade do cotidiano ocidental ao domínio do sistema financeiro internacional, a banca, que tais barbaridades sejam defendidas no estágio civilizatório que pretendíamos ter atingido.

Mas não ficou, até o pronunciamento de Rosa Weber, no Gilmar Mendes a citação explícita daquele pensamento totalitário e elitista, que nos remete ao absolutismo monárquico. Aquela Ministra também o citou e, na peroração de Roberto Barroso, estava todo tempo implícito.

Este merece análise específica. Advogado de clientela exigente e rica, este bem remunerado e respeitado profissional, precisava ter na argumentação sua publicidade. E, com inegável brilho, usa sofisma, trucida estatística, abusa do competente domínio do vernáculo e convence que o preto é branco e que o frio aquece. Foi assim sua longa exposição, que contrasta com a de seu limitado auxiliar Alexandre de Moraes e a do janota Fux.

Conquistada a maioria contrária à concessão do Habeas Corpus, o julgamento passou a ser um jogo que cumpre tabela e não alterará seus vencedores.

Fica agora a questão: até quando, quando estas limitações e submissões a pressões midiáticas, militares e econômicas continuarão a ser aceitas pela sociedade? Pelos ricos e pelos pobres. Até quando as injustiças de uma sociedade que despreza a maioria absoluta de seus habitantes continuará submissa a uns poucos que se locupletam?

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado 

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