domingo, 14 de julho de 2019

Anisio Teixeira: é a escola pública que constrói e sustenta a democracia

Nascido a 12 de julho de 1900, em Caetité-Ba, Anísio Spínola Teixeira é considerado o educador que mais contribuiu para a renovação educacional e cultural brasileira

Por Jornal GGN
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Por João Augusto de Lima Rocha

Nascido a 12 de julho de 1900, em Caetité-Ba, Anísio Spínola Teixeira é considerado o educador que mais contribuiu para a renovação educacional e cultural brasileira. Principal mentor e organizador da luta pela escola pública, gratuita, universal e laica, entre nós, sua presença na discussão da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1946 a 1961 assegura-lhe a posição de principal responsável pela implantação, na prática, do lema republicano da separação entre Igreja e Estado no Brasil.

Os pontos mais elevados de sua contribuição para a educação brasileira estão no apego a princípios de natureza política, com os quais balizava as lutas que empreendia com todo vigor pela escola pública, universal e gratuita, e pela universidade em comunhão com o fortalecimento da cultura e da soberania nacional. A isso ele se entregou de corpo e alma, sem tréguas, como se pensar e agir fosse uma espécie de continuum, a moldar a reflexão e a ação, por todo o tempo. Ele deu corpo à luta concreta pela construção da democracia, pela via da educação, no Brasil, de 1924 a 1971 quando morreu em circunstâncias bastante intrigantes, em plena ditadura militar, cuja verdade somente agora se encaminha para ser desvendada completamente.

É voz corrente que Anísio, desde cedo, vinculou-se ao pensamento avançado de John Dewey (1859-1952), o educador e filósofo estadunidense do pragmatismo, de grande projeção internacional, que influenciou, não somente a educação em sua pátria, EUA mas, também, a da URSS e da China, no início de suas caminhadas revolucionárias. Foi a obra de outro educador que, com Dewey, também atuava no Teachers College da Univeridade Colúmbia, na qual Anísio obteve sua pós-graduação, em 1929, porém, que lhe deu a principal fundamentação para a construção do vínculo entre educação e democracia. Trata-se de William Heard Kilpatrick (1871-1965), autor da obra Educação para uma civilização em mudança ( São Paulo, Melhoramentos, 11ª ed., 1973), lançada nos EUA, em 1926, que alcançou grande repercussão no mundo, no auge do movimento da Escola Nova.

Afirma Anísio: “Há quatro tipos de governo, dizia-nos o Prof Russel, da Universidade Colúmbia: há o governo dos ignorantes pelos ignorantes que é a tirania; há o governo dos que sabem, pelos ignorantes, que significa revolução próxima; há o governo dos ignorantes pelos que sabem, que é despotismo benevolente; e há o governo dos que sabem pelos que sabem, que é a democracia. Que tivemos até hoje? Quando muito, despotismo benevolente. E isto por quê? Porque não fizemos da educação o serviço fundamental e básico do Estado”.

Ao justificar que a educação deve, cada vez mais, vincular-se à construção e consolidação dos princípios democráticos, Kilpatrick explica a conceituação precisa de democracia que emprega no contexto educacional: “Tal como deve ser concebida, a democracia é um esforço para fundar a sociedade num princípio moral: a cada um deve oferecer-se a oportunidade de desenvolvimento e expressão individual simultânea, até o máximo em que isso seja possível. A despeito das ditaduras, do proletariado ou do capitalismo, a despeito do egoísmo monopolizador, onde quer que ele se encontre, parece razoável dizer-se que que o homem não se satisfará permanentemente com qualquer regime social que negue, fundamentalmente a democracia. A tendência é por demais profunda. Qualquer medida social que não se baseie na justiça é de equilíbrio instável. A democracia oferece, por isso, o único programa que pode ter apoio permanente” (grifo no original).

O ataque generalizado que o governo atual, de essência fascistizante, promove contra a educação pública no Brasil, tem a ver com a compreensão acima exposta. A razão explícitada pelos seguidores de Abraão (Weintraube) pode ser, às vezes, de natureza ideológica (combate ao marxismo cultural), ou neoliberal (contenção de despesas públicas em áreas sociais), mas a questão de fundo é que a escola pública universal e gratuita é a “máquina que constrói a democracia”, nas palavras de Anísio Teixeira.

No discurso que fez perante a Constituinte Baiana, em 1947, quando defendeu a inovadora tese da autonomia para a educação no estado (a educação deveria ser dirigida por um conselho, não pelo secretário estadual de educação), Anísio fez um extenso diagnóstico das dificuldades a serem superadas, para a implantação da escola pública universal e gratuita no Brasil. Suas palavras, há mais de setenta anos, teriam certamente a concordância do autor do best-selleratual Elite do Atraso. Dizia Anísio: “Sabemos que somos um país de distâncias físicas, sabemos que temos uma geografia que nos espanta e nos separa em suas imensas distâncias. Mas, o Brasil não é apenas um país de distâncias materiais, o Brasil é um país de distâncias sociais e de distâncias mentais, de distâncias culturais, de distâncias econômicas e de distâncias raciais. E nas dificuldades que todos sentimos em compreendê-lo, não devemos esquecer esse fato. É por causa dessas distâncias que temos tantas linguagens pelo Brasil afora. Falamos uma língua em voz alta e e outra em voz baixa. Temos uma língua para festas e outra para a intimidade. Uma para o povo, outra para o estrangeiro e outras para os nossos iguais. Um certo temor, uma certa incompreensão em relação ao povo, nome que pronunciamos sempre como se fosse entre aspas, provém, a meu ver, da existência dessas distâncias. Em virtude delas, tudo, no país, fica esgarçado, frágil, tênue. Só tem uma força que vence esse distancialismo brasileiro, força que, se não existisse, tornaria bem difícíl esplicar a existência e a unidade do país a despeito de sua constituição ganglionar e esparsa. Só uma força vence este distancialismo, procurando unir debilmente a gigantesca talagarça nacional – o sentimentalismo. Só isto nos une em nosso imenso esfacelamento institucional, mas une, corrompendo, deformando, viciando e destruindo o vigor dos órgãos e dos tecidos nobres e criando, em seu lugar, um monstruoso tecido conjuntivo, em que órgãos e funções desaparecem na massa informe e sentimental do falso corpo nacional”.

Criador da primeira universidade com pesquisa em todas as áreas no Brasil, em 1935, Anísio é o fundador da Capes, com Rômulo Almeida., instituição que dirigiu de 1951 a 1964, quando foi aposentado compulsoriamente do serviço público pela ditadura militar. Acumulava com o cargo na Capes a direção do Inep (1952-1964) e a função de reitor da Universidade de Brasília, da qual foi violentamente retirado, em 09 de abril de 1964. Também foi presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciênca (SBPC), de 1955 a 1959. Morreu em 12 de março de 1971

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