
Reprodução
Anjo
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Cada vez que ouço ou penso na palavra anjo vem à mente uma ilustração que era frequente – hoje menos — na parede de casas modestas das cidades, principalmente nas da zona rural.
Muitas vezes a ilustração fazia parte de uma “folhinha”, assim chamada por ser calendário.
Se calendário, ficava na parede da sala ou da cozinha.
A imagem era a de um anjo da guarda atento a uma ou mais crianças em perigo; por exemplo, prestes a cair num rio ou poço, ou ser atacada por um animal.
Anjo significa mensageiro, especialmente emissário de Deus.
No caso a ilustração, indica que ele (o anjo da guarda) não leva uma mensagem – a menos que seja espiritual –, mas que está preparado para um ato em defesa da criança.
Sempre, independente do tema que abordo, recorro ao dicionário.
Em geral, ao Houaiss. E quando tem algum fundo religioso, ao Diccionário de la Bíblia, Serafín de Asuejo, Hebert Haag e A. Van den Born.
No Gênesis (28, 12), o sonho de Jacob em Betel diz que ele (Jacob) teve um sonho no qual viu uma escada apoiada na terra.
O seu topo alcançava os céus, e os anjos de Deus subiam e desciam por ela.
Informa também que os anjos aparecem em forma humana sem asas. Os querubins e serafins aparecem com asas.
“Se descreve os anjos como seres celestiais que rodeiam Deus, formando sua corte e seu exército e ajudam-no na sua ação sobre a terra e são enviados por Ele como seus emissários junto aos homens.”
Houaiss esclarece que quando a criança é tranquila e quieta é chamada de anjinho.
Diz também que a palavra é usada como ironia quando a criança é irrequieta, travessa ou quando é um adulto, uma “pessoa que se faz de ingênua”.
Assistindo à vida politica e criminal de muitos no Brasil atual dá-me a impressão –usando a ironia referida por Houaiss –que o Brasil vem sendo governado por anjinhos.
Imagino que Bolsonaro pai e Bolsonaros filhos eram anjinhos quando crianças. E, agora adultos, além de anjinhos, são protegidos pelo anjo da guarda Frederick Wassef, o advogado Anjo.
Até a prisão de Queiroz, é bem provável que na cabeceira da cama da família Bolsonaro tivesse uma foto, uma ilustração ou um cartãozinho do Anjo com o número do telefone em caso de emergência policial/judicial.
Frederick Wassef, o Anjo, tinha livre trânsito nos gabinetes e residências da família Bolsonaro.
Esta liberdade de chegar — sem marcar hora– e entrar — sem bater na porta– persistiu até 18 de junho passado.
Na ocasião, a polícia bateu à porta da casa de Wassef, em Atibaia (SP), e encontrou Lúcifer, que também é anjo do “demônio” Fabrício Queiroz.
Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, Queiroz, o agora demônio, movimentou cerca de R$ 3 milhões, entre 2007 e 2018.
Sob o comando do então deputado Flávio Bolsonaro, ele recolhia parte dos salários de outros assessores ―fantasmas― e repassava o dinheiro para o chefe.
Frederick Wassef, Fred para os íntimos e Anjo para os Bolsonaros que necessitam de proteção, declarou à CNN:
“Todos estão convictos hoje de que o Fred virou o alvo. Se bater no Fred atinge o presidente, eu e o presidente viramos uma pessoa só”.
Mas não explicou por que Queiroz estava na casa dele. Só disse ser uma armação para incriminar o presidente.
A repórter Andrea Sadi, da TV Globo, perguntou ao Anjo, por telefone: “O Queiroz pulou o muro? Apareceu voando para casa do senhor?”
“Para a casa do senhor”.
Lembra as orações de Bolsonaro e seus apoiadores.
Lembra também que Queiroz pode ser um querubim ou serafim da família Bolsonaro e que entrou voando na casa do Anjo.
O que se pode dizer é que alguém puxou a escada que estava apoiada na terra e o topo no céu. Justamente por onde o Anjo subia e descia para falar com os seus senhores Jair e Flávio Bolsonaro.
Fechou-se a porta dos palácios e gabinetes para o emissário do crime organizado das rachadinhas.
O Anjo não tem asas, mas tem boca, o que afasta a possibilidade dele voar. Facilita também a polícia pegá-lo.
Este é o medo –não do Anjo – do clã Bolsonaro. Se o Anjo falar, o céu desaba.
Outra coisa é obter justiça: é necessário dar muitas asas a imaginação.
Dr. Rosinha é médico pediatra, militante do PT. Pelo PT do Paraná, foi deputado estadual (1991-1998) e federal (1999-2017). De maio de 2017 a dezembro de 2019, presidiu o PT-PR. De 2015 a 2017, ocupou o cargo de Alto Representante Geral do Mercosul.
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