Em Defesa do Sindicato dos Professores no DF




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Em Defesa do Sindicato dos Professores no DF


    Como professoras e professores que participamos da criação, da construção e da direção do Sindicato dos Professores no DF, por esta nota nos dirigimos à nossa categoria para uma conversa franca sobre os acontecimentos que vêm abalando nossa entidade desde a decretação do fim do último movimento grevista.

         A fundação do nosso Sindicato, em 14 de março de 1979, foi fruto das lutas por salário digno, condições adequadas de trabalho, qualidade do ensino público e enfrentamento à ditadura militar de 1964, responsável, possivelmente, pela mais intensa e profunda repressão política que a classe trabalhadora brasileira já enfrentou. Nessa página infeliz da nossa História, intervenções militares atingiram cerca de duas mil entidades sindicais, que tiveram direções cassadas, presas, exiladas ou mortas.

        Nos anos 1970, na retomada das lutas do movimento sindical, é fundamental citar o papel dos metalúrgicos do ABC e dos professores das redes públicas de todo o Brasil. Em 14 de abril de 1979, os metalúrgicos da região do ABC do Estado de São Paulo entraram em greve geral e esse é o primeiro grande movimento de massas da classe operária desde 1964. No dia 21 de abril, uma semana depois, iniciava-se a primeira e heroica greve dos professores do magistério público no DF, que durou 23 dias, ocorrida no âmbito do recém fundado Sindicato dos Professores no DF e às portas do Palácio do Planalto. Essa greve, marcada por repressão, punições e vítimas, também se distinguiu como um exemplo incontestável de coragem e resistência, deve ser conhecida pelas novas gerações do magistério do Distrito Federal.

         Desde o seu nascedouro, nosso Sindicato se tornou referência em uma Brasília sem representação política e se configurou uma espécie de “prefeitura informal”, abrigando os movimentos sociais da época. Dentro de suas dependências, criaram-se e desenvolveram-se movimentos libertários como as Diretas Já, a Campanha pela Anistia, a luta por representação política no DF e o “Badernaço”, entre outros. O Sindicato teve participação intensa no processo Constituinte, abrigando colegas de outros estados e participando com sua própria representação nas atividades pela inserção de direitos na Carta Magna.

           Nossa entidade se tornou referência nacional também pelas relações democráticas que sempre imprimiu à condução de suas lutas e a seu funcionamento. Nossas assembleias sempre foram um espelho público dessa democracia. Assim, cumprindo seu papel de lutar por educação pública de qualidade e melhores condições de vida para o magistério, o Sindicato se tornou um patrimônio imaterial e político de nossa categoria e da sociedade.

      Graças à luta coletiva, o magistério do DF alcançou o posto de ser o mais bem remunerado do Brasil, ao mesmo tempo em que se orgulhava de oferecer uma educação pública mais eficiente do país, com professoras e professores concursados, donos de suas cátedras, conscientes de seus direitos e permanentemente mobilizados.

          Contudo, é importante recordar que durante os primeiros mandatos da chapa cutista sob o governo Roriz, assistimos a um momento singular de valorização salarial, quando os salários do magistério chegaram a se aproximar dos da carreira médica no GDF –, uma conquista histórica que contrasta com a atual defasagem salarial e o enfraquecimento organizativo da categoria. Desde então, ao longo dos últimos 15 anos, a distância entre os vencimentos das duas categorias aumentou de forma constante. Hoje, enquanto médicos iniciam suas carreiras com salários superiores a R$ 13 mil, o piso da docência gira em torno de R$ 6.500,00, mesmo após reajustes recentes. Essa diferença salarial, que outrora fora significativamente reduzida, revela um descenso preocupante da organização e da capacidade de conquista da nossa categoria, exigindo uma urgente inflexão nas práxis políticas e mobilizadoras.

      Não há por que aceitar que a carreira do magistério seja a mais mal remunerada entre as carreiras do GDF. É preciso lembrar que não há profissão letrada sem professor. Essa constatação exige que defendamos com ainda mais firmeza a valorização da nossa carreira.

           O conflito nunca esteve ausente no cotidiano das lutas políticas do Sindicato contra os ataques à educação pública e aos direitos dos trabalhadores. As greves sempre foram espaços de tensão e embate e a decisão de encerrá-las sempre foi conflituosa; um verdadeiro teste de paciência e tolerância. Nenhuma direção conseguiu até hoje construir uma forma consensual de conduzir esse processo para minimizar seus impactos emocionais na categoria e na comunidade escolar. Chegamos inclusive a dividir a assembleia em votantes da proposta 1 de um lado e votantes da proposta 2 do outro lado. Em outros momentos usamos a contagem dos cartões. Exemplos que poderiam ter sido seguidos pela direção na última assembleia.

     Sempre houve a figura do fura-greve que, contraditoriamente, comparece às assembleias para votar pela continuidade do movimento.

      Sempre tivemos também conflitos nos piquetes, que em tempos de ditadura chamávamos convenientemente de “Comissão de Convencimento”, como existiu sempre a pressão do GDF em articulação com setores da Justiça ante trabalhadores. Enfrentamos desde o início a mídia semeando a desinformação e reforçando o lado mais forte contra os direitos dos trabalhadores. Não são novidade para a militância as honestas divergências na condução do movimento, nem seu uso por determinada oposição para desgastar a diretoria sem se importar se prejudicaria o movimento, ou não. Por fim, o jus sperniandi concretizado, por vezes, em tentativas de agressões por parte de quem perdia a votação e não aceitava as decisões tomadas democraticamente pela maioria.

         Ao final se o movimento é vitorioso, é vitória da categoria, se é derrotado, é culpa da direção. Isso nunca foi novidade.

        A novidade nefasta foi a assembleia do dia 25 de junho de 2025 em que a mesa diretora teria encerrado o movimento grevista à revelia da decisão coletiva que apontava para sua continuidade. Isso nunca havia ocorrido.

    Nós, militantes de tantas lutas, já víamos com preocupação a forma como, ao menos nas últimas gestões, as diretorias vinham conduzindo a entidade. A lista de problemas é interminável e, neste momento de crise instalada, tangenciamos alguns deles, sem fazer da nossa mensagem uma peça acusatória, pois não é essa a intenção. Eis alguns exemplos observados: 

a) Um sindicato não é a sua diretoria de plantão, mas sim cada professora e cada professor sindicalizado. Por isso não é correta a atitude absolutista, segundo a qual criticar a diretoria é criticar a entidade. Muito menos classificar como inimigo a quem faz qualquer crítica, sendo o crítico objeto de perseguição. b) A ausência da direção sindical nas escolas, substituída por atuação exclusiva nas redes sociais, é um erro grave e inaceitável. c)principal disputa contra o perigo da desinformação promovida por nossos inimigos de classe, que tiram nossos direitos, reduz nossos salários, aviltam nossa profissão, a educação e a ciência, devem-se dar no debate fraterno e esclarecedor no local de trabalho, as redes sociais são necessárias, mas coadjuvantes. d) A principal vacina contra os antivacina, suas políticas genocidas e o voto suicida da classe trabalhadora que os elege é a informação. e) A contratação especial e temporária de professores não deveria ultrapassar sequer a 10% do quadro de efetivos da rede. Muito menos acima de 50% como está agora. Sabemos do impacto devastador que isso causa à educação, ao ânimo do professor e à sua mobilização para a luta. Os próprios tribunais de contas do país proíbem esse tipo de contração. A direção pouco ou nada enfrentou o governador Ibaneis e a vice-governadora Celina nessa questão. f) A redução salarial imposta pelo atual governo do DF com o aumento do desconto da alíquota do Iprev/df foi enfrentada com a categoria posta de joelhos a implorar aos deputados distritais a não aprovação do referido aumento. Apelos humilhantes à Câmara Legislativa do DF não são formas de luta. g) O crescente achatamento salarial da nossa categoria não se resolverá com reestruturação de plano de carreira ou com contratação de professores, coisas que são importantes, mas não se confundem ou substituem o aumento salarial tão necessário para a recuperação do poder aquisitivo e a equiparação salarial dos educadores com as demais carreiras de estado. Cabe ao Sinpro-DF liderar as lutas por recomposição salarial com firmeza e clareza política, exigindo do governo do GDF o cumprimento do princípio da isonomia e a valorização do magistério público. h) Sobre as relações de trabalho internas da entidade é intolerável a forma truculenta e desrespeitosa como foram tratados os trabalhadores e as trabalhadoras históricos e leais à entidade nas sedes do SINPRO/DF, os quais foram submetidos e forçados aceitarem o Plano de Demissão Voluntária imposto pela direção. A diretoria eleita para um mandato sindical com a tarefa de defender um segmento de trabalhadores não pode se prestar a massacrar outros trabalhadores. Não se justifica demitir funcionários para recontratar outros, ou os mesmos, por meio de terceirização que é a escravidão moderna. Soma-se a isso uma arrogância crescente que recusa o diálogo, não permite ouvir outras opiniões e desqualifica a história da entidade, chamando de “datado” o sindicalismo que construiu e fez, por consequência, poderosa a categoria representada.

        Afirmarmos aqui, que não estamos de acordo com os abusos e desmandos da direção, que são de conhecimento público, mas também não pactuamos com a violência dos ataques que a entidade vem sofrendo. A justa indignação da categoria parece ser usada para concretizar o sonho daqueles que pouco prezam a educação pública, qual seja, a ideia de decretar a falência de uma entidade respeitada no DF, no Brasil e nos corações e mentes dos que a construíram. A proposta de desfiliação em massa nos leva a perguntar: a quem interessa esvaziar uma entidade forte e respeitada como o Sinpro-DF?

    Acredita-se sinceramente que esvaziar o Sindicato para criar uma nova associação de professores vai resolver os problemas? Sabemos que essas ideias são frutos de anos de neoliberalismo, gestão burocratizada, direção preguiçosa e despolitizada que perdeu a referência da mobilização e da luta de classes e se concentrou no próprio umbigo e em projetos pessoais de alguns de seus membros, mas que apesar de tudo vem sendo reeleita pela categoria.

         Mesmo com críticas ao processo eleitoral ainda feito com ultrapassadas urnas itinerantes, o que sugere alta possibilidade de fraude, continuaremos na luta e lembramos à atual diretoria que credibilidade, seja interna ou externa, não se constrói de um dia para o outro com rancor, agressões ou troca de escritório de advocacia. Que a solução dos problemas que dizem respeito somente à nossa categoria agora serve para agregar interesses alheios a ela, como por exemplo o de permitir acesso às contas do Sindicato por outras empresas. O quê e quem está por trás disso? Que o correto discurso contra a partidarização da entidade não teria, há muito, extrapolado o objetivo da independência sindical para atacar o direito de a classe trabalhadora ter seus próprios partidos e votar em seus representantes, em vez de ficar engordando os privilégios de parlamentares que representam, se tanto, os interesses de 1% do povo?

       Um sindicato não é apolítico. Ele existe para enfrentar políticas que precarizam nosso trabalho, nossa vida e a de nossos alunos. Deve influenciar diretamente a construção de políticas de interesse da classe trabalhadora. Por isto mesmo é tempo de cessar arroubos, hostilidades, guerras e ameaças.

     Temos todos a obrigação de preservar nossa entidade. Direções passam, a categoria permanece.

  Nosso Sindicato tem estatuto construído democraticamente. Ele é a lei que regulamenta a entidade, a direção e as instâncias da instituição.

    Estamos todos submetidos a ele e havendo descumprimento do estatuto, cabe apuração e a devida punição aos culpados.

    Não propomos silenciar a indignação que é também nossa. Propomos responsabilidade e compromisso com o que construímos coletivamente. Cabe agora, o diálogo para elaborar propostas de superação e não atitudes de jogarmos no lixo o esforço de gerações para construir o SINPRO/DF.

    Recomendamos como encaminhamento, a abertura de um processo de mediação institucional com a participação de quem tem autoridade reconhecida pelas partes envolvidas. Uma sugestão concreta seria a o aceite da colaboração da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE como mediadora, cuja legitimidade e histórico a qualificam para facilitar o diálogo, a escuta e a pacificação necessária.

      Além disso, sugerimos a convocação de um fórum ampliado, democrático e transparente; uma espécie de “Conselhão”, formado com a participação da base, de ex-dirigentes, da oposição e da atual direção, com o objetivo de reconstruir a unidade, fortalecer o Sindicato e garantir que estes erros não se repitam.

     Estamos aqui à disposição e onde sempre estivemos: ao lado certo da classe trabalhadora e da categoria. Queremos ajudar nossa entidade e não mediremos esforços para isto.

         Enviamos nosso abraço fraterno.


Assinam os ex-diretores do SINPRO/DF:

1. Adalberto Duarte de Oliveira;

2. Adenilce Maria Silva;

3. Antonieta Martins Alves;

4. Jorge Eduardo R. Miranda;

5. José Raimundo Souza Oliveira - (Raimundinho);

6. Luísa Rodrigues;

7. Márcio Baiocchi Fracari;

8. Maria Lúcia de Moura Iwanov;

9.Valdenice de Oliveira.

Comentários

  1. Ufa! Eis quem, com autoridade moral, conhecimento e experiência na luta sindical, se inquietam e dizem um basta à incompetência e indigência política de sucessivas diretorias do Sinpro-DF. Espera-se que a atual diretoria do Sinpro-DF, re, re, reeleita se apresente para o debate e não receba esta nota elegante e cuidadosa como uma crítica vã, mas como um convite à responsabilidade, por tanto tempo negligenciada em nosso Sindicato. Parabéns aos signatários da nota.

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