O deputado federal Silas Câmara (PSD-AM) é o caso mais
escancarado dos interesses econômicos que permeiam a discussão sobre a redução
da maioridade penal.
Redação da Revista Vaidapé / http://cartamaior.com.br/
Durante a sessão da Comissão de Constituição e Justiça e de
Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, na última terça-feira (31), um dos 43
parlamentares responsáveis pela aprovação da admissibilidade da PEC 171/1993,
que prevê a redução da maioridade penal para 16 anos, se revoltou contra a
expressão Bancada da Bala. A denominação se refere ao conjunto de políticos
ligados à indústria de armas, ex-policiais e militares de modo geral. O grupo
capitaneia diversas propostas que representam um retrocesso na política de
segurança pública do Brasil.
Além do encarceramento em unidades penitenciárias de adultos
para adolescentes a partir dos 16 anos de idade, a Bancada da Bala se movimenta
para desmontar o Estatuto do Desarmamento através de 41 projetos, dentre os
quais um deles determina a revogação total do Estatuto.
Em uma fala durante a sessão que fez avançar as perspectivas
de redução da maioridade penal, o parlamentar disse se sentir ofendido e
considerou o termo pejorativo. Sugeriu, então, que o grupo passasse a ser
identificado como Bancada da Vida, por defender “os cidadãos de bem”, segundo o
próprio.
A expressão Bancada da Bala também é adaptada para outros
contextos, como, por exemplo, a Bancada Ruralista, dos representantes de
corporações do agronegócio. Assim como há a Bancada da Bola, composta por
parlamentares ligados ao futebol.
O fato é que uma investigação simples sobre o financiamento
da campanha dos parlamentares a favor da redução apontam uma nova – e mórbida –
realidade: o surgimento da Bancada da Jaula.
Bancada da Jaula
O deputado federal Silas Câmara (PSD-AM) é o caso mais
escancarado dos interesses econômicos que permeiam a discussão sobre a redução
da maioridade penal. Nas eleições de 2014, ele recebeu R$ 200 mil de uma
empresa chamada Umanizzare Gestão Prisional e Serviços Ltda. para sua campanha
eleitoral. A Umanizzare é uma empresa que gere presídios privatizados.
Os presídios privatizados são um fenômeno recente no Brasil.
De acordo com Robson Sávio, coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos
(Nesp) da PUC-Minas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o modelo
pode caracterizar um aumento das prisões. Ele é um dos entrevistados do
documentário sobre o assunto produzido pela Agência Pública de Jornalismo
Investigativo.
Também nas eleições de 2014, a Umanizzare escolheu outras
duas candidatas para fazer doações. A esposa de Silas, Antônia Lúcia Câmara
(PSC-AC), recebeu R$ 400 mil, e a filha do casal, Gabriela Ramos Câmara
(PTC-AC), outros R$ 150 mil. Ao todo, a empresa de gestão prisional doou R$ 750
mil para as campanhas eleitorais da família Câmara. A conta, é claro, tem que
fechar: só no Amazonas, estado do deputado Silas Câmara, a Umanizzare é
responsável por seis unidades prisionais. No Tocantins, a empresa administra outras
duas unidades.
Silas Câmara é um dos 17 congressistas apontados pela
Organização Não Governamental (ONG) Transparência Brasil que poderia ter sido
barrado nas eleições de 2014 por conta da Lei da Ficha Limpa. Ele e sua mulher,
Antônia Lúcia Câmara, foram condenados pelo Tribunal Regional Eleitoral do Acre
(TRE-AC) por abuso de poder econômico nas eleições de 2010 e declarados
inelegíveis por três anos. Único eleito pela família, Silas conquistou o
direito de assumir o mandato na Justiça.
Silas é um dos 43 parlamentares responsáveis pela aprovação
da admissibilidade da PEC 171/1993. Ele esteve presente na sessão, votou pela
redução da maioridade penal e comemorou o resultado com aplausos e gritos, bem
como as mais de quatro dezenas de congressistas que fizeram o mesmo voto. Mais
que ideológico, a comemoração de Silas tinha um viés financeiro: com a redução
da maioridade penal, o aumento da população carcerária é uma consequência
automática. Para a empresa Umanizzare, financiadora do parlamentar, quanto mais
presos, mais lucro.
Além da Umanizzare, Silas Câmara recebeu R$ 210 mil da
empresa Fiel Vigilância Ltda. e outros R$ 190 mil da Total Vigilância Ltda. As
duas empresas trabalham com serviços de escolta armada e vigilância ostensiva.
Silas não é o único dos votantes pela redução da maioridade penal que tem como
financiador uma empresa de segurança. Além dele, os parlamentares Bruno Covas
(PSDB-SP), o pastor evangélico João Campos (PSDB-GO) e Felipe Maia (DEM-RN)
também receberam montantes elevados de empresas do setor.
Como se não bastassem os mandatos comprometidos com as
empresas que lucram com o aprofundamento do Estado penal e repressor, dos 43
deputados responsáveis pela aprovação da PEC da Redução, 25 têm problemas na
justiça e estão envolvidos em algum processo criminal.
O pastor João Campos é um deles. Além de processado por
embolsar o salário dos funcionários, recentemente, emitiu uma nota oficial de
repúdio ao beijo lésbico, protagonizado por Fernanda Montenegro e Nathalia
Timberg em uma novela da Rede Globo. A intolerância é a essência do mandato de
Campos. Bruno Covas e Felipe Maia também estão na lista dos envolvidos em
processos criminais.
As eleições de 2014 formaram o que o diretor do Diap
(Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) chamou de o Congresso
“mais conservador no período pós-1964”. A redução da maioridade penal assusta,
mas não surpreende. Não com os parlamentares eleitos para a atual legislatura.
Créditos da foto: Leonardo Prado/Agência Câmara
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