Mangabeira Unger recomendou a
suspensão do Mercosul e Modesto Carvalhosa sustentou a necessidade de
criminalização da Petrobrás.
J. Carlos de Assis* - http://cartamaior.com.br/
O senhor Mangabeira Unger, como
estrategista, e o senhor Modesto Carvalhosa, como jurista, são como uma espécie
de corpo sem espírito. O senhor Mangabeira desfila sua condição de importante
intelectual de Harvard mas, até onde eu saiba, nunca provou qualquer
contribuição relevante àquela universidade norte-americana. Parece que vive da
glória de ter sido apanhado num sorteio de cartas de garotos ao Presidente
norte-americano, coisa que faz questão de frisar em qualquer conversa como
prova de seu acesso ao poder naquele país.
É de Mangabeira que roubei o
enunciado acima, na medida em que ele sustenta numa entrevista a O Globo,
jornal que é inimigo declarado do Governo, que o Mercosul é um corpo sem
espírito, recomendando sua suspensão – tese também de O Globo. À parte a
invasão de prerrogativa do Itamaraty na formulação da política externa
brasileira, isso a partir de uma Secretaria secundária na estrutura do Estado,
ele simplesmente desmonta com sua agressividade verbal a única política externa
brasileira que sobreviveu a todos os presidentes da República, desde Sarney,
com excelentes resultados comerciais a nosso favor.
Não sou um “especialista” em
Mangabeira. Tive com ele uma única conversa, no Rio, numa época em que ele
cortejava o senador Crivella para ser, ele, Mangabeira, candidato a presidente
da República. Fiquei imaginando um comício para 100 mil pessoas no qual
Mangabeira tomasse a palavra com aquele sotaque carregado de gringo, vomitando
arrogância para todo lado. Será que os eleitores entenderiam? No quadriênio
seguinte Mangabeira se ofereceu a Lula para ser vice de Dilma, garantindo ter
os votos do Nordeste...
Na eleição de Obama, Mangabeira
ofereceu a quem quisesse cópia de uma longa carta que diz ter escrito ao
presidente recém-eleito sobre como ele deveria governar os Estados Unidos. Na
mesma época, mandou outra longa carta a Lula com o mesmo propósito em relação
ao Brasil. Esta, nos meus parcos domínios de economista, fiz questão de
ridicularizar: é que Mangabeira recomendava uma fortíssimo ajuste fiscal com
aumento para 7% do superávit primário, resolvendo por aí a crise fiscal
brasileira! Agora, ele quer que o foco da política externa seja a aproximação
com os EUA, algo que se assemelha a uma ovelha dormindo com elefante.
O fenômeno Mangabeira não é
propriamente de saber como ele é, mas de saber como ele se faz ver. Passa, como
disse, por um grande intelectual de Harvard, sem sê-lo. (Também não me
comoveria muito se o fosse na medida em que Harvard produz, desculpem-me, muita
merda desde que saiu de lá o grande Galbraith e sua turma!) Assim, o fenômeno
Mangabeira está associado ao conto de Lima Barreto, “O homem que sabia
javanês”, na medida em que só admira Mangabeira quem pensa que Mangabeira sabe
alguma coisa que ele próprio não sabe.
Um pedaço de culpa nessa história
é de Lula, que adora intelectuais sem entendê-los muito bem. Resgatou
Mangabeira duas vezes, antes e agora, da merecida obscuridade. Mas não só dele.
Meu dileto amigo Raphael de Almeida Magalhães, um dos espíritos mais lúcidos de
sua época, tinha por Mangabeira uma admiração que eu jamais entendi. Da parte
de Lula, sim, ele tem uma formação cultural muito acanhada e pode achar que
Mangabeira é o máximo por causa das credenciais falsas que apresenta, mas
Raphael entendia as credenciais. De qualquer modo, desde a formação do PMDB, de
que participou, Mangabeira vendeu muito gato por lebre nos bastidores do
partido até que se revelou dispensável e se recolheu a Harvard, para onde
sempre corre quando se revela insignificante aqui.
Vejamos agora o “jurista” Modesto
Carvalhosa. Numa entrevista ao Estadão, sustentou a necessidade de
criminalização da Petrobrás pelos desmandos de empregados na operação Lava
Jato. É claro que isso é uma estupidez jurídica e um contrassenso filosófico.
Pessoa jurídica não pode cometer crime. Ou é o caminhão, e não seu motorista,
quem deve ser processado criminalmente pelo atropelamento? Ao se insurgir
contra a CGU, a AGU e ao Ministério da Justiça por estarem inclinados a
considera a Petrobrás “vítima”, o senhor Carvalhosa passa por intérprete de seu
próprio livro sobre o assunto, muito provavelmente atrás de um bom contrato
nessa especialidade criada por ele mesmo!
Entretanto, a base do raciocínio
dele não é propriamente jurídica, nem filosófica. Diz ele: “Assim tendo
‘decidido’ o governo central, e tendo em vista ser a Petrobrás uma
multinacional, as jurisdições administrativas e judiciais americanas e
europeias, a par do Banco Mundial e do Banco Interamericano, vão impor não só
pesadíssimas penas pecuniárias à nossa estatal, como declarar sua inidoneidade
para contratar e obter créditos no exterior.”
E mais: “Pôr a Petrobrás como
vítima é um dos maiores erros que o atual governo pratica, na medida em que
afunda ainda mais o País no grupo dos países corruptos. O Brasil estava na
42ª posição entre os países declarados
corruptos pela Transparência Internacional, ou seja, abaixo da linha dos 50,
que é o número limite dessa categoria infamante. Agora deve afundar ainda
mais.” Jamais vi nada tão descarado em
matéria de subserviência.
Basta desse vendilhão da pátria.
Vou me ater a seu último argumento. O que fez a Transparência Internacional
relativamente à fraude praticada pelos 12 maiores bancos do mundo em relação à
Libor, taxa de juros que regula todas as negociações financeiras desde Londres?
O que fez relativamente às fraudes praticadas pelo Deutche Bank e pelo UBS no
trilionário mercado internacional de câmbio? Quem, como pessoa física, foi
punido pelas fraudes praticadas pelo Bank of America e Citigroup, com penas de
20 bilhões de dólares cada um, por conta de fraudes no mercado imobiliário
norte-americano?
Esses campeões da transparência
internacional, árbitros da corrupção mundial, tem um sistema jurídico tão
curioso que simplesmente ignora as pessoas como corruptas, para se limitar a
cobrar indenizações das empresas – ou seja, do lucro futuro. É o exato oposto
do que queremos aqui, com muito mais lógica. Punir o corrupto e adotar acordos
de leniência com as empresas onde ocorreram fraudes, já que são,
indiscutivelmente, vítimas dos seus próprios donos ou de seus próprios
executivos, e detentoras de invejável capacidade de construir coisas, de
viadutos a portos, assim como de tecnologia genuinamente nacional. E que se
salve o Direito Romano das mãos
incompetentes de gente como Modesto Carvallhosa que simplesmente,
provavelmente por interesses pessoais vinculados a interesses externos, querem
quebrar a maior empresa brasileira e latino-americana.
*Economista, professor, doutor
pela Coppe-UFRJ, autor de mais de 20 livros sobre Economia Política brasileira.
Créditos da foto: Agência Brasil
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