Mesmo se conseguir o que pretende, o ajuste não atingirá os
objetivos de "arrumar a casa" para o crescimento.
Fabrício Augusto de Oliveira / http://cartamaior.com.br/
Passado o período de perplexidade com o rumo conservador
imprimido à nova política econômica do Governo Dilma, as atenções dos analistas
econômicos, do Congresso Nacional, do próprio governo e da sociedade em geral
se encontram voltadas para os resultados que poderão ser obtidos com a proposta
de ajuste fiscal. Com ele se espera, sem qualquer suporte teórico ou empírico,
criar as condições necessárias para o reencontro do país com o crescimento
econômico.
Até o momento, a proposta do ajuste apresentada pelo governo
no início do ano continua patinando no Congresso e caminha vendo emagrecer, a
cada dia e a cada rodada de negociação e votação de seus principais pontos, a
fatia de recursos com que se contava para garantir o atingimento da meta de um
superávit primário do setor público, em 2015, de R$ 66,3 bilhões, o
correspondente a 1,2% do PIB.
Um nível nada espetacular em relação aos megassuperávits
obtidos poucos anos atrás, mas considerável levando em conta que, em 2014, foi
gerado um déficit de 0,6% do PIB, o que representaria um ajuste global no ano
de 1,8% do PIB.
Do pacote inicial com o qual o governo pretendia economizar
R$ 18 bilhões, cortando benefícios trabalhistas e previdenciários, não lhe
restou outra saída, para garantir a aprovação das medidas provisórias que
encaminhou ao Congresso, senão a de abrir mão de R$ 4 bilhões com as mudanças
nelas introduzidas em resposta à oposição ao seu conteúdo, visando a atenuar as
perdas que representariam para seus beneficiários.
Além disso, o ganho que se esperava neste ano com a mudança
da política de desoneração da folha de salários, de R$ 5,3 bilhões, com a
elevação das alíquotas de impostos cobradas sobre 56 setores que com ela foram
beneficiados, não devem mais ocorrer nessa dimensão.
Isso porque a proposta teve de ser reenviada ao Congresso na
forma de um projeto de lei, cuja apreciação demanda mais tempo, além de não
serem poucas as resistências que existem ao aumento considerável, na proposta
original do governo, de mais de 100% das alíquotas incidentes sobre o
faturamento destes setores.
Não bastasse isso, a expectativa de obtenção de uma receita
tributária adicional de mais de R$ 20 bilhões que seria propiciada pelo aumento
de impostos (IPI, IOF, principalmente), incluindo o retorno da cobrança da CIDE,
pode ser frustrada pelo avanço da recessão: em termos reais, ou seja,
descontada a inflação, as receitas administradas pela Receita Federal
despencaram 2,03% no primeiro semestre, caindo de R$ 309,3 para cerca de 303
bilhões.
Equivalente a uma perda mensal de R$ 2 bilhões, a qual,
anualizada, representaria 133% dos recursos que se esperava economizar com os
cortes de gastos. E isso com a recessão, que se descortina, sem ter ainda chegado
com a força que se espera.
Até o primeiro trimestre do ano, os resultados alcançados nas
contas públicas, neste conceito, não são animadores: a economia de recursos do
setor público consolidado chegou a R$ 19 bilhões, representando 1,37% do PIB
(retração de 26% em relação ao mesmo período de 2014), mas quem mais contribuiu
para este resultado foram os governos regionais (estados e municípios), que
registraram um superávit primário de R$ 14,6 bilhões no período (77% do total).
Já a poupança do governo central, para quem se projeta a
maior contribuição neste esforço, não foi além de R$ 4,48 bilhões. Não sem
razão, alguns analistas têm projetado um superávit primário do setor público no
ano não superior a 0,8% do PIB, considerando que este, se alcançado, já
representaria uma grande vitória para o governo.
Valendo-se do atraso ocorrido na aprovação pelo Congresso do
orçamento de 2015 em quase três meses, o governo conseguiu represar, diante das
limitações de gastos que tal situação acarreta, despesas apreciáveis no
primeiro trimestre em áreas sociais nobres, como as da educação e saúde, e na
de infraestrutura, onde os investimentos conheceram uma retração de 31% no
primeiro bimestre.
Nem isso foi suficiente para se colher um melhor resultado
ante a queda apreciável das receitas, provocada pela desaceleração econômica em
curso e pelas renúncias tributárias.
Diante disso, não parece restar, ao governo, senão avançar na
ampliação do corte do orçamento cuja programação está em vias de ser anunciado.
De um contingenciamento inicialmente estimado em menos de R$ 60 bilhões, este
número subiu para R$ 70 bilhões e não será nenhuma surpresa se alcançar R$ 80
bilhões, o que faria o governo voltar ao patamar de gastos de 2013.
Adicionalmente, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem
ameaçado o Congresso com uma nova rodada de aumento de impostos, caso as
medidas restantes do ajuste a serem votadas continuem a ser esquartejadas pelos
parlamentares.
Ambas as medidas significam, pelo seu conteúdo, mais lenha na
fogueira da recessão e dificuldades adicionais para que o ajuste pretendido
seja alcançado. De qualquer forma, mesmo que isso se torne possível, será
inútil para os objetivos pretendidos de “arrumar a casa” para uma nova etapa de
crescimento econômico.
Enquanto o ministro da Fazenda continua empenhado em
realizar, a todo custo, um ajuste de 1,2% do PIB, que pode ter seus resultados
anulados, do ponto de vista da relação dívida/PIB, que é a que realmente
importa, caso a economia se retraia 1%, o que é mais do que provável, o Banco
Central, com a persistente elevação dos juros, visando a combater sem sucesso a
inflação, continua se esforçando para fraudar este objetivo, ao amplificar o
desajuste das contas públicas, com o aumento do déficit nominal e da dívida
pública.
No primeiro trimestre deste ano, o déficit nominal atingiu R$
124,8 bilhões (contra R$ 33 bilhões do mesmo período de 2014), acumulando, nos
últimos doze meses, o montante de R$ 435,7 bilhões (ou 7,81% do PIB).
Ou seja, enquanto se busca, de um lado, produzir um superávit
primário de R$ 66,3 bilhões, o aumento do déficit nominal no primeiro trimestre
chegou a R$ 91,8 bilhões. Com isso, a dívida líquida do setor público só não
conheceu aumento porque a desvalorização de 20,8% acumulada no ano respondeu
por uma redução de cerca de R$ 180 bilhões em seu estoque. Mas a dívida bruta,
no conceito do Banco Central, aumentou 1,4 ponto percentual do PIB, passando de
61% para 62,4%.
Com este ajuste esquizofrênico, não será nenhuma novidade se
a política econômica, além de produzir a “paz dos cemitérios”, situação em que
não há mais vida econômica e social pulsante, conduzir o país para um quadro de
crescentes desequilíbrios financeiros, jogando-o, sem forças, nos braços das
agourentas agências de rating.
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Fabrício Augusto de Oliveira é doutor em Economia pela
Unicamp e membro da Plataforma de Política Social.
Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de
Política Social e autor, entre outros, do livro “Dívida pública do Estado de
Minas Gerais: a renegociação necessária”, de 2012 - See more at:
http://brasildebate.com.br/o-ajuste-esquizofrenico/#sthash.BfI6587S.RyhiLkDv.dpuf
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Política Social e autor, entre outros, do livro “Dívida pública do Estado de
Minas Gerais: a renegociação necessária”, de 2012 - See more at:
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Social e autor, entre outros, do livro “Dívida pública do Estado de Minas
Gerais: a renegociação necessária”, de 2012 - See more at:
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Créditos da foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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