Luiz Manfredini * / http://www.dialogosdosul.org.br/
Quando soube da prisão do
ex-ministro José Dirceu pela operação Lava Jato, na manhã da última
segunda-feira, 3, de pronto me indaguei: “Mas ele não estava preso?”. Estava,
sim, em prisão domiciliar, concluindo a pena que lhe foi imputada por conta do
que a mídia convencionou chamar de “mensalão”.
Minha indagação percebi-a ao ler
o noticiário a respeito, era a mesma do deputado Wadih Damous, advogado e
ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, como bem situou em seu
blog, o jornalista Paulo Moreira Leite: “Por que prender quem já estava
preso?”, questionou Damous, para acrescentar que José Dirceu “não praticou
qualquer ato que constituísse risco à ordem pública, à instrução criminal ou a
futura aplicação da lei penal”.
Em prisão domiciliar, o ex-ministro
não poderia ser ouvido em casa, ou mesmo conduzido à Curitiba, se e quando
assim o exigisse essa nova fase da Lava Jato? Poderia. Mas, neste caso, os
efeitos desejados não seriam os mesmos. Na trama policial-judiciário-mediática
que hoje impera no Brasil, procurando inviabilizar o governo Dilma e reduzir a
pó o PT, a esquerda e a imagem do ex-presidente Lula, seria necessário um fato
mais escandaloso. No início de um agosto que se mostra agourento, com a
possível recusa, pelo Tribunal de Contas da União, das contas do governo
federal, as ameaças de desestabilização de Eduardo Cunha e a manifestação que a
direita promete para o próximo dia 16, nada melhor, mais estimulante para os
intentos reacionários do que o espetáculo de retirar da prisão domiciliar e
botar numa cela da Polícia Federal, com ampla cobertura midiática, um nome
emblemático do PT e da esquerda como José Dirceu.
Portanto, o ex-ministro não foi
preso desse modo esquisito, juridicamente controverso, em função de eventuais
responsabilidades que possa ter em operações ilícitas apuradas pela Lava Jato.
Quem pensar assim estará se aprisionando nas aparências, apenas nelas,
distante, portanto, da essência desse significativo fato político que, por sua
vez, integra um quadro mais geral de confrontação de classes no Brasil. Em seu
artigo “Dirceu e o show judicial-midiático”, o jornalista Altamiro Borges,
presidente do Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé, citou a emblemática
afirmação de outro jornalista, Igor Gielow, da “Folha de S. Paulo”, segundo o
qual “a prisão de José Dirceu recoloca o PT na mira da Operação Lava Jato”.
Este foi e é o objetivo, embora em Curitiba, o controverso juiz Sérgio Moro,
justificando a prisão, tenha mencionado indícios de que o petista recebeu
propina após sua condenação e que, ainda que a medida visou manter a ordem
pública. Indícios?
Em seu artigo “A prisão do preso
e os direitos de Dirceu”, o jornalista Paulo Moreira Leite afirma, com
propriedade: “A prisão não pode ser imposta pelo Estado, desde que cumpra
determinadas condições, entre elas demonstrar a culpa além de qualquer dúvida
razoável”. Mas o juiz Moro dispõe apenas de indícios contra Dirceu e, em sua
sanha antipetista, julgou isso suficiente para coloca-lo numa cela. Por isso o
mesmo Moreira Leite diz que, em sua opinião, “a prisão de Dirceu constituiu
mais uma entre tantas barbaridades que tem sido cometidas no país depois que,
como sublinha o ministro Marco Aurélio Mello, a Lava Jato instituiu a regra
pela qual “manda-se prender para depois apurar.”
Triste a condição política atual
do Brasil, com uma oposição de direita com alto grau de ferocidade, que manda
às favas os interesses maiores do país e de seu povo e só faz tramar para
novamente abocanhar o poder e perpetrar o que todos sabemos. Uma trama como já
vimos em épocas passadas, com resultados trágicos. Mas nessa armação toda
sobressaem, como ingredientes no mínimo preocupantes, a reticência pusilânime
com que o PT se posta diante da crise (nenhuma palavra em defesa de José
Dirceu, só para citar um exemplo) e a atitude de certo modo olímpica do
Planalto, sem qualquer menção ao complô da direita que está por trás da
turbulência política que hoje vitima o Brasil.. Pagarão caro por isso. Como diz
Breno Altman, diretor do sítio Opera Mundi, “a política aceita quase qualquer
coisa, menos a humilhação de quem decide, por covardia ou erro de cálculo,
perder sem lutar”.
* Jornalista a escritor paranaense, autor, entre outros livros, dos
romances “As moças de Minas”, “Memória e Neblina” e “Retrato no entardecer de
agosto”. Original do Portal Vermelho
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