A
fórmula chinesa de acumulação de reservas internacionais (quase 4 trilhões de
dólares) só dá certo porque o país tem, ao lado do sistema mercantilista,
controle de capitais e regulação do câmbio. Do contrário aconteceria uma de
duas coisas: uma explosão monetária interna, como contrapartida do superávit
comercial que está na origem da acumulação de reservas, ou uma inflação interna
gerada pela escassez de produtos e serviços que estão sendo exportados. A administração
cambial e de fluxo de capitais resolvem os dois problemas.
Frente
à arquitetura financeira ocidental, o expediente dos controles parece
artificial. Economistas dos EUA e da Europa ficam enfurecidos com ele acusando
a China de uma política câmbio-comercial de explorar o vizinho. Esquecem-se do
óbvio: a arquitetura financeira ocidental é, ela sim, um artifício para
explorar em favor dos EUA todos os países que dependem do dólar em suas
relações internacionais. Agora mesmo eles acabam de emitir 3,4 trilhões de
dólares de forma totalmente irresponsável, disponibilizando-os para seus bancos
a juros de zero por cento.
O
comércio internacional real é totalmente favorável aos Estados Unidos. Eles
compram produtos e serviços do mundo inteiro pagando com o papel que apenas
pintam. Já os países superavitários com os Estados Unidos (ou com outros
países) fazem um esforço real de produção e exportação de bens e serviços,
subtraindo esses últimos do mercado interno. Se compram de outros países no
mesmo montante, a balança comercial se equilibra, e o que perdem nas
exportações é recuperado nas importações. Os EUA ganham a chamada senhoragem,
ou seja, a base monetária da operação.
No
entanto, no caso de déficit comercial, entram em crise. Sua moeda não é aceita
no mercado internacional. São obrigados a recorrer ao FMI, e este último lhes
impõe condicionalidades de política econômica para lhes emprestar recursos.
Justamente por isso – para evitar as condicionalidades contracionistas do Fundo
– a China e outros países asiáticos, estes últimos depois das crises
financeiras dos anos 90, resolveram acumular reservas cambiais através de uma
política mercantilista. Assim escapam da interferência draconiana do FMI.
É
bom lembrar que o grande economista do
século XX, John Maynard Keynes, propôs, na reunião de Bretton Woods (1944), um
sistema internacional bem mais racional e justo. Ele partia do conceito de que
o comércio internacional, equilibrado por definição, deveria ser equilibrado
também na prática. Países deficitários deveriam ser induzidos a exportar mais,
e os países superavitários deveriam ser induzidos a importar mais. A moeda
dessas transações seria um ente contábil, o bankor, que não geraria poder de
compra, mas simples compensação.
Os
Estados Unidos, condicionados por Wall Street, rejeitaram esse esquema. Claro,
já no fim da guerra, da qual estavam emergindo como a principal potência
mundial, preferiram um sistema mais simples que agradava aos banqueiros e a
eles próprios. Tivemos, assim, uma grande oportunidade de ver construído um
sistema internacional mais justo. Talvez agora, em plena crise financeira, o
tema volte à baila. Até lá, o melhor que devemos fazer é olhar com bastante
atenção a China e a Ásia a fim de colher seus bons exemplos no campo
internacional.
J.
Carlos de Assis - Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor, entre outros
livros de política econômica, de o recém-lançado “Os Sete Mandamentos do
Jornalismo Investigativo”, Ed. Textonovo, SP.
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