O biênio 2013 – 2015 ficará registrado na história
como um período em que uma das maiores nações do mundo cometeu um literal
suicídio. Com requintes de crueldade, tomada por um surto autodestrutivo que
talvez jamais seja explicado.
Há míseros dois anos, o Brasil despontava como
potência emergente – finalmente o país do futuro estava se tornando o país do
presente.
A economia crescia pouco, mas crescia
continuamente; a inflação estava alta por conta da forte demanda, mas estava
controlada; a taxa de investimento privado vinha subindo; o desemprego caía mês
a mês.
Enquanto o resto do mundo se contorcia em uma crise
internacional interminável, então no quinto ano, com europeus e americanos à
beira da convulsão social, o Brasil parecia uma ilha de prosperidade e
estabilidade.
A nova classe média vivia um sonho dourado.
Famílias viam seus filhos e netos se tornarem os primeiros universitários da
linhagem, o sonho da casa própria se materializava, os salários tinham cada vez
mais poder de compra.
Eis que surge, na maior metrópole do país, um
movimento inexplicável. Com a renda em ascensão e o desemprego despencando,
partidos de esquerda, professores universitários e estudantes desencadeiam uma
guerra contra aumentos de passagens no transporte público.
As passagens de ônibus e metrô iriam subir 20
centavos. Em um momento de valorização dos salários e queda do desemprego, não
era para tanto. Mas esses grupos radicalizados tinham uma proposta tentadora –
para os incautos: em vez de aumentar o preço do transporte público, a
endividada capital paulista deveria fornecer transporte de graça para todos.
Décadas de problemas no transporte público foram
jogadas no colo do recém-empossado prefeito paulistano, Fernando Haddad.
Um prefeito que mal tomara pé da situação escabrosa
da administração herdada de José Serra e Gilberto Kassab, obviamente que não
tinha meios de atender à demanda surpreendente de, do nada, oferecer transporte
público de graça para todos ou ao menos transferir para os cofres públicos, já
combalidos, o custo dos reajustes contratuais com as empresas de ônibus.
Os grupos de ultraesquerda, porém, tinham um plano
para pôr de joelhos o novo prefeito. Importaram uma tática de protestos
conhecida como “bloco negro”, que se valia da destruição do patrimônio público
e privado, com uso até de bombas incendiárias para parar a cidade, impedindo o
trânsito nas principais vias e desesperando a população que tem que ir
trabalhar e retornar para casa todos os dias.
A influência de “pensadores” de ultraesquerda sobre
as mídias, sobretudo as mídias alternativas, romanceou aquele processo. Sem
alguma razão lógica em um país que vinha se desenvolvendo a passos largos e
distribuindo renda, aquele processo foi visto como positivo.
Eis que o governo paulista, controlado pela direita
fundamentalista religiosa, opta pela violência como forma de conter os abusos
contra o povo paulistano em vez de buscar diálogo. Da violência policial,
brota, então, um fortalecimento do movimento radical.
Incrivelmente, os grupos radicalizados ditos “de
esquerda” se voltam contra o prefeito em vez de culparem o governador, e o
partido de Fernando Haddad vira a Geni das manifestações. Às dezenas de
milhares, entre bandeiras de partidos como PSOL, PSTU, da Rede de Marina Silva
e outros, os brados de “fora, PT!” ecoam pelos quatro cantos do país.
Agora, após a violência da ditadura tucana em São
Paulo, as ruas de todo país são tomadas por centenas de milhares de congêneres
dos bichos-grilos paulistas, aos brados de “Fora, PT!”. Com o Brasil vendo
aquelas marés humanas bradando contra o partido que o governa, Dilma Rousseff
torna-se depositária de uma revolta por vinte centavos.
Nesse momento, a extrema direita vê oportunidade
que não encontrava havia mais de uma década. E sai à rua.
Todo lixo social do pais invade as ruas, agora
transformadas em uma gigantesca rave em que cabiam de radicais de esquerda a
neonazistas. A mídia corporativa vê a oportunidade que tanto ansiava e minimiza
a insensatez que aumenta. E até a incentiva.
Eis que, em meados de junho de 2013, os autores
esquerdistas daqueles protestos se dão conta de que pavimentaram as ruas para a
ultradireita e se recolhem, após dobrarem os governos do Estado de São Paulo e
da capital na questão dos aumentos das passagens.
Chega 2014 e a ultraesquerda tem outra ideia de
jerico. Decide que a Copa do mundo era a culpada por todos os males nacionais e
volta às ruas quebrando e incendiando, tentando impedir a realização do evento.
O país perde a oportunidade de obter lucros altíssimos, pois o fluxo de
turistas acaba sendo muito menor do que poderia.
Nas redes sociais, grupos organizados de
extrema-direita e extrema-esquerda tratam de compor vídeos e memes em inglês
para assustar os turistas estrangeiros, chegando a dizer que se viessem ao país
correriam risco de vida devido à radicalização dos protestos contra a Copa.
Chega a eleição presidencial e Dilma Rousseff
parece ter poucas chances de se reeleger. A economia já se combalia diante dos
ataques pela esquerda e pela direita, que assustaram investidores e ensejaram
uma progressiva paralisação da economia.
Enquanto isso, os dois candidatos de oposição mais
competitivos ameaçam o país com reformas ultraliberais como privatização de
bancos públicos, desvalorização do salário mínimo, independência do Banco
Central.
A esquerda radical percebe que não poderia
implantar o socialismo e, pior, que estava para ver surgir um regime
ultraliberal que resultaria em graves retrocessos, sobretudo no que diz
respeito ao processo de distribuição de renda que fizera o índice de Gini
brasileiro melhorar como jamais ocorrera por aqui desde que fora criado para
medir a concentração de renda das nações.
Por pouco, muito pouco, Dilma se reelege. Porém, o
custo de quase dois anos de sabotagens da economia, com redução drástica de
investimentos devido à insegurança gerada pela política, impõe que as políticas
anticíclicas sejam abandonadas.
Não dá mais para renunciar a impostos para manter o
ritmo da economia, do crescimento, dos salários e da queda do desemprego. Há
que fazer um ajuste fiscal. Muito mais brando do que seria feito pelos
principais candidatos a presidente derrotados por Dilma, mas, ainda assim, um
ajuste duro, pois implicaria em um freio de arrumação na economia.
Sem novas sabotagens, porém, em alguns meses
estaria tudo resolvido. A economia daria uma parada, mas, no segundo semestre –
agora com os investidores mais confiantes devido ao equilíbrio entre receita e
despesa –, o país recomeçaria a crescer, o emprego voltaria a subir, os salários
a se valorizar e a desigualdade a cair.
Eis que a extrema-direita se recusa a aceitar o
processo de soerguimento do país. Unindo-se à centro-direita tucano-midiática e
a grupos radicais conservadores incrustados na Polícia Federal e no Ministério
Público, desencadeia uma ofensiva “contra a corrupção” que paralisaria a
economia ao emitir sentenças condenatórias contra grandes empresas antes do
devido processo legal.
Já não é mais polêmico dizer que a política está
destruindo a economia. Todos já reconhecem que a política está afundando o
país.
Os grupos de ultradireita fazem a festa. Pouco lhes
importa o futuro. Só a destruição da esquerda – inclusive daquela que tanto os
ajudou – interessa. Saem à rua, agora sem pudor, e pedem nada mais, nada menos
do que um golpe militar. A esquerda a tudo assiste impassível, em seu “mimimi”
contra medidas econômicas sem as quais o país afundaria muito mais.
Esse é o resumo da ópera. A direita radical ataca
por um lado, a esquerda radical ataca por outro e o país mergulha em um buraco
político, econômico e institucional cujo fundo ainda não é possível vislumbrar.
Em breve, os próximos capítulos do suicídio do
Brasil.
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