EMIR SADER // http://www.brasil247.com/
Poucas vezes se viu uma força
política tão empenhada em conquistar o governo, depois de uma derrota
eleitoral, como a que usa a direita brasileira desde já há mais de um ano.
Impeachment, renúncia, golpe, Temer – sob qualquer forma, o que a anima e a unifica
é a tentativa de derrubar o governo eleito.
É de se perguntar o que
pretenderiam fazer com o país, caso retornassem ao governo, para que atuem com
tanta fúria e com tanta pressa? Possuem fórmula mágica e imediata para
recuperar o país da crise? Em que contribuições que deram ao país se baseiam
para ambicionar tanto a voltar a dirigi-lo?
Em outro momento da nossa
história recente, a direita assediou sistematicamente o poder, até
conquistá-lo. O projeto começou com o retorno das tropas brasileiras da Itália,
ao final da segunda guerra, quando, sob o comando de Golbery do Couto e Silva e
de Humberto Castelo Branco, foi fundada a Escola Superior de Guerra. Munida da
Doutrina de Segurança Nacional, a ESG começou a colocar em prática a estratégia
dirigida pelos EUA na guerra fria, de conquista plena dos Estados, para
transformá-los em quarteis generais na luta contra a "subversão
comunista".
Ao longo dos governos de Getúlio,
de JK e de Jango, foram se desenvolvendo tentativas de golpe militar como via
para se chegar ao poder, dadas as derrotas reiteradas dos seus candidatos nas
eleições. Foram se articulando programa de governo até que, vitoriosa
finalmente a estratégia, o golpe de 1964 pôde colocar em prática o projeto da
direita brasileira, dispondo de todo o poder possível, por meio do governo das
FFAA.
Aí a direita, mais além das
promessas de "resgate da democracia do perigo da ditadura comunista",
pôde demonstrar ao que vinha. Destruiu tudo o que havia de democrático no
Brasil, impôs o arrocho salarial – com seu corolário de intervenção militar em
todos os sindicatos -, promoveu a ideologia de segurança nacional como
ideologia de Estado e governou de forma subordinada às politicas dos EUA, de
quem cumpriu o papel de subimperialismo.
A economia brasileira se
modernizou, mas amputou o mercado interno de consumo popular da sua política
econômica, com a concentração de renda impondo o eixo de exportação e consumo
de luxo como os objetivos essenciais do modelo. O arrocho salarial foi o santo
do "milagre econômico", que acentuou, como nunca, a desigualdade social
no país.
A destruição da democracia e a
imposição de um modelo econômico que favorecia centralmente as grandes
corporações econômicas – que fizeram do Brasil o país mais desigual do
continente mais desigual – foram as contribuições daquela experiência de mais
de duas décadas de poder absoluto da direita no Brasil.
Mais tarde, a derrota das
eleições diretas permitiu que um novo bloco da direita, espelhado na
presidência de José Sarney, apoiado numa aliança entre o velho e o novo,
esgotasse o impulso democrático, abrindo caminho para que um "filhote da
ditadura", Fernando Collor de Mello, colocasse em prática outro projeto da
direita – o neoliberal. Que, cortado pela sua queda, foi retomado por FHC.
Que contribuições essa nova fase
da direita no governo trouxe para o país? A estabilidade monetária – conseguida
inicialmente, embora a inflação retornasse posteriormente –, sem políticas
sociais que atacassem o problema central do país.
A herança maldita recebida pelo
Lula, de recessão profunda e prolongada, Estado desarticulado, sociedade
fragmentada, endividamento 10 vezes maior, inflação de retorno, desigualdade
aumentada, refletia os resultados daqueles governos.
Essas foram as contribuições que
a direita trouxe para o país. E, pelos programas dos seus candidatos nas
ultimas eleições, ambos com gurus de perfil neoliberal, não seria diferente do
que foi o governo FHC, um retorno da direita ao governo – por mais que prometam
manter as políticas sociais dos governos atuais.
A ansiedade por desalojar o PT do
governo é tal que agora a direita nem sequer menciona como trataria de superar
a crise atual. Seu objetivo – por impeachment, golpe, Temer ou como seja – é
apenas tirar o PT do governo e tentar impedir o sucesso de uma candidatura
Lula.
Os governos da direita não
trouxeram contribuições positivas ao país, nem do ponto de vista democrático,
nem do econômico ou do social. O governo de Mauricio Macri, na Argentina,
demonstra que, do que se trata para a direita do século XXI na América Latina,
é de repor os grandes interesses econômicos no comando do governo, sem os
contrapesos que um Estado nas mãos de governos com sensibilidade social
representa. Seria uma restauração conservadora, tanto do ponto de vista do
regime político, como das políticas econômicas, com seus duros reflexos no
plano social. Esse é o ideal da direita brasileira no século XXI.
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