
Revista do Brasil - De olho na novela do impeachment e no
julgamento pelo TSE da representação protocolada pelo PSDB contra a eleição de
Dilma Rousseff e de Michel Temer, muitos têm deixado de perceber que a ofensiva
do campo conservador tem ido muito além da tentativa de derrubar a presidente
da República. Agora, à possibilidade que existe, também, de
"sangrá-la" até o último dia de mandato, se agrega, a cada dia mais,
um objetivo paralelo, uma terceira via, que tem avançado com incrível
facilidade: a de impor a aprovação de uma agenda conservadora no Supremo
Tribunal Federal e no Congresso, mantendo o governo, também ali,
permanentemente nas cordas, a ponto de transformá-lo em cúmplice da implementação
de medidas que teriam mais dificuldade de ser aprovadas se a oposição tivesse
vencido as eleições.
Esse é o caso, por exemplo, da aprovação de uma lei
antiterrorista absolutamente inócua, ambígua, ¬esdrúxula, anacrônica,
desnecessária, antidemocrática – criticada pela própria ONU e pela OEA –, que,
do ponto de vista de relações externas, pode vir a nos indispor com inimigos
que nunca tivemos e, no âmbito interno, representa mais um passo na
consolidação de um regime jurídico-policial de facto repressivo, injusto e
arbitrário, e no estrangulamento do direito de opinião, de organização e de
manifestação da população brasileira.
Em outro gigantesco passo rumo à fascistização do país, o
STF, em flagrante atentado à Constituição, aprovou a prisão de réus logo após a
condenação em segunda instância, como se tivéssemos excesso de impunidade em um
país no qual 40% da população carcerária se encontra, sem julgamento ou culpa
formada, atrás das grades, e a cada três horas, em média, um cidadão morre
abatido pela polícia.
No mesmo caminho, o da radicalização de mecanismos de
repressão e violência que mascaram a verdadeira natureza dos problemas e
impedem a busca de soluções modernas, coletivas e racionais para eles, avança,
no Congresso, a aprovação de lei que pretende, com o fim do Estatuto do
Desarmamento, armar os "homens de bem" para "autodefesa",
atendendo aos interesses de empresas que financiaram as campanhas.
Enquanto isso, controlar a altíssima remuneração,
inconstitucional, de muitos juízes, funcionários do Congresso, promotores,
deputados que juntam aos seus salários outros proventos públicos, ninguém quer.
No Legislativo, se organizam grupos de deputados para impedir a aprovação do
projeto de lei dos supersalários, que pretende acabar com a farra dos
"penduricalhos" de setores que adoram se apresentar ao público como
campeões dos bons costumes.
No campo da economia, não satisfeitos com a aceitação, pelo
Senado, da proposta que muda as regras do pré-sal, abrindo caminho para leilões
de novos campos de petróleo e para a aprovação pela Câmara de projeto ainda
mais vergonhoso, que prevê o fim do regime de partilha e a volta ao de concessão
estabelecido nos "fantásticos" tempos de FHC, os privatistas
trabalham para aprovar, em regime de urgência, sem ampla discussão com a
sociedade, o Projeto de Lei do Senado (PLS) 555, que pretende entregar para o
"mercado" empresas essenciais para a execução de qualquer projeto de
desenvolvimento nacional, como BNDES, Caixa Econômica Federal, Embrapa,
Correios, a parte ainda não privatizada da Petrobras etc., substituindo sua
função estratégica e social pelo interesse de "investidores".
Acreditar, a priori – em um mundo em que poderosas empresas
100% estatais como a Chemchina, se lançam à compra, por dezenas de bilhões de
dólares, de gigantes multinacionais como a Syngenta –, que o Estado não deve
ter presença na economia é um raciocínio tão estúpido quanto achar que não deva
existir iniciativa privada, só porque ela é particular, ou que se deva impedir
que capitais estrangeiros não possam ter lugar dentro de fronteiras nacionais.
¬Isso, desde que esses "capitais" aportem realmente alguma coisa ao
país, e sejam controlados e limitados estrategicamente, segundo os interesses
nacionais.
Este não é o caso de outro tema da agenda conservadora, o
novo marco regulatório dos jogos no Brasil, que pretende entregar a empresas
norte-americanas que sucederam a máfia em locais como Las Vegas e Reno, no
estado de Nevada, nos Estados Unidos, um gigantesco "negócio", que,
se aprovado, irá movimentar dezenas de bilhões de dólares por ano. São
representantes dessas empresas, como a Sands Corporation, que estão sendo ouvidos
pela comissão especial que estuda o assunto, para dar, generosa, altruísta,
"colaboração" e "aconselhamento", para o estabelecimento da
legislação pertinente ao tema, o que equivale mais ou menos a chamar um bando
de raposas para assessorar no estabelecimento das regras da exploração futura
de um galinheiro.
E quem vai impedir os negócios paralelos, como corrupção –
que normalmente se prevê nesse tipo de negócio –, lavagem de dinheiro,
exploração da prostituição e do tráfico de drogas, que são de amplo
conhecimento de qualquer um que já tenha pisado em Las Vegas? Se a intenção é
criar empregos, como se alega, que se passe a futura administração dos cassinos
e bingos, no Brasil, à Caixa Econômica Federal, que já administra as loterias,
para que o faça com rigoroso controle do pessoal envolvido, devidamente
concursado e contratado como funcionários públicos.
Posto isso, voltemos à situação da Nação neste momento.
Será que na luta fraticida pelo poder a qualquer preço – que
inclui sobrevalorizada, cínica, manipulada campanha contra a corrupção – não se
pode perceber que o estraçalhamento geral da atividade política e a destruição
dos elementos estratégicos de desenvolvimento nacional, aí incluídas nossas
maiores empresas privadas e públicas, equivale a jogar o bebê com a água do
banho pela janela ou a matar os bois junto com os carrapatos, e só pode
beneficiar a inimigos? A tudo isso, se contrapõe um quadro de total
desorganização dos trabalhadores, dos nacionalistas, desenvolvimentistas, e de
um capital nacional que não entende que, por trás do discurso de uma mídia
majoritariamente entreguista e antibrasileira, não se encontra mais do que o
germe de sua destruição e desnacionalização no horizonte próximo.
Onde está a Frente Parlamentar Nacionalista? O que
pretendemos fazer com este país neste século?
Recuar, de maneira medieval, no campo estratégico e social,
transformando-nos na vanguarda do atraso messiânico, conservador e
fundamentalista da América Latina, em uma província norte-americana que entrega
seu patrimônio e seu mercado e copia o que sua adorada matriz tem de pior,
abrindo mão de toda possibilidade de ser uma nação de alguma importância entre
seus pares do mundo, apesar de termos recebido daqueles que nos antecederam a
bênção da quinta maior nação do planeta, forjada no suor e no sangue de nossos
antepassados?
Ou vamos, como a Rússia, a Índia, a China, nossos sócios nos
Brics, investir no nacionalismo, na união e no desenvolvimento, como fulcro de
um projeto nacional que reúna o país em torno de objetivos perenes de
fortalecimento geopolítico, consolidação e valorização da liberdade e da
democracia, e a busca constante do progresso econômico e social, combatendo a
miséria não com um 38 na mão, mas com mais educação, pesquisa, -tecnologia,
amor ao Brasil e inteligência estratégica?
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