quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Temos Judiciário mas, infelizmente, não temos Justiça

RIBAMAR FONSECA // http://www.brasil247.com/

Depois que a senadora gaúcha Ana Amélia desmascarou o Supremo Tribunal Federal da tribuna do Senado afirmando, sem contestação, que a Corte acobertou o golpe contra a presidenta Dilma Roussef, parece que alguns magistrados também deixaram cair as suas máscaras, assumindo, sem nenhum constrangimento, o partidarismo que tem caracterizado o comportamento de parte do Judiciário. Não há nenhuma explicação convincente, por exemplo, para a decisão do ministro Teori Zavascki autorizando a abertura de inquérito contra a Presidenta e o ex-presidente Lula, por suposta tentativa de obstrução da Justiça, enquanto casos graves de desvio de recursos públicos e recebimento de propina envolvendo peemedebistas e tucanos, exaustivamente denunciados, são esquecidos. Ao mesmo tempo em que se preocupa estranhamente em investigar acusações subjetivas, criminalizando ilações, a mais alta Corte de Justiça do país finge ignorar, entre outras, as delações de Sergio Machado, ex-diretor da Transpetro, que envolveram ministros do governo Temer e o presidente do Senado. Isso, por acaso, é imparcialidade?
O juiz Sergio Moro, comandante da Operação Lava-Jato, sofre dessa mesma "imparcialidade", talvez com maior gravidade. No despacho em que nega o recurso da defesa do ex-presidente Lula, para que o seu processo seja transferido para a justiça de São Paulo, Moro se declara competente para julgar o líder petista, afirmando: "A hipótese investigatória que levou à instauração dos inquéritos, de que o ex-Presidente seria o arquiteto do esquema criminoso que vitimou a Petrobras e que, nessa condição, teria recebido, dissimuladamente, vantagem indevida, define a competência deste Juízo, sendo a correção ou incorreção desta hipótese dependente das provas ainda em apuração nos inquéritos". Hipótese?? Enquanto exigem provas para as delações da Odebrecht contra Temer e Serra instauram inquérito contra Lula baseados em hipótese? E ainda usam o incondicional "seria" para acusá-lo? Será que existe melhor prova da suspeição do magistrado de Curitiba, que se comporta como acusador, para julgar Lula? Parece que estão todos pensando: "Às favas com os escrúpulos".

Mas isso não é tudo. No pedido de Busca e Apreensão criminal nº 5010119073.2016.4.04.7000/PR, de 16.08.2016, o juiz Moro afirma que "há alguns bens que, se recebidos como presentes durante o exercício do mandato de Presidente da República, talvez devessem ter sido incorporados ao acervo da Presidência". Pergunta-se: o que a Lava-Jato tem a ver com o acervo de presentes do Presidente? Por que o magistrado acha que os presentes "talvez devessem" ser incorporados à Presidência? Por que ele quer se intrometer em tudo o que diz respeito a Lula? Por que tanto ódio ao ex-presidente operário? Ninguém precisa ser inteligente para perceber o seu incontido desejo de atingir o líder petista de qualquer jeito, para isso buscando qualquer coisa, até mesmo hipóteses, que possa justificar a sua prisão. Mais uma vez, por suas atitudes, fica evidente o objetivo principal da Operação Lava-Jato: eliminar Lula da vida pública, impedindo-o de voltar à Presidência da República. E aparentemente os seus perseguidores não descansarão enquanto não conseguirem alcançar esse objetivo, que é o objetivo dos que ambicionam o poder sem voto.

Constata-se que tudo é possível num país onde existe Poder Judiciário mas não existe Justiça, onde a hipocrisia e o cinismo fizeram morada, onde estupra-se a Constituição em nome da democracia, onde corruptos destituem uma Presidenta honesta, onde a imprensa deixou de ser informativa para ser partidária. Tem-se a impressão de que vivemos num país de faz-de-conta, onde vigora uma democracia de faz-de-conta, um Legislativo de faz-de-conta, um Judiciário de faz-de-conta, um Executivo de faz-de-conta, uma imprensa de faz-de-conta. Verdadeira, mesmo, só a Olimpíada, onde um presidente não comparece com medo de vaias, por ser ilegítimo. Assim mesmo ele ainda pretende, movido por sua vaidade, comparecer à reunião do G-20, onde por certo será isolado pelos demais chefes de Estado. E provavelmente ainda levará a tira-colo o chanceler trapalhão José Serra, que adotou uma diplomacia mastodonte para a política externa brasileira, criando inimizades, ao invés de estreitar amizades. Também, não se poderia esperar outra coisa de quem, nas eleições presidenciais em que concorreu, transformou em pedra uma bolinha de papel que lhe teria provocado "traumatismo craniano".

Num país onde o cinismo campeia, ninguém se surpreendeu com a declaração do senador Renan Calheiros, presidente do Senado, contestando a carta da presidenta Dilma Roussef , que pregou um plebiscito para que o povo decida sobre a realização de novas eleições. Na opinião dele, "plebiscito" e "novas eleições" não estão previstos na Constituição e, por isso, "não são bons para o Brasil". Perguntar não ofende: E o golpe, está previsto na Constituição? É bom para o Brasil? Acusado por Sergio Machado de receber propina, Renan também integra o time dos golpistas que quer tirar Dilma da Presidência. E ainda tem coragem de dizer, em artigo publicado aqui mesmo no 247, que "a instituição (o Senado) sai engrandecida desse episódio pela preservação dos mais sagrados valores democráticos do País". Engrandecida? Preservação de valores democráticos? Só mesmo na visão obliterada de um golpista. De qualquer modo, como o desfecho do golpe está próximo, só nos resta esperar o julgamento, onde pouco mais de 50 senadores poderão contrariar, sem nenhum peso na consciência, a vontade de 54 milhões de eleitores. O que virá depois é uma incógnita.

Ribamar Fonseca

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