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FREIOS DEFINIDOS
“Lava jato” não dá aval para juiz descumprir lei, diz desembargador do TRF-4
É no mínimo negligente o juiz que torna públicas conversas captadas entre investigados, inclusive envolvendo pessoas com prerrogativa de foro, pois o interesse público e a tentativa de evitar obstrução à Justiça não são motivos suficientes para permitir esse tipo de comportamento.
Assim entendeu o desembargador federal Rogério Favreto, o único membro da Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região a votar pela abertura de processo disciplinar contra o juiz Sergio Moro.
Na quinta-feira (22/9), o colegiado considerou que a operação “lava jato” não precisa seguir as regras processuais comuns, por enfrentar fatos novos ao Direito.
Por 13 votos a 1, a maioria considerou “incensurável” a conduta de Moro por ter divulgado conversa entre os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo o acórdão, as investigações apresentam “situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns”.
Ao assinar o voto divergente, Favreto declarou que “o Poder Judiciário deve deferência aos dispositivos legais e constitucionais, sobretudo naquilo em que consagram direitos e garantias fundamentais.”
“Sua não observância em domínio tão delicado como o Direito Penal, evocando a teoria do estado de exceção, pode ser temerária se feita por magistrado sem os mesmos compromissos democráticos do eminente relator e dos demais membros desta corte”, escreveu.
Para ele, Moro “foi no mínimo negligente quanto às consequências político-sociais de sua decisão”.
Favreto diz que o processo disciplinar seria necessário para analisar os atos do juiz, diante da “imparcialidade duvidosa do magistrado”, e porque divulgar o grampo indica afronta às previsões do Estatuto da Magistratura e do Código de Ética da Magistratura.
Enquanto a maioria da Corte Especial disse que a “orientação clara e segura a respeito dos limites do sigilo das comunicações telefônicas” só surgiu depois que oSupremo Tribunal Federal determinou a retirada das interceptações entre Lula e Dilma, o desembargador disse que a lei “veda expressamente a divulgação do teor de diálogos telefônicos interceptados”.
“Ante o regramento explícito, não cabe evocar o interesse público ou a prevenção de obstrução à justiça como fundamentos para publicizar conversas captadas”, diz Favreto.
Situação inédita
O relator, desembargador federal Rômulo Pizzolatti, não viu indício de infração disciplinar.
“É sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada operação ‘lava jato’, sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no Direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns.”
Já Favreto vê descumprimento à Resolução 59 do Conselho Nacional de Justiça.
“Não será permitido ao magistrado e ao servidor fornecer quaisquer informações, direta ou indiretamente, a terceiros ou a órgão de comunicação social, de elementos contidos em processos ou inquéritos sigilosos, sob pena de legislação nos termos da legislação pertinente”, determina o dispositivo.
O desembargador também ressaltou que o levantamento do sigilo dos áudios, alguns obtidos depois de uma decisão do próprio Moro que interrompia as gravações, foi feito sem o devido contraditório e teve “consequências sérias no cenário político brasileiro”.
“Cabe acentuar, ainda, que o levantamento do sigilo contemplou conversas que não guardam nenhuma relação com a investigação criminal, expondo à execração pública não apenas o investigado, mas também terceiras pessoas.”
Favreto também cita como motivo para divergir do resto da corte a decisão do Supremo, que considerou ilegal o levantamento do sigilo.
À época, o relator do caso na corte, ministro Teori Zavascki citou a incompetência do juízo da 13ª Vara Federal para analisar o material por haver ligação envolvendo a então presidente da República Dilma Rousseff.
“A divulgação pública das conversações telefônicas interceptadas, nas circunstâncias em que ocorreu, comprometeu o direito fundamental à garantia de sigilo, que tem assento constitucional […] A lei de regência (Lei 9.269/1996), além de vedar expressamente a divulgação de qualquer conversação interceptada (art. 8º), determina a inutilização das gravações que não interessem à investigação criminal (art. 9º). Não há como conceber, portanto, a divulgação pública das conversações do modo como se operou, especialmente daquelas que sequer têm relação com o objeto da investigação criminal”, argumentou Teori.
O desembargador divergente alegou que fatores externos ao processo podem ter influenciado na decisão de Moro, como “índole política”. Por isso ele considerou necessário abrir procedimento disciplinar.
Rogério Favreto reconheceu a importância das investigações sobre os desvios em contratos na Petrobras e a dedicação de Moro sobre o caso, mas ressaltou que fazer um bom trabalho não imuniza ninguém.
“Não pode o Poder Judiciário assumir postura persecutória. O Poder Judiciário ‘não é sócio do Ministério Público e, muito menos, membro da Polícia Federal’, bem anotou o Ministro Gilmar Mendes no precedente citado”.
Justificativa
Em resposta ao Supremo, Moro havia declarado que o ato de divulgar as conversas poderia “ser considerado incorreto”, mas disse que em nenhum momento teve objetivo de “gerar fato político-partidário, polêmicas ou conflitos, algo estranho à função jurisdicional”.
A intenção foi simplesmente, de acordo com o juiz, atender pedido do Ministério Público Federal e dar publicidade ao processo e “especialmente a condutas relevantes do ponto de vista jurídico e criminal do investigado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.
Numa ligação, Dilma disse que enviaria um “termo de posse” para o ex-presidente, que deveria ser usado “em caso de necessidade”.
O petista foi efetivamente nomeado chefe da Casa Civil dias depois, mas a posse foi suspensa pelo ministro Gilmar Mendes, do STF. Para ele, a medida tinha como objetivo apenas fazer com que eventual denúncia contra Lula fosse julgada pelo Supremo.
Moro também já autorizou grampo do escritório de Roberto Teixeira, advogado do ex-presidente, que conta com 25 profissionais, alegando que era preciso confirmar o nível de relação entre os dois, apesar de Teixeira advogar para Lula desde a década de 1980.
Depois, ele argumentou que soube do episódio apenas depois que a ConJur noticiou o fato. O juiz disse que a informação “não foi percebida pelo Juízo ou pela Secretaria do Juízo até as referidas notícias extravagantes”.
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