Fortuna maior do que a da Rainha da Inglaterra, um dos maiores assassinos do século 20 e dono de uma ilha paradisíaca; confira principais mitos que circulam na Internet.
Por Vanessa Martina Silva, do Opera Mundi
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A morte do líder da Revolução Cubana e ex-presidente de Cuba, Fidel Castro, gerou uma ampla comoção nas redes sociais. O fato tornou-se um elemento de mobilização apaixonada.
O problema é que boa parte das informações que mais circularam estão incorretas. De acordo com o levantamento feito pela página Monitor do Debate Político no Meio Digital, dos 10 posts mais compartilhados no Facebook sobre o evento, quatro são chamadas com fatos inverídicos no título e outra é uma piada do site Sensacionalista.
Outras cinco notícias são bastante parciais, publicadas por veículos à direita no espectro político. Por isso, Opera Mundi resolveu esclarecer algumas das informações incorretas mais difundidas e fez uma lista dos sete erros capitais de desinformação sobre o líder da Revolução Cubana. Veja a lista abaixo:
1. Fidel tem fortuna estimada em US$ 550 milhões. Seu patrimônio ultrapassa o da rainha da Inglaterra
De fato, o nome de Fidel Castro apareceu na relação das pessoas mais ricas do mundo por quase 10 anos, entre 1997 e 2006, num ranking da revista norte-americana Forbes. De acordo com a publicação, a fortuna do líder cubano seria, inclusive, maior do que a da rainha britânica Elizabeth. Fidel então, em 2006, desafiou a publicação: “Desafio que provem. E, se o provarem (…), renuncio ao cargo e às funções que estou desempenhando”. Ele fez o mesmo desafio ao então presidente George W. Bush, para que usasse as empresas e inteligência norte-americanas para provar que ele tinha US$ 1 que fosse.
A publicação não respondeu, o governo dos Estados Unidos tampouco e o nome do cubano foi retirado da lista nos anos subsequentes.
Mas de onde vêm esses números? A revista contava como sendo de Fidel as companhias de propriedade do Estado cubano. Em matéria publicada pela Folha de S.Paulo em 1997, a repórter Carleen Hawn explicou o “método” utilizado na contagem: “Tivemos de fazer uma estimativa”, justificou. “Não temos conhecimento exato do que Fidel Castro tem ou deixa de ter. Não sabemos, por exemplo, se ele tem conta na Suíça ou algo do gênero. Estimamos que 10% da economia cubana passa pelas mãos dele, uma estimativa até muito conservadora”. A própria repórter, à época, fez uma ressalva: o número não significa que esta seja a fortuna pessoal do presidente de Cuba, mas a que poderia, eventualmente, vir a ser.
2. Fidel, um dos maiores assassinos do século 20
De acordo com texto apócrifo que circula na internet, o número de pessoas mortas por fuzilamento e colocadas na conta de Fidel Castro teria sido 5.621, além de 1.163 assassinados extrajudiciais. A conta final entre combatentes de guerra e pessoas que tentaram fugir do país seria de 115.127 pessoas.
Mesmo o informe do grupo de direitos humanos crítico ao governo cubano Cuba Archive, divulgado há dois anos, indica que 7.634 pessoas morreram desde 1959, incluindo mortes e desaparecimentos em combate em países estrangeiros.
De acordo com o doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos Salim Lamrani, durante os primeiros meses de 1959, ano da Revolução, Ernesto “Che” Guevara era o encarregado dos tribunais revolucionários. Nesse período, cerca de 1.000 pessoas passaram pela “justiça expeditiva” e cerca de 500 foram fuziladas.
Se comparado ao ex-presidente dos Estados Unidos George W. Bush, somente na Guerra do Iraque, o saldo foi de 4.000 soldados norte-americanos mortos e 650 mil iraquianos que perderam a vida em decorrência da guerra, de acordo com um estudo realizado pela Universidade Johns Hopkins (EUA) e pela Universidade Al Mustansiriya (Iraque), em parceria com o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, EUA).
De fato, houve mortos em decorrência da Revolução Cubana, muitos deles torturadores e responsáveis por incontáveis crimes à época do ditador Fulgencio Batista. Esse número, entretanto, não permite colocar Fidel em qualquer lista dos maiores assassinos do século 20.
3. Fidel perseguia e executava dissidentes de forma sistemática
Embora os cúmplices da ditadura Batista tenham sido executados no paredão no início da Revolução, as penas capitais que se seguiram foram para crimes comuns.
A legislação cubana prevê pena de morte para crimes como traição; corrupção; homicídio qualificado; violação ou rapto de mulher; roubo executado com violência, além de ações de terrorismo, como incendiar prédios públicos e portar explosivos. Desde 2003, quando foram condenados com a pena capital os cubanos que sequestraram uma embarcação com passageiros para tentar fugir da ilha, não há mais execuções em Cuba – na prática, o país não adota mais a pena de morte, embora ela ainda esteja prevista no código penal.
Pessoas críticas ao governo, inclusive, trabalham com liberdade, como é o caso da blogueira Yoani Sánchez, que mantém sua atividade jornalística a partir da ilha, escrevendo para seu blog e para jornais de todo o mundo — embora relate dificuldades operacionais frequentemente (internet cara, por exemplo) – e o escritor Leonardo Padura, que viaja o mundo e expõe muitas críticas ao governo cubano em seus livros, entre eles o best seller “O homem que amava os cachorros”.
Yoani, no entanto, depois de voltar da Suíça, onde viveu dois anos, precisou esperar cinco anos até obter a autorização para viajar ao exterior, o que ocorreu com a reforma migratória de 2013, que permite a todos os cubanos deixar o país sem outra formalidade além da obtenção de um passaporte e um visto. Antes disso, ela teve os pedidos para sair do país negados diversas vezes.
4. Cuba é um país de miseráveis passando fome
A ideia de que o país socialista é composto por pessoas famintas e sem acesso a alimentação de qualidade é constantemente difundida nas redes.
No entanto, apesar de ser um país empobrecido, resultado, entre outros motivos, do bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos à ilha, não há indigência e o direito à alimentação satisfatória está assegurado de fato à quase totalidade do país.
De acordo com o Banco Mundial, o PIB de Cuba saltou de US$ 5,6 bilhões em 1970 para US$ 77,15 bilhões em 2013. Já o PIB per capita, que é o resultado da divisão do produto interno bruto pela quantidade de habitantes de um país, saltou de US$ 850 em 1972 para US$ 5.880 em 2011, superando o da Bolívia (US$ 3.080 em 2015) e o do Paraguai (US$ 4.220 em 2015). Considerando o PIB recalculado considerando a paridade de poder de compra, o número chega a US$ 10.200 em Cuba, valor próximo ao do Equador (US$ 11.300) e do Egito (US$ $11.800).
Além disso, Cuba é o único país de América Latina e Caribe que não apresenta o problema de desnutrição infantil severa, de acordo com o último relatório do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), de 2006, o que faz do país, mesmo após os anos do chamado “período especial” (a crise econômica posterior à queda da União Soviética), um cumpridor dos Objetivos do Milênio e das metas estabelecidas pela Cúpula Mundial da Alimentação.
5. Fidel era agente da CIA
Questionando as razões de os Estados Unidos não terem invadido Cuba para dar cabo de Fidel, como foi feito com Saddam Hussein no Iraque, e as razões de a prisão de Guantánamo ficar na ilha sem qualquer ataque dos comunistas a ela, há quem sustente que Fidel foi agente do órgão de inteligência norte-americano.
Talvez o fato de a CIA ter tentado mais de 600 vezes matar Fidel usando as mais diversas técnicas, como charuto explosivo ou caneta envenenada, responda essa questão, como mostra esse documentário do History Channel (em espanhol):
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