Nonato Menezes
Brotou do chão da fábrica. Foi forjado no conflito capital/trabalho e enredou-se, também, pelas organizações sociais.
Acolheu em seus quadros a pluralidade brasileira. Foi se pintando com a cara e as cores do Brasil real. Agasalhou granfinos e descamisados, religiosos e descrentes, empresários e agricultores, estudantes e professores, domésticas e pescadores. Como numa rede, nenhuma “categoria”, em maior o menor número, deixou de fazer parte desse evento político promissor, que se infiltrou na vida social como o sangue corre em nossas veias.
Essa façanha coube ao Partido dos Trabalhadores que surgiu na década de 80, quando a ditadura ainda não estava congelada. Mesmo com prisões, patrulhamentos, inibições de todos os matizes foi possível sorver e criar algo na vida política brasileira, que até então não havia surgido no período republicano.
Os demais partidos, pequenos e grandes, sem exceção, nasceram dos conchavos na madrugada ou dos arranjos perpetrados nos gabinetes refrigerados dos donos do poder.
Da UDN ao PCB, do PSD ao PSOL, todos nasceram de operação cesariana ou por inseminação, enquanto o PT emergiu das dores do parto normal.
O PT brotou no terreno da dificuldade, ora com pouca água, ora com excesso de sol, mas nasceu vibrando e vibrante, ao ponto de espalhar esperança em parte considerável da sociedade brasileira.
Cravou uma História que animou até maus espíritos. Mexeu nos brios da parte calejada e explorada da sociedade brasileira, daquela que produz, mas vive e sobrevive às margens das decisões mais comezinhas, até das que implicam em seus interesses mais próximos.
Foi dessa origem inquieta e iluminada que se abriram caminhos para a conquista do poder de Estado. Do mais simples Vereador do pequeno povoado ao cargo mais cobiçado por qualquer partido político: a Presidência da República.
Da base ao topo, o PT se espalhou por todo Brasil, num tempo histórico relativamente curto e de maneira tão intensa que as velhas oligarquias e novas plutocracias não tiveram como evitar e, então, os sempre donos do poder soçobraram à pujança de suas estratégias.
Das alianças necessárias aos acordos de conveniência. Dos Núcleos de Base às Organizações autônomas. Dos grupos de interesse às levas de necessitados. Parte considerável da população se viu abrindo o caminho da luta por direitos represados, como à terra, por exemplo.
Hoje há críticas fundadas e ódio, mas uma coisa é certa: ninguém tem como negar essas virtudes do Partido dos Trabalhadores. Impossível esconder o seu passado, que em três décadas chacoalhou o berço das elites nacionais e construiu em nossa História um dos mais importantes capítulos da vida política brasileira.
Mas o PT abandonou a mais promissora de suas estratégicas. Deixou para trás os Núcleos de Base, o caminho mais propício para o enraizamento social. Foi uma opção desastrosa de um Partido que nasceu na Base e se fez na sofreguidão dos conflitos sociais.
Os Núcleos nasceram espontaneamente, pois não faziam parte formal da estrutura partidária. Foram grupos criados nos bairros, com certa afinidade, para fazer análise da conjuntura e discutir sobre temas diversos.
Pedagogicamente os Núcleos foram instâncias políticas interessantes, mas se tornaram estéreis por falta de vinculação com o poder de Estado. Também, não tinham como propósito uma produção intelectual como resultado dos debates e ou de pesquisas, quando existiam. Por isto o desaparecimento dos Núcleos de Base foi precoce e sequer serviu de aprendizado. Uma pena! Justamente numa sociedade carente de iniciativas que ajudem a compreender nossos fracassos, que nos dê forças para superação da nossa sossegada ignorância política e, mais que tudo, seja capaz de por fim à vilania de nossas (anti)elites.
Os quadros dirigentes do Partido não perceberam ou não deram importância aos Núcleos porque direcionaram suas atenções apenas para conquista do Poder Executivo. E foi nessa direção que o PT teve um encontro com o Céu e com o Inferno nesses anos de Poder. Agora o Partido sofre com a ausência do enraizamento social e por isso perdeu quase a metade do apoio popular que teve em seu momento áureo.
O PT, regra geral, foi diferente nos seus primórdios, mas no percurso abandonou uma de suas ideias de origem e passou a repetir a ladainha dos nossos partidos tradicionais.
Foi isso que resultou na vulnerabilidade em que o Partido se meteu, tanto que já surgiu a necessidade de reconstrução.
Então, que perdas o Partido dos Trabalhadores teve ao abandonar os Núcleos de Base?
Primeiro por ter direcionado suas atenções, basicamente, para a conquista do Poder Executivo, como já foi dito. Isso deixou ao desprezo a possibilidade de ter consigo permanentemente a voz das bases. Embora a ideia do Orçamento Participativo tenha sido bem aceita em alguns Municípios, ela não produziu o enraizamento social necessário, nem criou base de sustentação do Partido em nível nacional.
Segundo, que a estratégia seria vincular os Núcleos às ações dos Legisladores, sobretudo os municipais. Este seria o melhor caminho para o enraizamento social necessário.
A dinâmica se daria mais ou menos assim: o vereador articularia a formação dos Núcleos, segundo suas condições de participar regularmente dos debates.
Uma proposta, digamos, sobre saneamento a ser apresentado na Câmara. Cada Núcleo apresentaria um pré-projeto a ser discutido num encontro de todos os Núcleos, para daí sair um, dois ou mais projetos a serem apresentados pelo Vereador nas articulações e votações na Câmara.
A própria origem do projeto daria força para sua aprovação; diferentemente dos apresentados da maneira convencional, forjados nos gabinetes e quase sempre em benefício de um ou mais vereadores ou de grupos de pressão.
Além disso, no decorrer dos quatro anos de mandato com participação dos Núcleos, uma ou mais candidaturas seriam construídas no decorrer do período, além do próprio vereador, a concorrerem no pleito seguinte.
Importância provável dessa estratégia.
Primeiro, a participação sendo motivada por questões objetivas, com possíveis resultados construídos pela própria comunidade.
Segundo, que os interesses defendidos nos projetos seriam bem mais amplos, além de haver verdadeira preparação política de futuros vereadores.
Terceiro, a tendência em ampliar a politização da sociedade, considerando-se o Núcleo como ponto de convergência dos interesses da população.
Houvesse sido adotada uma estratégia dessa, desde as primeiras eleições que o PT participou, dificilmente o Partido teria perdido 2.377 vereados na última eleição, comparada ao pleito de 2012. E provavelmente teria havido crescimento progressivo em número de eleitos, com substancial influência nos Legislativos estaduais e federais e inevitável pressão sobre os Executivos Municipais.
Não parece um cálculo difícil de ter sido feito, nem uma estratégia complexa de ter sido adotada, justo para um Partido que nasceu na Base e que naturalmente teve adesão de setores significativos da sociedade aos seus projetos de poder.
vou tentar em São João.
ResponderExcluirTentou?
ResponderExcluirNão tentou! Achou difícil.
ResponderExcluir