quinta-feira, 11 de maio de 2017

Como Carl Schmitt, teórico do nazismo, pode explicar a decisão que fechou o Instituto Lula

Como Carl Schmitt, teórico do nazismo, pode explicar a decisão que fechou o Instituto Lula
    Foto: Reprodução

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Já vai longe a queda de braço entre duas teorias jurídicas e seus dois grandes teóricos. O normativismo de Hans Kelsen e o decisionismo de Carl Schmitt. Em síntese, poderia-se dizer que o normativismo impõe uma derrota à racionalidade buscada pelo Direito Natural, ao afirmar que só haveria uma espécie de lei, a lei positiva, posta pelo Estado, que deveria governar este e os cidadãos, concluindo que haveria tão somente uma “ordem jurídica normativa”. E a partir daí, se poderia falar legitimamente de uma Teoria Pura do Direito.

Doutro giro, para Schmitt, as coisas não se davam bem assim. Para ele, Kelsen escamoteava o pressuposto de qualquer norma jurídica, que é a decisão, ou seja, haveria uma verdadeira subordinação do normativo ao elemento decisionista, presente no Direito, dado que a Teoria Pura do Direito, “esquece ou finge esquecer” “que uma norma não saberia produzir, por si própria, as condições de sua efetuação”, ou melhor, “ignorando, ou fingindo ignorar” que “a ideia do direito não pode efetuar-se por si mesma”.

É sobre o que restou das pedras desta disputa que se encaixa a decisão do Juiz da 10ª Vara Federal de Brasília, Ricardo Augusto Soares Leite, que suspendeu as atividades do Instituto Lula. Ao decidir de forma açodada, procurando o timing perfeito entre o conteúdo de sua decisão e os acontecimentos de hoje em Curitiba, o nobre magistrado deu razão à Schmitt, no tocante a desvelar o elemento decisionista que descola totalmente das normas jurídicas que governam o caso.

Percebe-se que a única motivação plausível da suspensão das atividades do Instituto Lula neste momento é acirrar os ânimos e jogar mais lenha na fogueira política, atraindo a atenção da opinião pública e procurando corroborar com a tese de que de um lado está o bem e do outro o mal, e que a magistratura está fazendo seu papel na defesa do bem.

Se na obra de Kelsen este não quis entrar diretamente no assunto interpretação jurídica, dado que sabia que estava pisando em espinhos, foi, pois, o jurista do Reich que colocou o dedo na ferida e disse que decisões judiciais possuem um componente que pode fugir ao estabelecido na norma jurídica. Hoje se sabe que nem Kelsen e nem Schmitt diziam toda a verdade, e que não há a mínima possibilidade de uma Teoria Pura do Direito, tendo presente que o indivíduo interpreta as normas jurídicas em razão de sua posição e inserção no mundo, com seus valores, suas histórias de vida, suas pré-compreensões; e que, de outro lado, não se pode validar uma ideia pura de decisionismo, uma vez que a norma jurídica também governa a realidade, que a vontade do produtor da decisão está limitada por esta norma jurídica.

Contudo, com a decisão do Juiz Ricardo Leite, percebemos que mesmo em 2017, as linhas postas por Carl Schmitt na sua “Teologia Política” em 1922, estão mais vivas que nunca. O problema não é somente este, é ver parcela do mundo jurídico comemorar este tipo de decisão. Foi assim que um certo grupo começou o Terceiro Reich.

Rogério Marcos de Jesus Santos é pós graduado em Direito Público pela UnB, Direito Constitucional e Tributário. Advogado da União. 

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