Mossul, a segunda cidade do Iraque, palco de violentos combates contra o grupo Estado Islâmico (EI). AHMAD AL-RUBAYE / AFP
O Iraque afirma necessitar de US$ 100 bilhões para sua reconstrução, após a retomada dos territórios ocupados pelos jihadistas do grupo Estado Islâmico (EI), de 2014 a 2017. O Kuwait organiza a partir desta segunda-feira (12) uma conferência internacional com doadores em potencial, com a participação do Banco Mundial, numa tentativa de recolher fundos para a iniciativa. Sobre a reconstrução do Iraque pairam as incertezas políticas do país, que realiza eleições legislativas em maio de 2018.
Nicolas Falez, Sami Boukhelifa e Oriane Verdier, da RFI
Em dezembro de 2017, o Iraque proclamou "o fim da guerra" contra o grupo Estado Islâmico (EI). Mas as áreas devastadas pelos combates ainda lutam para se recuperar. É o caso de Mossul, a segunda maior cidade do país, reconquistada pelo exército nacional e a coalizão internacional, em julho de 2017. "Não existe um projeto de reconstrução a oeste de Mossul. Não há água nem eletricidade. Na velha cidade, ainda existem cadáveres sob os escombros", disse Nibras Moayid, morador da cidade, em entrevista à RFI.
Morador da parte ocidental de Mossul, a mais atingida pela guerra, Moayid contesta as autoridades de seu país. "Eles fazem declarações oficiais e dizem que realizarão tal e tal projeto. Mas isso está errado! A realidade é que os funcionários estão desviando fundos públicos e não há sombra de um projeto de reconstrução”, denuncia o iraquiano.
As mesmas reclamações são ouvidas em Tikrit, na província iraquiana de Salaheddi, visitada pelo enviado da RFI, Oriane Verdier. “As pessoas aqui estão sofrendo muito com a falta de hospital e serviços", declarou um membro do conselho municipal. "As mulheres grávidas morrem por falta de maternidades de qualidade. A poluição da água também é um problema. Precisamos de dinheiro para resolver tudo isso. Mas o ministério da Saúde nos enviou apenas medicamentos básicos como analgésicos ", lamentou o funcionário.
"A reconstrução do país está parada, nunca começou", confirmou o pesquisador Arthur Quesnay, doutorando na Universidade Paris I Panthéon-Sorbonne, que descreve "serviços públicos degradantes, hospitais que oferecem cuidados de baixa qualidade e um sistema educacional amplamente negligenciado". Quinze anos após a invasão dos EUA e o estabelecimento de um novo regime no Iraque, a classe dominante do país é constantemente criticada por sua ineficiência, sendo muitas vezes acusada de corrupção. "A classe dominante iraquiana não se reformou após a guerra contra o EI. A população realmente não tem instituições a quem recorrer. Atualmente, muitas manifestações estão ocorrendo no Iraque para protestar contra a ausência do Estado ", diz o especialista iraquiano.
Um teste para Bagdá
É neste contexto que nesta segunda-feira, no Kuwait, foi aberta uma conferência internacional de três dias para a reconstrução do Iraque. Bagdá estima que suas necessidades totalizam US$ 100 bilhões e afirma não poder contar com os recursos do petróleo para financiar os trabalhos necessários. As autoridades iraquianas afirmam que esperam doadores do setor privado para reconstruir o país. "Eu vim para trazer o apoio da França e para acompanhá-los. Nós sempre estaremos aqui. Estivemos envolvidos na coalizão e também estaremos presentes na fase de reconstrução", disse o chanceler francês, Jean-Yves Le Drian, em Bagdá.
O momento é um teste para o Iraque, cuja estabilidade continua ameaçada pela fragmentação entre as comunidades. Os últimos meses foram marcados por confrontos entre Bagdá e o Curdistão autônomo iraquiano. E as tensões entre a minoria sunita e a maioria iraquiana do Iraque persistem, além de terem servido de base para o rápido aumento da influência do grupo Estado Islâmico em 2014. O sentimento de exclusão e a marginalização dos sunitas iraquianos facilitaram o progresso da organização jihadista.
Legislativas em maio
As eleições legislativas estão programadas para o mês de maio no Iraque. O pleito poderá ser marcado pela aparição de novos atores na cena política, como os membros das milícias xiitas paramilitares, que lutaram contra o EI. Essas milícias, agrupadas sob a bandeira da "mobilização popular" ("Hached al-Chaabi"), apresentam candidatos para as eleições legislativas.
Os milicianos reivindicam um pagamento “pelo martírio", ou seja, pelos homens mortos durante os violentos combates. Eles se apresentam normalmente em localidades onde beneficiam de um forte apelo social. “Podemos vê-los chegar ao Parlamento", diz o especialista Arthur Quesnay. “Novos rostos, mas pouca mudança de perspectiva. Nós ouvimos as mesmas promessas desses candidatos da milícia, especialmente sobre a luta contra a corrupção”, diz Quesnay, “mas, finalmente, nada muda e a situação piorou", concluiu.
O primeiro-ministro Haider al-Abadi considerou uma possível aliança política com esses milicianos xiitas, visando as eleições legislativas de maio. No entanto, ambas as partes optaram por concorrerem em listas eleitorais separadas.
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