POR FERNANDO BRITO
Sérgio Moro veio com a explicação para o recebimento indevido – sim, indevido, porque não se trata de indenização por gasto em moradia – do auxílio que ele recebe para morar em apartamento próprio.
— O auxílio-moradia é pago indistintamente a todos os magistrados e, embora discutível, compensa a falta de reajuste dos vencimentos desde 1 de janeiro de 2015 e que, pela lei, deveriam ser anualmente reajustados — disse ele a O Globo.
Modus in rebus, excelência, como se diz no fórum, citando os versos do romano Horácio em suas Sátiras. Moderação nas coisas.
Primeiro, o auxílio não é “pago indistintamente a todos os magistrados”, mas apenas aos que o requerem, declarando que não possuem cônjuge com o mesmo benefício e comprometendo-se a informar o tribunal se isso vier a ocorrer. Está bem escritinho lá na Resolução 199 do Conselho Nacional de Justiça.
Não lhe caiu na conta, portanto: o senhor o pediu e pediu sabendo que não merece receber indenização por moradia por ter moradia própria e, portanto, não ter despesa locatícia com ela.
Se o fato de ficar sem reajuste fosse motivo para pagar vantagens indevidas, os professores, os médicos, os humildes faxineiros do serviço público também deveriam recebê-los, porque muitos estão sem reajuste faz tempo.
E na iniciativa privada, se o patrão não dá aumento, será que podemos pegar do caixa da firma o que achamos ser justo?
Quem sabe devêssemos dizer: “trabalhadores explorados, pegai o que acham merecer”
Recorde-se, Dr. Moro, que o caso dos senhores é julgado por seus pares, igualmente potenciais beneficiários da mesma vantagem.
Não, Doutor, essa vantagem não é moral, não é legal.
É indevida, porque não está prevista, como se demonstrou aqui, em lei alguma, mas apenas por uma decisão de um ministro do Supremo que torceu a disposição excepcional da Lei Orgânica da Magistratura para concluir não só que todo e qualquer juiz teria direito a uma “residência oficial” quanto para entender como aluguel ou hospedagem a moradia em imóvel próprio.
O senhor, que condenou Lula por uma vantagem indevida que ele não recebeu, ou da qual há qualquer prova de que solicitou, recebe vantagem que sabe ser indevida e que, ao contrário do ex-presidente, solicitou expressamente.
A sua justificativa é tão pífia quanto aquela do ex-presidente do TJ-SP, que declarou que, sem reajuste, os juízes precisavam do auxílio para comprar ternos, porque “não se pode toda hora ir a Miami”. O senhor não lembra? Está aqui.
Os versos do poeta Horácio, excelência, continua: “sunt certi denique fines, quos ultra citraque nequit consistere rectum”.Livremente, “há certos limites dos quais não se pode passar sem perder a retidão.”
Seria bom que o senhor e seus colegas lessem o velho poeta, que nesta Sátira ataca a ambição, perguntando se, se te basta um copo, porque tentar beber o rio inteiro?
E o copo dos juízes, neste Brasil sedento, já é um barril.
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