Porto de Paranaguá, no Paraná. APPA ANPR
HELOÍSA MENDONÇA / São Paulo
Estudo da entidade afirma que, se o país reduzisse barreiras ao comércio, aumentaria produtividade e seria possível tirar quase seis milhões de pessoas da pobreza
O Brasil começa 2018 com uma economia que se recupera pouco a pouco da mais profunda recessão das últimas décadas. Para muitos brasileiros, a retomada, no entanto, ainda não se materializou em mais e melhores empregosou em rendimentos mais elevados. De acordo com o Banco Mundial, para que isso aconteça, o país precisa ainda melhorar drasticamente o seu desempenho em termos de produtividade. Segundo o banco, o Brasil poderia crescer cerca de 4,5% ao ano se aumentasse a taxa de produtividade para o nível registrado nos anos de 1960 e 1970. Um estudo da instituição financeira alerta que no coração da baixa produtividade brasileira está um sistema que reduz a concorrência e a inovação e induz a má-alocação de recursos entre empresas.
Se o país quiser mudar esse quadro, terá que considerar uma série de prioridades. A primeira delas, segundo o banco, é uma maior abertura de mercado e reforma das regulamentações empresariais visando aumentar a concorrência. Apesar de suas proporções, o Brasil continua sendo uma das economias mais fechadas do mundo. Também seria necessária promover uma reforma tributária abrangente. A instituição ressalta ainda que é preciso acabar com os subsídios ineficazes às empresas e destinar esses recursos para inovação e apoio aos trabalhadores. Só em 2015, as políticas desses subsídios corresponderam a 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o valor gasto foi 9 vezes maior do que o usado no Bolsa Família.
O relatório Emprego e Crescimento: A Agenda da Produtividade, publicado nesta quarta-feira, sugere ainda que a negociação de novos acordos comerciais preferenciais poderiam ajudar no esforço de reformas. Segundo o banco, se o Brasil reduzisse suas barreiras ao comércio - dentro de reformas coordenadas dentro do Mercosul - poderia ser possível tirar quase seis milhões de pessoas da pobreza e criar mais de 400.000 empregos.
Uma das propostas citadas pela entidade é a de que cada membro do Mercosul reduza sua tarifa em 50% para países fora do bloco. Já as medidas não-tarifárias também precisariam ser simplificadas entre os membros do Mercosul e os impostos de exportação seriam eliminados em ambas partes. O estudo calcula que, com as reformas, o Brasil teria um crescimento de 7% e 6,6% nas exportações e importações, respectivamente, e um aumento permanente do PIB em cerca de 1%. As reduções de tarifas e de barreiras não tarifárias sobre importações aumentariam também, segundo o relatório, os rendimentos reais das famílias, inclusive entre os 40% mais pobres da população, por meio de preços mais baixos para o consumidor e mais empregos com salários mais elevados. Reduzir o custo do comércio poderia melhorar ainda, segundo o banco, a concorrência entre produtores nacionais, abrir o acesso a mercados externos maiores, permitindo ganhos de escala, além de facilitar o acesso a novas tecnologias.
Os fluxos comerciais do Brasil representaram menos de um terço do PIB em 2015, fazendo do país o menos aberto entre as grandes economias mundiais. A abertura comercial limitada reflete uma posição de política altamente intervencionista e protetora, segundo o banco, trazendo prejuízos diretos para a produtividade no Brasil, limitando a exposição à concorrência internacional e desacelerando a aquisição de novos conhecimentos e tecnologias modernas. O relatório destaca também que para os benefícios da integração às redes globais de comércio serem ampliados é preciso que eles sejam acompanhados pela integração dos mercados nacionais de produtos. "A falta de integração no mercado interno limita o grau de concorrência entre fornecedores domésticos e exportadores e reduz os vínculos da abertura com o comércio internacional e investimentos", diz o texto do relatório.
"A abertura comercial, por exemplo, que o [Fernando] Collor fez teve um impacto muito grande na pobreza, pois o impacto foi maior nos maior pobres com a redução do preço dos produtos que eles consumiam. O Brasil não completou essa abertura comercial", disse a jornalistas o diretor do Banco Mundial para o Brasil, Martin Raiser.
Guinada protecionista dos EUA
As sugestões de abertura do mercado chegam em um momento que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, começa a colocar em prática uma política protecionista em seu país, com impactos globais. Na semana passada, ele anunciou que irá impor uma nova tarifa global de 25% para a importação de aço e de 10% para o alumínio comprado de vários países.
A notícia desagradou os produtores de aço que já começam planejar represálias diante da guerra comercial declarada. A Europa, segundo maior exportador do material aos Estados Unidos, alertou que adotará medidas nos próximos dias contra uma lista de produtos norte-americanos se as ameaças feitas por Trump se concretizarem. A China, o maior produtor mundial, avisou que essa estratégia prejudicará o comércio internacional. O Governo brasileiro recebeu a notícia com "enorme preocupação". Caso confirmada, "a restrição comercial afetará exportações brasileiras de ambos setores", informou o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), em comunicado
Segundo Raiser , ainda que os Estados Unidos deixe seu posto de motor da abertura econômica e da globalização, novas alianças irão surgir e o Brasil deve aproveitar essa oportunidade. "O quadro global está mudando, não necessariamente será focado nos EUA", disse.
Para Gabriel Kohlmann, gerente de projetos da Consultoria Prospectiva, há um relativo consenso que o resultado dos incentivos as empresas e a proteção à indústria nacional ficou aquém do esperado nos últimos anos. "Independentemente das sugestões de entidades internacionais ou da nova política protecionista de Trump, o Brasil vem sentido a necessidade da abertura do mercado. Esse discurso foi capitaneado pelo Henrique Meirelles e já há um embate de quem é contra e a favor dessa política", explica.
Ainda que as medidas de Trump, caso concretizadas, possam estourar uma guerra comercial global, o professor de relações internacionais Oliver Stunkel, da FGV, acredita que o impacto é menor hoje do que seria no passado. "A atuação dos EUA vai contra uma corrente que tem predominado desde o ano 90, de globalização e maior competição. Mas o protecionismo atual americano deve impactar menos do que se essa medida tivesse sido tomada há 10 anos. Hoje quem é o principal parceiro comercial do Brasil? A China. E ela vai defender essa ordem", pondera Oliver Stunkel, professor da FGV.
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