terça-feira, 13 de março de 2018

SAUDADES DA DITADURA NA CÂMARA DISTRITAL



Nonato Menezes

É de notar o quanto nossos deputados distritais estão preocupados e envolvidos com os problemas nacionais e com os que afligem, dia a dia, a população do Distrito Federal.

No cenário nacional, a aura é de inquietação e medo. Dia vem, dia passa e a crise parece que só se renova. E não faltam elementos para o bom debate, para uma boa luta em defesa de princípios tão caros à sociedade brasileira como distribuição de renda, educação e saúde públicas, liberdade e democracia, entre muitos outros.

No Distrito Federal, bis! Já sobra até desilusão de quem, um dia, se deixou pensar que aqui seria o paraíso.

Paraíso sim, mas de convergência de problemas. O que se encontra Brasil afora, temos no Distrito Federal há 58 anos, sendo que as esperanças são as mesmas, soluções a se perderem no tempo.

Nada disso, porém, parece inquietar nossos representantes locais. Sequer podemos imaginar que faz parte de suas preocupações. Oxalá fosse, seria um luxo!

Mas nem tudo está perdido. Pois tomados de saudades da Ditadura que estão, nossos deputados resolveram retomar criações exclusivas daquele momento, assim como criar novas que nem mesmo os ditadores ousaram instituir.

Uma das novidades foi a aprovação da Lei nº 5.699, de 23 de agosto de 2016, que propunha patrulhar descaradamente a atividade docente, cuja ementa reveladora está aqui: “Dispõe sobre a afixação nas salas de aula dos estabelecimentos públicos e particulares de ensino do Distrito Federal, de aviso contendo o número do telefone do Disque-Denúncia contra qualquer tipo de violência, abuso ou assédio sexual cometido contra menores de idade”.

Como todos sambem, Educação Moral e Cívica – EMC foi uma disciplina criada e ministrada durante o regime militar e fazia parte do núcleo comum do currículo do Ensino Básico. Seu conteúdo era destinado à exaltação do regime, e enfatizava o “lado romântico” daqueles governos que torturaram e mataram centenas de pessoas nos vinte e um anos de terror.

A Lei nº 6.122, de 1º de março de 2018, promulgada recentemente, resgata a ideia, extinta em 1993, pela Lei nº 8.663, de 14 de junho de 1993. Sua ementa, a da lei distrital em tela, propõe o seguinte: “Dispõe sobre a inclusão do tema educação moral e cívica como conteúdo transversal no currículo das redes pública e privada de ensino do Distrito Federal e dá outras providências”.

Uma leitura nos dois textos legais demonstra não ser tão sutil a diferença entre a proposta do deputado, promulgada pela Câmara Distrital e a daquela Câmara que serviu à ditadura. Talvez para disfarçar a intenção, o autor a sugere, não como disciplina, mas como tema transversal, com conteúdo a compor o currículo do Ensino Básico do Distrito Federal.

Se o intuito do legislador é de entusiasmar o espírito estudantil com o civismo, tornando-o respeitador dos valores de uma sociedade autoritária, ainda presa às correntes da escravidão. Se seu objetivo é o de fazer com que nossa juventude respeite nossas instituições viciadas e repletas de parasitas, útil seria propor algo que a livrasse do embotamento político e viesse a identificar a escola como agência irradiadora de princípios democráticos e voltada para a discussão sobre nossas mazelas, inclusive, as mesmas que são toleradas na Câmara Distrital e reproduzidas em suas práticas e pensamentos.

Agora, se a verdadeira intenção do deputado é que esse conteúdo ajude a desenvolver o patriotismo dos nossos estudantes, que tal aprovar uma lei que crie um uniforme padrão, em verde e amarelo, que sirva até de homenagem à parte dos brasileiros que, de tão patriotas foram à rua defender o “cívico golpe” de 2016.

Tem patriotismo mais escancarado que esse?

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