sexta-feira, 11 de maio de 2018

Bolsonaro é herdeiro de Geisel e Figueiredo



A gente achava, naquele tempo, que assassino era o Médici. E era. Me sequestraram em minha casa às 6 da manhã do dia 4 de setembro de 1973. Eu estava de pijama. Os meganhas, apontando metralhadoras, em roupas civis. "Hitler não completou o serviço com vocês", me disseram. Sabiam que eu era judeu.

Me deixaram 45 dias encarcerado no DOI-Codi sem me acusar de nada. Não davam explicações. Tive a pachorra de perguntar ao Brilhante Ustra, que me conduziu ao X-5, onde fiquei "hospedado" porque me prenderam.

"Você é o Hippie da AP", respondeu ele.

"Não sou", retruquei.

"Nós vamos provar que é".

Não provaram nada. Nenhum dos presos – militantes de grupos armados ou desarmados contra a ditadura – me reconheceu. Eu era um estranho no ninho.

Estávamos dentro de um presídio do II Exército, comandado pelo general Milton Tavares de Souza, que voltou ao noticiário ontem.

No documento da CIA é ele quem revela ao então ditador, general Ernesto Geisel e ao seu chefe do SNI e futuro sucessor, João Figueiredo os números de oposicionistas executados em 1973: 104. Também é quem recomenda ao recém-empossado general que a política de execuções deve continuar. Geisel concorda, com uma ressalva. Executar só os perigosos, e só com autorização expressa dele ou de Figueiredo.

Naquele setembro de 1973 eu já sabia que a tortura e as execuções eram parte da política de estado. Oficiais do exército, com seus uniformes verde-oliva visitavam minha cadeia. Não era um lugar clandestino.

Mas só agora ficamos sabendo por meio da CIA que não só Médici, mas também Geisel e Figueiredo foram assassinos. Ninguém nos tinha revelado essa monstruosidade, não estava em documentos brasileiros. A CIA sabe mais sobre nós do que nós mesmos.

Não sei se episódios como esse foram registrados em documentos oficiais brasileiros e se eles foram queimados – como alegam os militares – ou se continuam escondidos, impedindo os brasileiros de conhecerem a sua própria história.

Esse foi o grande erro da redemocratização. Não mexeu nas feridas. Não mostrou todas as vísceras da ditadura, tal como a Alemanha fez em relação ao nazismo.

A anistia, que deveria perdoar somente os crimes, acabou ocultando tudo. Nós preferimos varrer as nossas mazelas para debaixo do tapete.

As novas gerações, que não sabem o que aconteceu, correm o risco de repetir, devido à ignorância, os erros do passado. Não sabem quem foi Médici, quem foi Geisel, quem foi Figueiredo, e o que fizeram a brasileiros jovens e belos.

Muitos deles não conseguem enxergar quem é Bolsonaro. E que ele é o herdeiro direto desses ditadores assassinos.

Alex Solnik

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