quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Sanções, sanções, sanções - O estertor final da hegemonia do dólar?

por Peter Koenig [*]
https://www.resistir.info/


Sanções para a esquerda e sanções para a direita. Financeiras principalmente, impostos, tarifas, vistos de entrada, proibições de viagens, confisco de activos no estrangeiro, proibições e limitações de importação e exportação, sanções e punições também para aqueles que não respeitam as sanções impostas por Trump, aliás pelos EUA, contra amigos de seus inimigos. O absurdo parece interminável e crescente, como se houvesse uma data fatal para o colapso do mundo. Parece ser um último esforço para derrubar o comércio internacional em favor de – o quê? – "Make America Great Again" ? Preparar-se para as eleições intercalares dos EUA? Reunir as pessoas atrás de uma ilusão? O quê então? 

Tudo parece arbitrário e destrutivo. Tudo obvia e totalmente ilegal por qualquer lei internacional ou, esqueça a lei, que de qualquer modo não é respeitada pelo império e seus vassalos, mas nem mesmo pelos padrões morais humanos. As sanções são destrutivas. Elas estão a interferir na soberania de outros países. São feitas para punir países, nações, que se recusam a submeter-se a uma ditadura mundial. 

Parece que toda agente aceita esta nova guerra económica como o novo normal. Ninguém objecta. E as Nações Unidas, o corpo criado para manter a paz, para proteger o nosso mundo de outras guerras, para defender os direitos humanos, este mesmo corpo está silenciosa – por medo? Medo de ser "sancionada" ao esquecimento pelo império moribundo? Por que não pode a grande maioria dos países – muitas vezes é uma proporção de 191 contra 2 (Israel e EUA) – dominar os criminosos? 

Imagine-se a Turquia, de súbito tarifas enormes sobre o alumínio (20%) e o aço (50%) impostas por Trump, além da interferência sobre a moeda do banco central que fez a Lira turca cair 40%, e isso “apenas” porque Erdogan não liberta o pastor Andrew Brunson, que enfrenta na Turquia uma sentença de 35 anos de prisão por "terror e espionagem". Um tribunal de Izmir acaba de recusar outro pedido de clemência dos EUA, convertendo no entanto a sua sentença de prisão em prisão domiciliária por motivos de saúde. Há a plena convicção que os supostos 23 anos de "trabalho missionário" do Sr. Brunson foram apenas uma cortina de fumo para espionagem. 

O presidente Erdogan acaba de declarar que vai procurar novos amigos, incluindo novos parceiros comerciais no leste – Rússia, China, Irão, Ucrânia, até na inviável União Europeia, e que seu país planeia emitir certificados financeiros denominados em Yuan para diversificar a economia da Turquia, em primeiro lugar as reservas do país, gradualmente afastando-se da hegemonia do dólar. 

Procurar novos amigos, também pode incluir novas alianças militares. Estará a Turquia a planear sair da NATO? Poderá a Turquia ser "autorizada" a sair da NATO dada a sua posição estratégica marítima e terrestre entre o leste e o oeste? A Turquia sabe que ter aliados militares que aplicam sanções por agir soberanamente em assuntos internos significa um desastre para o futuro. Por quê continuar então a oferecer seu país à NATO, cujo único objetivo é destruir o leste – o próprio leste, que não é apenas o futuro da Turquia, mas do mundo? A Turquia já está a aproximar-se da SCO (Organização de Cooperação de Xangai) e pode realmente aderir a ela num futuro previsível. Isto poderá ser o fim da aliança da Turquia com a NATO. 

E se o Irão, Venezuela, Rússia, China – e muitos outros países que não se dispõem a curvar-se ao império – prendessem todos os espiões das embaixadas dos EUA ou camuflados nas instituições financeiras nacionais desses países, a actuarem como Quintas Colunas, minando políticas nacionais e económicas dos seus países de acolhimento? Cidades inteiras de novas prisões teriam que ser construídas para acomodar o exército de criminosos do império. 

Imagine-se a Rússia – mais sanções foram impostas apenas pelo alegado e totalmente não comprovado (pelo contrário, refutado) envenenamento russo de quatro cidadãos do Reino Unido com o agente nervoso mortal, Novichok e por não admitir isso. Trata-se de uma farsa total, uma mentira flagrante, que se tornou tão ridícula que a maioria das pessoas que pensam, mesmo no Reino Unido, apenas riem disso. No entanto, Trump e seus pigmeus na Europa e em muitas partes do mundo sucumbem a essa mentira e por medo de serem sancionados, também sancionam a Rússia. O que se tornou o mundo? 

O ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbels, ficaria orgulhoso por ter ensinado a importante lição aos mentirosos do universo: "Deixem-me controlar os media e vou transformar qualquer nação numa vara de porcos". Nisto é o que nos tornámos – uma vara de porcos. 

Felizmente, a Rússia também já se afastou tanto da economia controlada pelo dólar que tais sanções não mais a afectam. Elas servem Trump e aos seus capangas como meras ferramentas de propaganda para exibicionismo: "ainda somos os maiores!" 

Na Venezuela, alimentos importados, produtos farmacêuticos e outros bens estão sendo desviados nas fronteiras e em outros pontos de entrada, de modo que nunca chegarão às prateleiras dos supermercados – tornam-se mercadorias clandestinas na Colômbia, onde esses produtos são vendidos a taxas manipuladas de dólar de que tiram proveito cidadãos venezuelanos e colombianos. 

Estes gangs de tipo mafioso são financiados pelo NED (National Endowment for Democracy) e outras “ONG” financiadas pelo Departamento de Estado, treinadas pelos serviços secretos dos Estados Unidos, dentro ou fora da Venezuela. Uma vez infiltrados na Venezuela – aberta ou secretamente – eles tendem a boicotar a economia local, espalhar a violência e tornarem-se parte da Quinta Coluna, principalmente sabotando o sistema financeiro. 

A Venezuela que tem pessoas sofrendo, está lutando para sair deste dilema, tirando a sua economia do dólar, em parte através de uma criptomoeda recém-criada, o Petro, baseado nas enormes reservas de petróleo do país e também através de um novo Bolívar na esperança de colocar um freio às crescentes explosões de inflação. Esse cenário lembra muito o Chile em 1973, quando Henry Kissinger era secretário de Estado (1973-1977) e inspirou o golpe da CIA, fazendo “desaparecer” alimentos e outros bens dos mercados chilenos, assassinando o presidente legitimamente eleito Salvador Allende e levando ao poder Augusto Pinochet, um horrendo assassino e déspota. A ditadura militar provocou a morte e o desaparecimento de dezenas de milhares de pessoas e durou até 1990. Subjugar a Venezuela poderá contudo não ser tão fácil. Afinal, a Venezuela tem 19 anos de experiência revolucionária Bolivariana e um sólido sentido de resistência. 

O Irão está a ser mergulhado num destino semelhante. Sem motivo algum, Trump renegou o chamado Acordo Nuclear, assinado em Viena em 14 de Julho de 2015 depois de quase dez anos de negociações. Agora de certeza impulsionado pelo ultra sionista Netanyahu novas sanções, as mais severas de sempre, estão a ser impostas ao Irão, dizimando também o valor de sua moeda local, o Rial. 

O Irão, sob o Ayatollah, já embarcou num curso de “Economia de Resistência”, o que significa a desdolarização da sua economia e mover-se rumo à auto-suficiência alimentar e industrial, bem como aumentar o comércio com países do Leste, China, Rússia, SCO e outras nações amistosas e culturalmente alinhadas, como o Paquistão. No entanto, o Irão também tem uma forte Quinta Coluna, enraizada no sector financeiro, que não deixa de forçar e propagar o comércio com o inimigo, ou seja, o Ocidente, a União Europeia, cujo sistema monetário do Euro faz parte da hegemonia do dólar, apresentando portanto uma vulnerabilidade similar às sanções como as que o dólar produz. 

A China – o grande prémio do Grande Jogo de Xadrez global – está também a ser "sancionada" com tarifas sem fim, por ter-se tornado a economia mais forte do mundo, superando de longe os EUA, quer em produção real quer medida pelo poder de compra das pessoas. A China também tem uma economia sólida e uma moeda baseada no ouro, o Yuan, que está a caminho de rapidamente ultrapassar o dólar americano como a moeda de reserva número um do mundo. A China retalia, é claro, com "sanções" idênticas, mas, em geral, o seu domínio dos mercados asiáticos e a crescente influência económica na Europa, África e América Latina é tal que a guerra tarifária de Trump pouco significa para a China. 

Quanto à Coreia do Norte a muito falada cimeira Trump-Kim de meados de Junho em Singapura há muito tempo se tornou um pequeno ponto no passado. Os alegados acordos obtidos estão a ser violados pelos EUA, como era de esperar. Tudo sob o pretexto falso e puramente inventado de que a RPDC não aderiu ao seu compromisso de desarmamento; uma razão para impor novas sanções procurando estrangular a economia. 

O mundo olha. É normal. Ninguém se atreve a questionar os auto-intitulados Donos do Mundo. A miséria continua a ser distribuída tanto para a esquerda como para a direita, aceite pelas massas ao redor do mundo, sujeitas a lavagem cerebral. Guerra é paz e paz é guerra. Literalmente. O Ocidente vive uma zona de conforto “pacífica”. Para quê perturbar isso? Se as pessoas morrem de fome ou por bombas isso acontece longe e permite-nos viver em paz. Para quê importar-se? Especialmente porque somos gotejados continuamente a dizerem-nos o que está certo. 

Numa recente entrevista à PressTV, perguntaram: por que os EUA não aderem a nenhum dos tratados ou acordos celebrados internacional ou bilateralmente? Boa pergunta. Washington está a quebrar todas as regras, convenções, acordos e tratados, não está a respeitar nenhuma lei internacional ou mesmo padrão moral, simplesmente porque seguir tais padrões significaria renunciar à supremacia mundial. Estar em pé de igualdade não é do interesse de Washington ou de Telavive. Sim, esta relação simbiótica e doentia entre os EUA e o Israel sionista está a tornar-se progressivamente mais visível; a aliança da força militar bruta e o domínio financeiro pleno e traiçoeiro, juntos lutando pela hegemonia mundial, pelo domínio total. Esta tendência está a acelerar-se sob Trump e sob aqueles que lhe dão ordens, simplesmente porque "eles podem". Ninguém faz objecções. Isso tende a retratar uma imagem de poder inigualável, incutindo medo e esperando que incite à obediência. 

Na realidade, o que está a acontecer é que Washington está a isolar-se, o mundo unipolar está a mover-se rumo a um mundo multipolar, que desconsidera e desrespeita cada vez mais os Estados Unidos, despreza a sua agressividade e belicismo – que mata e lança na miséria centenas de milhões de pessoas, a maioria delas crianças indefesas, mulheres e idosos, pela força militar directa ou por conflitos liderados por procuração. O Iémen é apenas um exemplo recente, provocando sofrimentos humanos infindos a pessoas que nunca fizeram mal aos vizinhos, muito menos aos americanos. Quem poderia ter algum respeito por tal nação, chamada Estados Unidos da América, pelas pessoas por trás destes monstros mentirosos? 

Este comportamento do império agonizante está a levar aliados e amigos para o campo oposto, para o Leste, onde jaz o futuro, longe de uma Ordem Mundial globalizada, rumo a um mundo multipolar saudável e mais igualitário. Seria bom se os membros do nosso corpo mundial, as Nações Unidas, criada em nome da paz, finalmente reunissem coragem e se levantassem contra as duas nações destruidoras, pelo bem da humanidade, do globo e da Terra-Mãe. 

20/Agosto/2018


[*] Economista e analista geopolítico. 


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