por Luiz Carlos Azenha
A recente polêmica causada pela descoberta de um vídeo em que o deputado federal Eduardo Bolsonaro disse que bastavam um cabo, um soldado e um jipe para fechar o Supremo Tribunal Federal foi tratada de maneira superficial pela maior parte dos meios de comunicação.
Quem se deu ao trabalho de ver entrevistas e acompanhar o submundo dos grupos de whatsapp da campanha neofascista aos longo dos últimos meses sabe que os temas relativos ao TSE e ao STF provocam forte comoção entre os apoiadores de Bolsonaro.
Desde antes da campanha começar formalmente, Bolsonaro e assessores incentivaram a ideia de que haveria fraude nas urnas eletrônicas.
Alguns atribuiram a vitória de Dilma Rousseff sobre Aécio Neves, em 2014, por pequena margem, à fraude — no que foram incentivados pela decisão do PSDB de pedir recontagem.
Além disso, há de fato uma série de especialistas que questionam o voto eletrônico sem a impressão de um comprovante.
As fake news impulsionadas por whatsapp cumpriram um papel determinante na questão.
A teoria da conspiração de que o TSE teria entregue os códigos das urnas à Venezuela circulou amplamente. A manipulação dos códigos garantiria a exclusão de Bolsonaro do segundo turno.
Os apoiadores do neofascista, obviamente, não tocaram em duas questões essenciais.
O próprio sistema eleitoral da Venezuela, aquele da “ditadura” de Hugo Chávez, imprime votos e permite uma auditoria imediata, a partir dos papéis depositados em urnas, de uma amostragem suficiente para garantir que os resultados eletrônicos sejam comparados aos dos votos impressos.
Além disso, no Brasil o TSE cumpre um papel ímpar: organiza as eleições, julga as denúncias, audita e anuncia o resultado.
Na Venezuela, há um poder eleitoral independente da Justiça — o que, em tese, reforça o equilíbrio dos poderes.
No Brasil, curiosamente, Bolsonaro e os filhos nunca questionaram as urnas eletrônicas sem voto impresso quando eles próprios foram eleitos.
Se Bolsonaro vencer no próximo domingo, provavelmente este assunto será enterrado.
Porém, o mesmo não vai acontecer em relação ao STF.
A ideia de Bolsonaro é de acrescentar 12 ministros à Corte, garantindo maioria em relação aos 11 existentes.
A base da crítica à Suprema Corte é de que a maioria dos ministros foi indicada pelo ex-presidente Lula e pela presidenta Dilma Rousseff.
Por isso, teriam “vício de origem”.
A lista dos mais criticados é encabeçada por Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.
Gilmar é denunciado por soltar os presos da Operação Lava Jato — já foi alvo de vários protestos de bolsonaristas em relação a isso.
O “pecado mortal” de Lewandowski teria sido o que os neofascistas definem como “manobra” para evitar a inelegibilidade de Dilma Rousseff.
Toffoli seria o “advogado” de José Dirceu.
Mas a questão de fundo é completamente outra.
Ao longo dos últimos anos, o “ativismo judicial” dos ministros do STF tem sido profundamente criticado, inclusive à esquerda.
Em defesa da Corte, Gilmar Mendes chegou a afirmar que era derivado da inapetência do Congresso para tomar decisões.
Os bolsonaristas, no entanto, enxergam o STF como um empecilho ao Executivo.
No vídeo acima, gravado em 12 de julho passado, numa comissão do Congresso, Eduardo Bolsonaro enfatiza que o aborto é proibido por lei no Brasil, mas que o STF abriu uma brecha na legislação por sua própria conta.
Disse também que, se houver conflito com a Corte, não acredita que haverá manifestações de rua pedindo a volta deste ou daquele ministro.
Não se trata de um arroubo juvenil, mas de uma questão de fundo, reprise da que se deu nos Estados Unidos entre conservadores e liberais.
Os conservadores, como se sabe, se agarram na interpretação literal da Constituição — menos quando não interessa como, no Brasil, na regulamentação dos capítulos da Constituição de 1988 que dizem respeito à comunicação.
Bolsonaro vê a Constituição de 1988 como um entrave e, provavelmente incentivado por seus estrategistas militares, gostaria de ter maioria imediata no STF para que o “ativismo judicial” passasse a beneficiar suas próprias ideias.
Na incapacidade de aprovar mudanças constitucionais no Congresso, no entanto, a pressão contra o STF cumprirá uma função importante, caso ele seja eleito: controlar a pauta (para impedir, por exemplo, que o ex-presidente Lula seja solto) e os votos dos atuais integrantes da Corte.
Levantar os podres de cada um dos ministros, o que está ao alcance da inteligência militar, poderia ter um papel decisivo nisso.
Com whatsapp, com tudo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12