Céli Pinto (*)
Entre segunda e hoje a Brigada Militar, força pública do Rio Grande do Sul, esteve envolvida em duas operações onde morreram 11 pessoas, 7 depois de um assalto a banco, sendo que 6 assaltantes e um refém, e 4 outros que estavam estacionados em um carro frente a um banco e fugiram quando as forças policiais chegaram. Os dois eventos aconteceram em pequenas cidades do interior do Estado.
Hoje pela manhã um coronel da BM em entrevista a uma emissora de radio local jubilava-se do sucesso das ações policiais. O referido coronel afirmava que o êxito das operações era decorrência de dois fatores: o serviço de inteligência da Brigada Militar e as novas condições materiais que a corporação contava, após uma grande doação de carros blindados e armas e munição proporcionada por um conjunto de empresários gaúchos.
Não vejo razão alguma para júbilo. O que estes eventos mostram são três forças organizadas para matar, o que só podem multiplicar as mortes se continuarem com esta forma de agir e pensar. A primeira força organizada para matar é o crime organizado que impera no país. Sou absolutamente contra a ideia de que “bandido bom é bandido morto”, mas, também, não defendo o crime nem criminosos. O que me parece ser um fracasso, entretanto, é a guerra contra o crime ligado ao trafico de drogas e armas. A violência inaudita em que transformou este país muito devido ao chamado crime organizado tem também arraigadas raízes no sistema carcerário medieval e nas próprias forças policiais que agem muito longe do que poderia ser chamado de inteligência. Não sou especialista e não tenho soluções, mas tenho uma forte intuição que não é matando 4 jovens entre 15 e 19 anos que segundo o próprio coronel entrevistado tinham passagens pela FASE e polícias por crimes menores, que resolveremos essa violência assustadora.
E aí aparece a questão da inteligência policial. Deixando a morte dos 4 jovens de lado, me pergunto que serviço de inteligência policial no mundo ordenaria seus efetivos a perseguirem, com rajadas de balas, carros de bandidos contendo reféns no porta mala? Mesmo que as balas que mataram o funcionário do Banco do Brasil não tenham partido das armas dos policiais, não se pode admitir que a inteligência policial entenda que é razoável atirar na direção de um carro com reféns. Assim como o crime organizado, parece que nossas forças policiais estão organizadas para matar.
Finalmente temos a intervenção da sociedade civil, empresários organizados para munir a Brigada Militar de armas, munição e carros. De novo me pergunto, onde encontraremos este tipo de empresário no mundo? Nada contra os empresários, tomemos dois acima de quaisquer suspeitas: Onde Steve Job e Bill Gates colocaram suas vultuosas doações? Em armas? Em munições? Pois, para os nossos empresários tão afeitos aos exemplos dos irmãos do norte não ocorreu mandar toda a massa de recursos nas escolas públicas o estado. Talvez no futuro, se isto tivesse sido feito, os 4 jovens não estariam mortos pela polícia.
Em suma estamos todos organizados para matar: os assaltantes, a polícia, a sociedade civil. Nada de bom pode vir daí. Quem viver e sobreviver verá.
(*) Professora Titular do Departamento de História da UFRGS.
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