segunda-feira, 25 de março de 2019

Em lugar das utopias, a boçalidade



Por mais que se sustente o combate e a certeza de que a noite passa e o sol nascerá, é duro para minha geração ver os tempos de imbecilidade em que mergulhamos.

Pior, muito pior que os da ditadura, embora agora (ao menos, ainda) não estejamos sujeitos a sumir, de repente, para nunca mais sermos vistos.

Agora, tem horas em que a gente quer é sumir para não ver o que as elites dirigentes fizeram a este país.

Hoje, num golpe baixo de Facebook, o colega Luiz Costa Pinto me levou a ver uma homenagem a Milton Nascimento e ouvir o “Coração Civil”:

Quero a utopia, quero tudo e mais/Quero a felicidade nos olhos de um pai/Quero a alegria muita gente feliz/Quero que a justiça reine em meu país/Quero a liberdade, quero o vinho e o pão/Quero ser amizade, quero amor, prazer/Quero nossa cidade sempre ensolarada (…)Se o poeta é o que sonha o que vai ser real/Bom sonhar coisas boas que o homem faz/E esperar pelos frutos no quintal/Sem polícia, nem a milícia, nem feitiço, cadê poder?/Viva a preguiça, viva a malícia que só a gente é que sabe ter/Assim dizendo a minha utopia eu vou levando a vida/Eu vou viver bem melhor/Doido pra ver o meu sonho teimoso, um dia se realizar

Talvez as pessoas percebam, agora e de forma dolorosa, onde nos leva a intolerância, o escracho, os “padrões fifa” de eficiência, o maldito “eu só quero saber do que pode dar certo, não tenho tempo a perder”.

As máquinas foram feitas para buscarem a eficiência; os seres humanos, para buscarem a felicidade.

Maldito também seja o tempo das verdades absolutas, da moral absoluta, da autoridade absoluta, do “correto” absoluto. Tempo triste em que se festeja a morte, a prisão, a vigilância, a segurança que nos enquadra com blitz e até revista pessoal ao assistir um simples jogo de futebol num estádio.

Até mesmo um sujeito “cuca-fresca” como Miguel Falabella diz que agora “andou tudo para trás” e”vivemos uma idade medieval, com enforcamentos públicos, linchamentos”.

Sinto apenas vergonha que minha profissão tenha sido, em parte, o veículo desta degradação.

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