POR MARIA DO ROSÁRIO
A missão de Bolsonaro aos EUA foi marcada pelo entreguismo de quem não tem respeito pela pátria
A beleza do cancioneiro e das danças regionais da cultura do Maranhão, formada por matrizes diversas e riquíssimas, tem sua síntese, aos meus olhos, na coreografia reconhecida como patrimônio cultural imaterial do Tambor de Crioula.
Fui apresentada à dança e ao ritmo por mulheres, que na coreografia são as protagonistas. Tudo que envolve a dança nos remete a elas, sua força e capacidade de manter tradições pela história oral contada, cantada e recantada.
Preservar. Valorizar. São verbos muito presentes pra quem não recebe nada de mão beijada, mas sempre lutou como as mulheres. Quem tem identidade e valor, sabe fazer isso muito bem. Não se descarta, esquece e muito menos se entrega sua casa, sua terra, seu tekoha.
Isso faz o povo brasileiro tão diferente dos que se alçam à condição de elites nesse país. Elites que podem ser econômicas e atualmente políticas, mas cujo espírito de pequenez e vira-latice mostra que intelectualmente são só atraso. Nada aprenderam com nosso povo, com a sabedoria das quebradeiras de coco maranhenses, de quilombolas, de indígenas, ou com as mulheres e homens trabalhadores desse país. No Brasil, não cai um pão ao chão sem que alguém peça perdão pelo desperdício, pois se não falta pra si, pode faltar pra um vivente que precise muito.
Pois agora, não é que jogaram um pedaço do Brasil ao chão? Jogaram Alcântara aos pés do Tio Sam, e ele nem sabe ou quer saber o que é o Tambor de Crioula.
A missão de Bolsonaro aos EUA foi marcada pelo entreguismo de quem não tem respeito pela pátria, pelo território brasileiro, pelas possibilidades estratégicas do Brasil e principalmente, não respeita o nosso povo.
O governo fez questão de visitar a CIA, a agência de informações norte-americana. Qual a sua agenda e que informações repassou? Que planos organizou? Pra começar a falar em reciprocidade, alguém imagina Trump em visita à Abin, por exemplo?
Flagrantemente inconstitucional, o presidente da República age como se fosse o soldado raso que nunca deixou de ser. Sua lógica é cumprir ordens. E ordens de quem? Do Tio Sam, que não só está querendo mandar na nossa batucada, mas recebe agora autorização do soldado brasileiro para ocupar a Base Militar de Alcântara.
Desde muito tempo os EUA buscam instalar-se em Alcântara. O primeiro acordo foi firmado no governo FHC, em 2001, ao ser apresentada proposta à apreciação da Câmara, através da mensagem 296/2001, no formato de acordo bilateral sobre salvaguardas tecnológicas.
O voto contrário do relator, apresentado à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, do eminente deputado Waldir Pires. No debate intenso foi arguida muitas vezes a inconstitucionalidade do acordo. Waldir Pires apresentou um Projeto de Decreto Legislativo com ressalvas.
Preocupado em manter a soberania. Naquela ocasião o deputado obscuro, mas presente à sessão, Jair Bolsonaro, ofereceu seu voto contra o projeto. A mensagem 296/2001, aprovada pela CREDN tornou-se o PDL – Projeto de Decreto Legislativo 1446/2001, que tramitou de novembro de 2001 à dezembro de 2016, quando mensagem de Michel Temer, como presidente, solicitou a devolução da matéria ao Poder Executivo, o que foi aprovado. Uma matéria que por mais de 15 anos não encontrou solução legislativa, não se deve como muitos alegam, à morosidade do Congresso. Deve-se isso sim, a um consenso subjetivo, não explícito de todos os lados, mas ali presente, de que o acordo não seria bom para o Brasil.
A retomada de um possível programa espacial com a Ucrânia mostrou bem a opinião norte-americana quanto ao Brasil possuir um programa próprio e autonomia tecnológica. O WikiLeaks vazou telegrama do governo EUA orientando sua missão diplomática em Brasília a avisar os ucranianos que “os EUA não se opõem ao estabelecimento de uma de uma plataforma de lançamento em Alcântara, contanto que tal atividade não resulte na transferência de tecnologias de foguetes para o Brasil (…)”.
Não há dúvida de que estamos diante da entrega mais criminosa de território nacional. As mulheres maranhenses, que preservaram no Tambor de Crioula sua cultura, tornando-a patrimônio imaterial, sejam saudadas como valorosas brasileiras, plenas de dignidade.
O governo Bolsonaro, que destrói o patrimônio material, a produção científica e tecnológica, a biodiversidade, o patrimônio histórico e o futuro da nação, seja considerado traidor do Brasil e seu titular, um reles Silvério dos Reis, que nada merecerá da história a não ser desprezo. Para esses, os tambores estejam silenciosos.
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