segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Os brasileiros querem o Brasil?

O governo não se cansa de demonstrar que vai entregar o País ao desenvolvimento de outros povos. Os brasileiros devem dizer para Bolsonaro, para o mercado e para si mesmos, a quem pertence o Brasil, se estiverem mesmo interessados em saber disso

(Foto: Mídia NINJA)

Enio Verri
https://www.brasil247.com/

É difícil saber o que causa mais estarrecimento, se os pronunciamentos e gestos de Bolsonaro e de seu governo ou o silêncio da sociedade, de um modo geral. As manifestações pontuais, agendadas e mobilizadas, principalmente pelas redes sociais, têm demonstrado que há, a cada realização, mais motivos e mais gente para questionar a legitimidade das eleições deste governo, que promove uma profunda política recessiva e o isolamento do Brasil do restante do mundo. Na política interna, o governo aprofunda a crise econômica com propostas, entre outras, como a reforma da Previdência e a MP 881. A Nova Previdência vai estrangular a economia de 80% dos municípios, devido a forte participação dos pagamentos das aposentadorias e das pensões, pela Seguridade Social. O corte no valor dos benefícios será de 50%. Haverá menos consumo, afetando o comércio local, que não poderá contratar. Da mesma forma, com menos arrecadação, as prefeituras contratarão menos obras e serviços. O desdobramento da medida será um resfriamento na economia de um modo geral.

Já a MP 881, a despeito da pretensão de agilizar processos burocráticos para abrir e fechar uma empresa trouxe, em si, uma quarta reforma trabalhista, além de liberar geral o desmatamento, ao autorizar empreendimentos agropastoris ou de mineração, em caso de demora do licenciamento ou o mesmo quando declarado de baixo impacto ambiental. Porém, a referida medida não precisa o que venha a ser o baixo impacto. Ambos os projetos, que favorecem a elite e é deletério para a classe trabalhadora, foram aprovados pela Câmara dos Deputados, com larga margem de votos. Ainda este ano, Bolsonaro enviou as MPs 871 e 873, que asfixiam os sindicatos na sua capacidade de financiar a luta e mobilizar os trabalhadores. Há um clara busca pelo destroçamento das condições para a classe trabalhadora enfrentar a luta entre o capital e o trabalho. Há mais de 30 milhões de pessoas vivendo como podem, percebendo, mensalmente, entre R$ 300 e um salário mínimo. Há mais de 63 milhões de brasileiros inadimplentes, pagando mais de 300% de juros a.a. Um motorista de aplicativo de transporte urbano tem de trabalhar 14 horas por dia, apenas para empatar o que ganha com as contas. Esse é o mundo do Estado Mínimo, onde cada um se vire como pode.

Bolsonaro coloca fogo no país, tanto no sentido figurado quanto no literal. Empoderados pelo discurso de destruição do politicamente correto e pela desqualificação, pelo presidente, de dados científicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, ruralistas da região Norte do País incendiaram a floresta Amazônica, em apoio às críticas levianas de Bolsonaro ao ICMBio e ao Ibama. Sua política está apavorando até mesmo os outrora aliados ruralistas. Um dos maiores latifundiários e exportadores de grãos do Brasil, Blairo Maggi, já se disse preocupado, pois as politicas do presidente podem prejudicar o agronegócio, com sanções impostas por países importadores. Bolsonaro já brigou com os árabes, a China, vários países da América Latina, França, Noruega e Alemanha. Um presidente de um país cujos principais produtos são primários e direcionados justamente a nações com as quais ele está se indispondo, não parece ser um modelo de estrategista ou não tem apreço pelo seu país. Bolsonaro pode provocar sanções a produtos brasileiros que serão buscados em outros países. Faz cada vez mais sentido a continência prestada à bandeira dos EUA, por Bolsonaro.

Na mesma semana em que o Norte do País arde em chamas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, anuncia que vai queimar todo o estoque que o Brasil tem de patrimônio de ferramentas com as quais pode construir as saídas para a crise em que se encontra. Ele disse que o governo vai privatizar dezenas de empresas estatais, como se fossem de propriedade do governo. Os correios não são uma empresa entregadora de cartas, mas uma grande e muito bem montada instituição com décadas de expertise em logística, infraestrutura e um gigantesco banco de clientes. O Brasil está em vias de entregar para a iniciativa privada um correio público e superavitário. Até mesmo os correios dos EUA, Meca dos sabujos liberais brasileiros, é público desde sua inauguração, na década de 1770. Outra empresa que está na lista das privatizações de Bolsonaro é a Caixa Econômica Federal. Um banco público, forte e superavitário será entregue ao capital financeiro privado. O maior programa habitacional da história do Brasil só foi possível graças à CEF, que subsidiou o acesso de pobres à habitação própria, com o mais forte programa de transferência de riqueza já implantado no Brasil. É impossível imaginar um banco privado à frente de um projeto dessa magnitude.

O Brasil ainda possui outras ferramentas importantes com as quais pode construir a retomada da sua economia, rumo ao desenvolvimento. Banco do Brasil, BNDES, Eletrobras, Petrobras, entre outras, estão na mira de um governo submisso ao capital financeiro, notadamente o dos EUA. Quem está indignado por ter sido enganado por Bolsonaro junte-se aos que já estão na luta, desde as eleições, contra um governo eleito por meio de mentiras. O objetivo da elite brasileira é transformar o Brasil em uma grande fazenda produtora de commodities, onde a mão de obra seja a mais barata, quando não escrava. Já está havendo alguma reação, mas ainda não o suficiente para enfrentar as investidas dos liberais sobre a soberania nacional. Está mais do que na hora de os brasileiros dizerem se querem, ou não, o Brasil para si. O governo não se cansa de demonstrar que vai entregar o País ao desenvolvimento de outros povos. Os brasileiros devem dizer para Bolsonaro, para o mercado e para si mesmos, a quem pertence o Brasil, se estiverem mesmo interessados em saber disso.


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