terça-feira, 15 de outubro de 2019

Retomando a questão do nacionalismo econômico, por Carlos Medeiros

Eu particularmente considero os investimentos públicos em infraestrutura (econômica e social) e as compras públicas para inovação essenciais para a promoção do desenvolvimento.

            Por Jornal GGN
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Retomando a questão do nacionalismo econômico, por Carlos Medeiros

A pergunta relevante é em que medida ele se contrapõe ao neoliberalismo e como ele se situa no embate entre a esquerda e a direita. Minha primeira observação geral e totalmente de acordo com Eric Helleiner (Economic nationalism as a Challenge to Economic Liberalism? Lessons from the 19th Century) é de que o nationalismo econômico não pode ser confundido com seus instrumentos (tarifa, cambio, controles, etc) e expressa essencialmente um determinado conteúdo e missão o seu objetivo é promover “a opulência, a civilização e o poder da nação” numa formulação de Frierich List mas que era essencial a Adam Smith. Assim, o nacionalismo tanto pode se opor contundentemente ao neoliberalismo na defesa de mecanismos que isolem a indústria doméstica da concorrência internacional tal como formulava Hamilton nos EUA e List sobre a Alemanha do século XIX (mas amplamente reconhecida pelo liberal Stuart Mill) quanto pode defende-lo como faz (ainda que veladamente) a Alemanha atual. Recorde-se que David Ricardo defendia o livre comércio para promover a indústria inglesa. Líderes nacionalistas atuais como o Putin endossam políticas neoliberais. Os instrumentos adotados pelo nacionalismo econômico desenvolvimentista são muitos distintos, ele pode ser mais ou menos estatizante, mais ou menos focado na macroeconomia (adesão ou não ao padrão-ouro, controle de câmbio, dos fluxos financeiros, etc) ou como no caso Europeu do século XIX e asiático do pós-guerra na microeconomia através de tarifas (como na Europa do século XIX e EUA), planejamento do investimento e do controle da propriedade estrangeira. 

Por outro lado, o nacionalismo pode ser de direita ou de esquerda, o divisor de águas aqui é o estado de bem-estar social. Ou o nacionalismo desenvolvimentista é articulado com este como foi, por exemplo, o caso da França do pós-guerra, ou inteiramente subordinado “a opulência e o poder da nação” através de estados autoritários como no Brasil dos 1970, Coréia, Taiwan, China pós Deng.

Assim, o nacionalismo pode ser desenvolvimentista ou liberal, de direita ou de esquerda. 

Todos nós aqui estamos convencidos pela história e pela teoria que apenas o nacionalismo desenvolvimentista que se distingue totalmente do ‘campo de jogo nivelado’ pregado pelos liberais (nacionalistas ou cosmopolitas) é capaz de fomentar o desenvolvimento e, por outro lado, todos defendemos a redução das desigualdades e a coesão social obtida através de um estado social democrático. Assim, se considerarmos as questões postas acima, defendemos uma variante desenvolvimentista e de esquerda de nacionalismo. 

E o ‘novo-desenvolvimentismo’ tal como exposto na formulação inicial do prof. Bresser? Ele certamente é um nacionalismo econômico alternativo ao neoliberalismo no plano macroeconômico, mas não possui uma agenda microeconômica que permita consolidar também aí uma alternativa, embora creio que isto seja possível. Eu particularmente considero os investimentos públicos em infraestrutura (econômica e social) e as compras públicas para inovação essenciais para a promoção do desenvolvimento. Elas não podem ser consideradas residuais e dependentes de um impreciso “equilíbrio fiscal” Em relação ao recorte direita e esquerda, o ‘novo desenvolvimentismo’ oscila entre uma formulação mais próxima à direita subordinando o estado social à competitividade das empresas (a variável chave é a taxa de lucro), e uma perspectiva mais à esquerda ao defender a necessidade civilizatória deste. 

Há ainda uma questão estratégica ao nacionalismo econômico, tocada aqui e ali neste grupo: a questão do poder que no caso de uma economia como a brasileira inclui o controle estratégico sobre os recursos naturais e o espaço territorial. 

Por fim, para a discussão que aqui muitas vezes me parece não muito bem colocada entre mercado interno e externo e sobre a competitividade creio que a UNIDO resumiu bastante bem as articulações válidas para uma economia de amplo mercado interno como a economia brasileira:

“Market size and related scale economies are major determinants of trade specialization and trade flows (Krugman 1980). If scale effects are important for production, companies that can benefit from them will prefer locating in larger markets, where a large part of their products will be consumed and exported, lowering the domestic price level. This “home market effect” will affect trade flows and lower export unit values” (UNIDO, 2018)

Carlos Medeiros – Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro

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