segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Faz arminha que passa



Do jeito que a economia brasileira está devastada, imaginem a quantas anda a "indústria do diagnóstico" nos colégios privados e todas as outras vertentes que atendem os profissionais liberais brancos?

Eles estão desesperados. Não estão passando fome, mas perderam a qualidade de vida dos tempos Lula e Dilma.

Quando os consumidores de classe média começam a cortar a picanha do fim de semana, a viagem para o nordeste e a troca do veículo para impressionar os vizinhos, o pânico aperta - e quem paga a conta são os consumidores de serviços médicos, de educação e de consultoria.

A picaretagem, portanto, está em alta. É uma luta fratricida para se arrancar o pouco de dinheiro que circula por aí. Avança-se na liberação do FGTS, que virou uma espécie de botão do pânico para uma economia tão avacalhada.

Dentre tantos outros fenômenos de degradação e precarização, vamos experimentando a uberização das profissões liberais. Se já era difícil antes, com os impostos - que eram, inclusive sonegados em larga escala por esse segmento -, imaginem agora.

Dentistas, médicos, consultores, publicitários, fisioterapeutas, nutricionistas, advogados, farmacêuticos, acabaram "perdidos na tradução" no lamaçal da política econômica de Paulo Guedes. Estão como John Travolta naquele meme extraído do filme Pulp Fiction: elegeram Bolsonaro e agora coçam a cabeça para fechar o orçamento.

As exceções de praxe só aumentam o drama: profissionais liberais que resistiram ao ódio do antipetismo e votaram em Haddad estão na mesma situação: lutam para pagar as contas.

A diferença é que dormir com a consciência tranquila ainda rende alguns minutos de sono a mais (o que, por outro lado, prejudica o mercado dos ansiolíticos - piada sem graça, desculpem).

Por falar em ansiolítico, o cenário do comércio é um filme de terror. Shoppings vazios proliferam como dengue e até aquecem o mercado da montagem e desmontagem de lojas. O nosso jornalismo 4.0 está terminantemente proibido de falar sobre isso (economistas estão até sendo demitidos por teimarem em apontar estatísticas de retração).

Medicamentos sumiram de mercado (os mais baratos, porque os os mais caros tiveram os preços turbinados e permanecem nas prateleiras).

O programa Farmácia Popular, na prática, foi terminado, assim como o Mais Médicos e todos os outros programas criados pela sociedade brasileira - e não só pelo PT - entre os anos de 2003 e 2016.

Eles funcionam hoje, sob Bolsonaro, apenas como fachada e estão sendo desmantelados com muita corrupção proveniente dos ministérios bolsonaristas (para que, depois, sejam definitivamente extintos a título de combate à corrupção).

O dólar disparou, o preço da gasolina idem. Planos de saúde, mensalidade escolar, contas de luz, gás, aluguel e todos os produtos e serviços que são essenciais não apenas para a classe média, mas também para a sobrevivência dos mais pobres, tiveram reajustes severos.

Houve migração em massa de alunos da rede privada para a pública, o que obriga as escolas particulares a aumentar o valor das mensalidades (quando não fechar as portas) e pressiona o já péssimo ensino público brasileiro.

Se, para a classe média, está difícil, imagine para o pobre. Este foi obrigado a ir morar nas rua, pois o volume de desocupações violentas pela polícia também aumentou.

A expressão "faz arminha que passa" poderia ser muito bem aplicada a essa situação, no deboche tão caro à cultura brasileira. Afinal de contas, o carnaval está aí.

Mas ela não resolve. Só aumenta a dor de vivermos sob escombros, debochando dos nossos algozes.

Muitos dizem que o governo Bolsonaro é "pedagógico", que, assim, o brasileiro vai aprender. Se isso fosse verdade, a ditadura teria sido pedagógica. Não foi. Foi traumática.

Pedagógico foi o ciclo FHC, porque, aparentemente, ali, no fim do período tucano, o brasileiro aprendeu a votar com alguma consciência política. Esse mérito, talvez, devamos ao "príncipe da sociologia".

Fato é que o Brasil, hoje, é um barril de pólvora molhada. Até ela secar, pode demorar uma eternidade.

E, enquanto estamos aqui formulando e produzindo um debate público com vistas ao processo democrático de convencimento e ocupação de espaços políticos, nossa elite financeira e midiática vai ajustando o day after de Bolsonaro nos bastidores, com Hucks, Moros, Dorias e Witzels.

Pode acabar ficando tarde até para eles.

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