Por Eric Nepomuceno
https://www.brasil247.com/
Lembro de um primeiro de janeiro, há
muitos e muitos anos, uns vinte, e do que ouvi de Cacá Diegues ao ligar para
deixar um abraço de ano novo. “Eu tenho um desejo de ano novo: que o dia volte
a ter 24 horas...”.
Pois é: a partir de uma certa idade, o tempo desanda a voar. E não deixa de voar e voar cada vez mais.
E agora, de repente, o tempo voltou a
se arrastar com insólita e terrível lentidão. Tudo soa e parece estranho.
Esta casa, por exemplo. Sempre me
pareceu do tamanho exato para ser aconchegante e cálida, e agora de repente ela
me parece mínima, de repente ganha ares de imensidão.
E é nessa casa tão minha que recebo
notícias arrasadoras, junto com um frio que me acabrunha a vida.
No começo da pandemia, o vírus maldito
me lanhou fundo ao levar o grande escritor chileno Luis Sepúlveda. Por respeito
à palavra, não digo que éramos amigos. Mas nos conhecíamos há uns 40 anos, e em
nossos encontros pairou sempre um ar cálido, o ar dos companheiros de luta e de
trincheira.
Depois, o mesmo vírus me acertou duas
punhaladas: Luís Edgar de Andrade, jornalista imenso, meu mestre, e dona Leda,
viúva de meu bom amigo Cibilis Viana.
E agora, um canhão acertou minha alma:
Sergio Sant’Anna, que conheci há 48 anos. Que foi contemporâneo de faculdade da
minha companheira, que ao saber que ele se foi para sempre mergulhou numa
depressão sem fim. O Sérgio, o Serginho Sant’Anna, que foi solidário e generoso
comigo e especialmente com meu filho cineasta, o Felipe.
Como se toda essa dor fosse pouca, vejo
o que acontece no meu país, este pobre país náufrago, vilipendiado a cada hora
por um genocida desequilibrado, um desqualificado ética, intelectual e
moralmente.
Tenho um imenso medo: quando tudo isso
tiver passado, qual o tamanho do vazio que terei pela frente?
O vazio deixado pelos amigos levados
pelo coronavírus será imenso e permanente, mas por sorte sobrará o calor dos
amigos que continuam ao meu lado para suavizar essa sensação.
Meu medo maior é outro: qual será o
tamanho do vazio que será deixado neste país destroçado?
Jair Messias não merece perdão. Quem
continua ao seu lado não merece perdão. A história saberá condenar cada um
deles. Cada um.
São todos responsáveis pelo descalabro,
pela destruição. São todos desprezíveis. Lamentáveis.
E ninguém poder sair às ruas para
exigir uma limpeza geral é uma sorte deste bando de sacripantas.
Ah, sim: e o silêncio cúmplice, omisso,
covarde dos militares aboletados num governo abjeto será cobrado, rigorosamente
cobrado, pela história. Pelo que restar deste país que eles ajudam a
destroçar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12