O boletim epidemiológico nacional de 11/09 anuncia 43.718 novos casos confirmados de COVID-19 e um acumulado de 4.282.164 contaminados.
E esse mesmo documento escancara nossa tragédia: 130.396 mortes até aqui, com o triste registro de 874 vidas perdidas apenas no dia de sua divulgação!
Mas parece que, pelo menos para o Governo Federal, as tantas vidas perdidas para a COVID-19 não tem nenhuma relevância: o comando maior do Estado não se dá ao trabalho de, sequer, pronunciar-se em solidariedade às famílias enlutadas.
Essa indiferença, todavia, passa longe de ser incoerente com a política da morte do atual governo.
Ele jamais ocultou sua idolatria a morte: expressou preferir que um filho “morra num acidente” a vê-lo viver um relacionamento homoafetivo; fez — e faz — “arminha” como gesto de identificação própria e de seus apoiadores; fortaleceu o jargão de que “bandido bom é bandido morto”; afirmou que o “erro da ditadura foi torturar e não matar”; defendeu que as mudanças só serão possíveis “fazendo o trabalho que o regime militar não fez: matando uns 30 mil, começando com o FHC, não deixar para fora não, matando”, reconhecendo o fato de que “vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente”; atiçou a população do Acre a “fuzilar a petralhada”; sustentou que se o policial, em uma abordagem, “matar 10, 15 ou 20, com 10 ou 30 tiros cada um, ele tem que ser condecorado, e não processado”; declarou que, em relação ao massacre do Carandiru, “Morreram poucos” que a “PM tinha que ter matado mil”; enfim, a morte é por ele venerada.
O menoscabo à vida e o apreço pela morte não se limita à existência de seres humanos.
As chamas que consomem partes do território amazônico, intensificadas no mês de agosto e agora em setembro, retratam um cenário desolador. Vegetação e animais mortos pelo fogo que não só não é combatido pelo Estado, mas é por ele incentivado.
Não há a menor empatia ou sensibilidade do Governo Federal com tamanduás, bichos preguiça e filhotes de todas as espécies sendo consumidos pelas chamas, sem chance de fuga pela lentidão que lhes é própria; nem com aqueles que embora não morram de imediato, sofrem ferimentos incapacitantes ou letais que lhes dizimam igualmente.
E, de fato, a indiferença à vida animal é absolutamente coerente com essa política de governo perversa.
Recentemente, o Presidente da República manifestou sua dúvida sobre sancionar ou não o Projeto de Lei 1095/19, que altera a Lei de Crimes Ambientais, aumentando a pena para quem abusa, fere ou mutila cães e gatos para 2 a 5 anos de reclusão.
Em sua justificativa para a dúvida, o Presidente da República questiona: “Dá para entender o que é uma pessoa ficar dois anos atrás das grades porque maltratou um cachorro?”.
Muito embora a fala de Bolsonaro pareça fazer crer que ele julgue dois anos “atrás das grades” uma pena muito severa porque ele reconheceria a ilegitimidade e falência do sistema penal, na verdade ela revela é seu desprezo pela vida animal: Bolsonaro só não concorda com a prisão, por dois, três anos, de quem mutila ou fere um cão ou um gato!
Não podemos esquecer que em novembro de 2017, na capital do Espírito Santo, o atual Presidente da República afirmou que não se pode ter pena de pessoas que cometem crimes, sustentando que “não podemos ter pena desse tipo de gente e nós não podemos ter uma lei de execução penal tão frouxa quanto essa”, lamentando o Brasil não ter prisão perpétua — isso mesmo, prisão perpétua e não apenas dois ou três anos!
Nesse mesmo episódio, Bolsonaro deixou claro que, por ele, “teria prisão perpétua’ no Brasil, justificando que a reclusão não é para o criminoso “pagar seu pecado não, é para que a sociedade fique livre do contato com esse tipo de gente”, adicionando que “Esse tipo de gente não pode ter benefício de lei”.
Então, precisamos compreender: criminoso para o Chefe do Executivo Federal não é quem mutila ou fere um animal; criminoso é quem furta, rouba, trafica.
Veja, a ele pouco importa se delitos como furto, roubo ou tráfico de drogas têm importante causa na profunda desigualdade social e concentração escandalosa das riquezas nas mãos de meia dúzia de bilionários brasileiros.
Ele não se sensibiliza com a miséria que descarrilha o comportamento de quem é relegado às margens da sociedade, de quem é marginalizado.
E esse pensamento é harmônico com a complacência com quem mutila ou fere um animal, pois esse Governo é complacente com a perversão e, sejamos honestos, quem decepa, tortura, atea fogo em animais não o faz para matar a fome, mesmo que seja a fome de se fazer existir através do ter, do consumir, mas o faz pela simples crueldade e malevolência que, não nos enganemos, é facilmente dedicada a mulheres, negros e lgbts.
Esses sujeitos que maltratam animais e que Bolsonaro não vê problemas em continuar convivendo em sociedade, são os mesmos cidadãos de bem que o apoiam e que, na enquete feita no twitter pelo Presidente, acharão absurda a majoração da pena para quem decepar as patas, atear fogo ou torturar cães e gatos.
A propósito, os maltratos de que aqui falamos são, na verdade, tortura: trata-se de um comportamento típico de torturadores e aqui, mais uma vez, a coerência ideológica do Presidente da República se mantém intocável, pois por vezes as decisões de Bolsonaro foram tomadas em “memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra”!
Perla Müller é advogada, professora universitária, escritora e pré-candidata a vereadora de Ribeirão Preto pelo Partido dos Trabalhadores
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