
Os presidente da República, Jair Bolsonaro, do Senado, Davi Alcolumbre, e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, os ministros Paulo Guedes e Rogério Marinho durante entrevista em frente ao Palácio do Alvorada. Foto: Agência Brasil
Os efeitos negativos da Emenda Constitucional nº 95/2016 para o financiamento do SUS
por Francisco R. Funcia, especial para o Viomundo
O objetivo deste artigo é analisar os efeitos negativos da
para o financiamento do SUS e, consequentemente, para o atendimento às necessidades de saúde da população.
Essa análise considera os dados levantados da fonte oficialmente definida na Lei Complementar 141/2012: o Relatório Anual de Gestão 2019 do Ministério da Saúde (RAG 2019/MS).
Para comparar com 2018, foram considerados os dados do Relatório Anual de Gestão 2018 do Ministério da Saúde (RAG 2018/MS).
As informações referentes à população (para o cálculo per capita) e ao IPCA (para aferir se houve ganho ou perda real de valores) foram obtidos junto ao IBGE (aqui e aqui).
Em 8 de setembro deste ano, eu e os colegas Carlos Ocke e Bruno Moretti publicamos aqui no Viomundo o artigo “Fanatismo fiscal” está levando Brasil ao caos social: SUS merece mais em 2021.
O conceito de ”fanatismo fiscal” é nosso.
A razão de voltarmos ao tema agora, pouco mais de um mês depois, é a constatação de que o fanatismo fiscal está sendo retomado com muito vigor nos debates sobre as diretrizes e as programações orçamentárias para 2021.
Vemos isso no Congresso Nacional, no governo federal e na grande mídia, que concede grande espaço aos defensores da retomada da política econômica e social baseada nas regras da Emenda Constitucional 95/2016, especialmente, o cumprimento do teto das despesas primárias e da regra da aplicação mínima federal do SUS.
Desta forma, insistimos. É fundamental que o Congresso debata p Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias e Projeto de Lei Orçamentária de 2021 sem ser influenciado por falsas crenças ou pelo “fanatismo fiscal”, que esconde “interesses” de uma minoria.
É indispensável que esse debate no Congresso se baseie na análise dos dados da execução orçamentária e financeira das políticas sociais, conforme constam em Coalização Direitos Valem Mais.
No caso do SUS, o resumo dessa análise também está na petição pública “A Saúde Merece Mais em 2021” lançada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS).
É grande a lista de argumentos falsos para esconder que a EC 95/2016 tem gerado perdas para o financiamento do SUS.
Vou analisar três aqui.
Argumento 1: Não há teto para a saúde porque há garantia do piso. PORQUE HÁ A GARANTIA DO PISO.
Verdadeiro ou Falso? F A L S O.
Pela regra do “teto” global de despesas, para um ministério aumentar suas despesas, outros precisam gastar menos.
Ssomente assim o resultado final será um valor total de despesas primárias no nível do “teto” global. Portanto, estão fora dessa regra as despesas financeiras com juros e amortização da dívida, que não têm nenhuma limitação.
Além disso, o que está garantido para a saúde é um “piso” federal que tem perdido valor desde 2018 como proporção da Receita Corrente Líquida (quando a regra da EC 95/2016 passou a ser adotada):
— 15,0% em 2017
— 13,95% em 2018
— 12,95% em 2019
É o piso se transformando em “subsolo” .
Aplicar acima do piso não evitou perdas para o SUS federal em 2019, como demonstramos na Domingueira extra nº 38 – setembro 2020, do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa)
Argumento 2: Não houve perda para o SUS como decorrência da aplicação acima do piso federal em 2019.
Verdadeiro ou Falso? F A L S O.
Somente em 2019, considerando as despesas empenhadas, as perdas de aplicação federal da saúde em comparação ao valor equivalente ao piso de 15% da Receita Corrente Líquida (RCL, vigorava antes da EC 86/2016) foram de R$ 13,6 bilhões, três vezes mais que a alegada “aplicação adicional” afirmada no RAG 2019/MS.
Vale destacar novamente que o argumento da “aplicação acima do piso” esconde a queda do valor do piso federal do SUS como proporção da RCL a partir de 2018.
Argumento 3: Estados, Distrito Federal e municípios não foram prejudicados em 2019 pelo teto de despesas primárias e pela regra de cálculo do piso federal do SUS.
Verdadeiro ou Falso? F A L S O.
Comparando os valores totais transferidos pelo Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Estaduais e Municipais de Saúde em 2019 com os de 2018 para o financiamento do custeio e investimento da saúde, foi possível identificar uma queda real dos valores transferidos.
O seja, a variação percentual dessas transferências ficou abaixo da variação do IPCA (calculado pela média anual), inclusive para o valor per capita.
Isso significa que o recurso federal por habitante para financiar o SUS não foi suficiente para compensar a variação da inflação anual.
A tabela abaixo ilustra essa situação.

Tabela elaborada por Francisco R. Funcia, tendo como fontes a tabela 9 , páginas 15 a 17, do Ministério da Saúde/RAG 2018 e RAG 2019, IBGE/População (aqui) e IPCA (aqui).
Além desses efeitos negativos das transferências fundo a fundo per capita para cada Estado e cada município, os recursos foram distribuídos desigualmente em termos regionais.
Ou seja, a EC 95/2016 não somente retirou recursos do SUS em 2019. Essas perdas prejudicaram de forma desigual a população, segundo as diferentes regiões e unidades da federação.
* Francisco R. Funcia é economista e mestre em Economia Política pela PUC-SP, professor universitário nos cursos de Economia e Medicina, consultor na área de finanças públicas e economia da saúde e professor de cursos e oficinas para o planejamento e a gestão orçamentária e financeira do setor público brasileiro, inclusive no âmbito do SUS.
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