Por Lygia Jobim
Em 1928 o governo da República de Weimar, período em que a taxa de desemprego na Alemanha chegou a variar entre 10 e 11% por cento, adotou o slogan “O trabalho liberta” como símbolo de uma campanha para a realização de grandes obras públicas. O objetivo era empregar a mão de obra ociosa.
Ao tomarem o poder, em 1933, os nazistas se apropriaram dela e passou a figurar na entrada de vários campos de concentração, entre os quais Theresienstadt, para onde eram deportadas as comunidades da Europa Central ou Oriental e Auschwitz, destino daquelas vindas da Europa Ocidental.
A frase não passava de uma ironia para ridicularizar os prisioneiros que atravessavam os portões achando que iriam fazer trabalhos forçados, quando seu destino final era a morte, e acabou por tornar-se um símbolo das atrocidades cometidas pelos nazistas.
Os poucos que sobreviveram foram, para sempre, atormentados pela lembrança do que viveram no inferno. A ela se refere o escritor Primo Levi em seu livro É isto um homem?: "A viagem levou uns vinte minutos. O caminhão parou; via-se um grande portão e, em cima do portão, uma frase bem iluminada (cuja lembrança ainda hoje me atormenta nos sonhos): ARBEIT MACHT FREI - o trabalho liberta".
O governo do tenente Bolsonaro parece ter uma especial predileção por esse período. Ou serão apenas infelizes coincidências?
Em 16 de janeiro o governo, através do então Secretário de Cultura Roberto Alvim, nomeado com euforia pelo tenente que declarara ter finalmente encontrado o homem certo para ocupar a pasta, achou por bem copiar uma fala de Goebbels dizendo: “A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada”.
Em 08 de maio de 1933, por coincidência exatos doze anos antes do Armistício, este também em 8 de maio, segundo o biógrafo Peter Longerich, Goebbels teria dito: “A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada”.
Coincidência?
Em 10 de maio deste ano, apenas alguns meses depois da fala governamental acima, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República, publicou no Twitter um vídeo no qual usa uma frase com clara e inequívoca inspiração no slogan nazista sobre o trabalho: “Parte da imprensa insiste em virar as costas aos fatos, ao Brasil e aos brasileiros. Mas o @govbr, por determinação de seu chefe, seguirá trabalhando para SALVAR VIDAS e preservar o emprego e a dignidade dos brasileiros. O trabalho, a união e a verdade libertarão o Brasil.
Coincidência?
Ao visitar Foz de Iguaçu em 1º. de dezembro deste ano, o tenente, ao falar diante de uma plateia de peões que ganham, tomando-se por base a média do piso salarial da profissão em 2020, R$ 1.725,57, comentou sobre a continuidade do auxílio emergencial afirmando que a extensão do benefício seria caminhar para o insucesso.
E completou: “Nada dignifica mais o homem do que o trabalho. É o que nós precisamos”.
Coincidência?
No trimestre encerrado em agosto deste ano a taxa de desemprego no Brasil, segundo o IBGE, bateu o assombroso recorde de 14,4%. Maior do que a taxa máxima durante a República de Weimar. Acrescente-se a isso que, quando a recessão, provocada pela “gripezinha” que assola o mundo, atingiu nossa economia, o mercado de trabalho já se encontrava em frangalhos. Em 2019, 24,7% da população, estava, segundo os critérios do Banco Mundial, abaixo da linha de pobreza. Mas não paramos por aí. Do percentual acima 6,5% foram considerados extremamente pobres por disporem de uma renda de até R$151,00 por pessoa. São 13.715.000 milhões de brasileiros vivendo com menos do que o necessário para comprar uma cesta básica cujo valor, segundo o DIEESE, em outubro era de R$595,25 em São Paulo e R$592,25 no Rio de Janeiro. Os que ganham o salário mínimo de R1.045,00 gastam mais da metade de seu salário em uma cesta básica que, sempre segundo os cálculos do DIEESE, alimenta dois adultos e duas crianças.
Assim, no Brasil, o trabalho liberta, dignifica, mas não alimenta.
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