sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Bolsonaro foi a Joinville em busca da sua turma

(Foto: Reprodução | ABr)

Por Moisés Mendes

Bolsonaro não foi por acaso a Joinville para uma confraternização com empresários de uma cidade ultraconservadora, com moradores que não escondem seus vínculos com grupos supremacistas.

Bolsonaro foi reforçar publicamente suas conexões com redutos com forte presença de simpatizantes do neonazismo.

É a face que ele tem ressaltado nos gestos mais recentes, desde a aparição ao lado de uma deputada alemã defensora de ideias nazistas.

O extremismo genérico já não basta para Bolsonaro, enquanto ele radicaliza os ataques ao Supremo e ao TSE. É preciso agregar qualidade e explicitar agora sua aproximação com grupos que tenham grife e possam transformar suas relações numa espécie de ameaça.

Bolsonaro se protege não só entre os que podem reforçar suas ideias, mas podem também ser seu lastro na hora de um desatino golpista.

Esse é o aviso: eu estou com os militares, mas estou também com essa turma da deputada alemã e seus similares nacionais, para seguir em frente. E essa turma geralmente é vinculada a grupos armamentistas.

Podem dizer, numa frase que tem sido repetida à exaustão em qualquer controvérsia, que não podemos generalizar e que nem todos os que recepcionaram Bolsonaro são extremistas.

Podem não ser. Claro que Joinville não tem apenas fundamentalistas. Se tivesse, se o nazismo ocupasse todos os espaços, a professora Ana Lúcia Martins não teria sido eleita com 3.126 votos no ano passado.

Ana Lúcia já seria hoje uma exceção como única representante do PT na cidade. É mais do que isso, é a primeira vereadora negra do município. Ficou em sétimo lugar entre 19 eleitos.

Mas, desde antes de assumir, Ana Lúcia foi ameaçada de morte por racistas com recados nas redes sociais, por e-mails ou por mensageiros.

Os racistas estão soltos e impunes, porque ameaçam de morte uma mulher, professora, militante negra, e não uma estátua de Borba Gato.

Por isso Bolsonaro escolheu a cidade certa para receber homenagens. Uma cidade branca, com a hegemonia da direita aliada a grupos supremacistas, todos agarrados à ideia de que são superiores por serem brancos e os verdadeiros “donos” da região.

O branco descendente de colonizadores, que mora em Joinville, arredores ou em qualquer outra cidade ocupada por colonos europeus, considera-se herdeiro dos primeiros exploradores de espaços rurais e suas extensões urbanas.

Indígenas e negros não teriam chegado primeiro nem estariam mais ali quando os colonos vieram da Europa, porque eram invisíveis. É assim também no Rio Grande do Sul.

E muitos dos nazistas de Santa Catarina são descendentes de gaúchos, que replicaram ali outro movimento de ocupação de terras, já no século 20.

A maioria dos gaúchos catarinenses tem como ancestrais os europeus que vieram no século 19 para o Brasil como escórias, do ponto de vista político, econômico e social.

Eram presidiários, agricultores sem terra, gente sem habilidades como artesão e sem condições de ser aproveitada na indústria. A salvação desse excedente era a migração planejada.

O ancestral do racista de Joinville e da maioria das cidades de colonização, e não só os descendentes de alemães, tem o sangue dessa gente refugada pela Europa em transformação.

O racista brasileiro é a aberração que deveria ser confrontada sempre com a história dos seus ancestrais, não necessariamente para que deixasse de ser racista, mas para que enfrentasse ao menos alguma verdade e algum constrangimento.

Essa é também, infelizmente, a imagem de cidades ricas como Joinville. É um estigma sustentado por estudos acadêmicos sérios, e não por intrigas.

Para desfazer essa fama, é preciso bem mais do que brigar contra pretensos desafetos da esquerda e com textos como esse aqui.

É preciso deixar de atrair e dar suporte político a gente com a história, a fama e as ideias de Bolsonaro. É preciso enfrentar os que ameaçam de morte a vereadora Ana Lúcia.

Os moradores de Joinville precisam admitir que a presença de Bolsonaro na cidade é reveladora das escolhas de um sujeito acossado e em desespero. Bolsonaro foi em busca da sua turma.

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