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Em Cuba, a expressão “doble moral” (ao pé da letra dupla moral), é muito utilizada nos meios de comunicação. Certa vez, ao escrever um artigo sobre o terrorista Posada Carriles – aquele mesmo que explodiu um avião da Cubana de Aviación em pleno vôo e se encontra protegido nos Estados Unidos -, tentei usar a expressão mas acabei abortando a idéia por não ter compreendido bem o seu verdadeiro significado. Preferi usar a palavra hipocrisia para me referir à contraditória política de direitos humanos dos EUA.
Esta semana, ao ler os noticiários e ver a ignominiosa notícia estampada em sites do mundo inteiro de que uma série de documentos secretos divulgados pelo WikiLeaks revelam informações detalhadas sobre a base militar norte-americana sediada em Cuba (Guantánamo) e que a maioria dos que lá se encontram enclausurados e são constantemente torturados eram ou são inocentes, tento buscar um termo que melhor defina as argumentações do neo Big Stick americano em relação ao seu discurso panfletário de democracia e liberdade: seria uma dupla moral ou hipocrisia?
Recorrendo aos dicionários virtuais, percebo, finalmente, que há uma distinção sutil entre a “doble moral” e a hipocrisia. Esta última, como lembra o Wikipédia (não confundir com o WikiLeaks), implica a aceitação de um só critério moral, mas há o descumprimento sistemático na prática (façam o que eu digo, mas não o que eu faço). A “doble moral”, por sua vez, é um critério moral que se aplica com mais rigor em um grupo que em outro.
Imagine se fosse a Venezuela, Irã, Bolívia, Coréia do Norte e outros países pretendentes a se ingressarem no eixo do mal que mantivessem uma prisão do naipe de Guantánamo? A começar pela ilegalidade da ocupação do território cubano por outra nação baseada em uma Emenda (Platt) totalmente caduca nos tempos atuais, a política externa estadunidense é condenável em todos os sentidos.
Mas os EUA podem. Podem tudo. Inclusive zombar dos povos e nações ao soltar uma nota oficial, em conjunto com o Pentágono, lamentando o vazamento das informações e considerando “(…) triste que várias organizações midiáticas tenham tomado a decisão de publicar vários documentos obtidos de forma ilegal pelo WikiLeaks relacionados com o centro de detenção de Guantánamo". A velha pergunta: “doble moral” ou hipocrisia? Neste caso, fico com as duas.
Triste e ilegal é a prisão de Guantánamo que Obama prometeu fechar e que ainda hoje “abriga” sabe-se lá quantos prisioneiros nas mais ultrajantes condições, sem julgamento. Triste e ilegal é o prisioneiro de Guantánamo ter que provar que não é terrorista, tendo o seu pressuposto de inocência negado. Triste e ilegal são as bárbaras e freqüentes torturas…
Menos triste e ilegal, entretanto, seria se o único campo de concentração mantido pelos EUA fosse Guantánamo. Mas longe disso: Em 2006, o então presidente George W. Bush confirmou a existência de prisões secretas da CIA espalhadas pelo mundo. Mesmo sem saber o número certo, segundo informações de entidades como a Anistia Internacional foi constatada que elas estão presentes em países da África, Ásia e na América, em uma rede que pode ultrapassar mais de cem países envolvidos.
O velho dilema se arrasta… “Doble moral” ou hipocrisia? A esta altura do campeonato começo a pensar em fundir as duas expressões e usar um termo que o brasileiro criou e que se encaixa como uma luva nestes vendilhões do discurso pró-direitos humanos dos Estados Unidos: caras-de-pau!
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