Todas as vidas
Vive dentro de mim uma cabocla velha de mau-olhado,
acocorada ao pé do borralho, olhando pra o fogo.
Benze quebranto. Bota feitiço... Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro. Ogã, pai-de-santo...
Vive dentro de mim a lavadeira do Rio Vermelho,
Seu cheiro gostoso d’água e sabão. (...)
Vive dentro de mim a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Vive dentro de mim a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda, desabusada, sem preconceitos,
de casca-grossa, de chinelinha,
e filharada. (...)
Vive dentro de mim a mulher roceira.
– Enxerto da terra, meio casmurra.
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta. (...)
Vive dentro de mim a mulher da vida.
Minha irmãzinha... tão desprezada, tão murmurada...
Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera das obscuras.
Cora Coralina
Mesmo sabendo que só um dia, um poema só não bastam para falar da grandeza e da rutilância transcendental da mulher para a humanização do homem e a condução da vida na terra, – mesmo que seja uma oração de Cora Coralina, – mas é o que lhes posso oferecer como justa, muito justa, mais que justa homenagem a seu dia. Lembrança em uma só data na folhinha é injustiça grande com quem personifica a importância. São vocês, as mulheres, que enfeitam o mundo e fazem a vida possível e suportável.
Omar dos Santos
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