Após intensas batalhas, trabalhadores da Amazon e Starbucks conquistam vitória inédita. Uma nova cara sindical desponta: jovens precarizados, inspirados pelo Black Lives Matter e dispostos à auto-organização e a disputar futuro do trabalho
Antes da pandemia de COVID-19, essas recentes vitórias trabalhistas teriam provavelmente parecido inimagináveis. Poderosas, ricas corporações como a Amazon e a Starbucks pareciam então invencíveis, ao menos no contexto das normas do Conselho Nacional de Relações Trabalhistas (National Labor Relations Board), que permanecem radicalmente contra trabalhadores pró-sindicatos. Sob as normas do NLRB, a Amazon e a Starbucks podem –e o fazem– forçar trabalhadores, sob ameaça de demissão, a comparecer a reuniões anti-sindicais, com frequência conduzidas por consultores externos muito bem pagos.
A Starbucks tem dito ser “firme em repudiar quaisquer queixas de atividade anti-sindical. Elas são categoricamente falsas”. Mas, em março de 2022, o NLRB alegou que a rede de cafés havia coagido trabalhadores, colocado simpatizantes sindicais sob vigilância e os retaliado. De forma semelhante, a Amazon –que no passado chegou a convocar através de anúncios analistas que monitorassem “ameaças de organização trabalhista”– passou a afirmar que respeita o direito dos trabalhadores de se associar ou não se associar a sindicatos.
A significância das recentes vitórias não diz respeito, antes de tudo, aos 8 mil novos membros de sindicato na Amazon ou ao fluxo gradual de novos membros de sindicato na Starbucks. Trata-se de instilar nos trabalhadores a crença de que, se trabalhadores pró-sindicais conseguem vencer na Amazon e na Starbucks, eles podem vencer em qualquer lugar.
Precedentes históricos mostram que a mobilização trabalhista pode ser contagiante. Em 1936 e 1937, trabalhadores na fábrica da General Motors em Flint fizeram a poderosa fabricante de automóveis dobrar os joelhos com uma greve geral que logo inspirou ação semelhante em outros lugares. Nas palavras de um doutor de Chicago, ao explicar uma paralisação subsequente das amas-de-leite na cidade, “é só uma daquelas coisas engraçadas. Elas querem fazer greve porque todos os outros estão fazendo.”
A pandemia criou uma oportunidade para os sindicatos. Após trabalharem na linha de frente por mais de dois anos, muitos trabalhadores essenciais, tais como os da Amazon e da Starbucks, acreditam não terem sido recompensados adequadamente pelo serviço nem tratados com respeito por seus empregadores. Isso parece ter ajudado a aumentar a popularidade do Amazon Labor Union e do Starbucks Workers United.
A natureza local dessas campanhas impede a Amazon e a Starbucks de empregar a máxima que está há décadas no âmago das campanhas anti-sindicais corporativas: que um sindicato é uma “terceira parte” externa que não compreende nem se importa com as preocupações dos empregados e está mais interessado em arrecadar contribuições.
Mas tais argumentos soam vazios quando as pessoas que estão fazendo a sindicalização são colegas com os quais trabalham lado a lado no dia a dia. Isso tem o efeito de anular o argumento central de campanhas anti-sindicais, a despeito dos muitos milhões de dólares que as companhias com frequência injetaram nelas.
Essa “auto-organização” na Starbucks e na Amazon é coerente com o que foi previsto pelos autores do Decreto Wagner de 1935, o estatuto que estipula o fundamento dos procedimentos de representação sindical de hoje. O primeiro presidente do Conselho Nacional de Relações Trabalhistas, J. Warren Madden, compreendeu que a auto-organização poderia ser fatalmente minada se deixassem as corporações se empenharem em táticas de pressão anti-sindicais:
“Sobre este princípio fundamental –de que um empregador não deve meter as mãos na auto-organização dos empregados– a estrutura inteira do decreto se assenta”, escreveu. “Qualquer transigência ou enfraquecimento desse princípio ataca a raiz da lei.”
Durante mais da metade do século passado, corporações anti-sindicais e seus consultores e firmas de advocacia –amparados por NLRBs controlados por republicanos e por juízes de direita– têm sabotado o processo de auto-organização do trabalhador ao permitir que as eleições sindicais fossem dominadas pelo empregador.
Mas, para que o declínio a longo prazo na associação sindical seja revertido, creio que trabalhadores pró-sindicais precisarão de proteções mais robustas. A reforma da lei trabalhista é essencial para que os quase 50% de trabalhadores norte-americanos não-sindicalizados, que dizem querer representação sindical, tenham qualquer chance de obtê-la.
A falta de interesse popular tem sido durante muito tempo um obstáculo à reforma da lei trabalhista. Uma reforma significativa da lei trabalhista é improvável de acontecer a menos que as pessoas estejam envolvidas com as questões, as compreendam e acreditem que tenham um papel no resultado. Mas o interesse da mídia nas campanhas na Starbucks e na Amazon sugere que o público norte-americano pode estar, afinal de contas, prestando atenção.
Não se sabe aonde este último movimento –ou momento– trabalhista irá chegar. Pode evaporar ou poderia simplesmente animar uma onda de organização por todo o setor de serviço com baixos salários, estimulando um debate nacional acerca dos direitos dos trabalhadores durante o processo.
As maiores armas que as corporações anti-sindicais possuem para sufocar o ímpeto trabalhista são o medo de retaliação e a sensação de que a sindicalização seja inútil. Os recentes sucessos mostram que a sindicalização não parece mais ser tão assustadora ou tão inútil.
John Logan é Professor e Diretor do Departamento de Estudos de Trabalho e Emprego na San Francisco State University
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12