Fontes: Rebelión / Socialismo y Democracia [Imagem: Homem mendigando comida no Brasil. Créditos: Karime Xavier/Folhapress]
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Neste artigo, o autor mostra as diferenças entre os governos do PT e Bolsonaro no combate à fome e argumenta que o futuro governo Lula terá que fazer um esforço enorme para mais uma vez tirar o Brasil do mapa da fome.
O último relatório divulgado esta semana pela Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) revelou números dramáticos sobre a situação de miséria e fome neste país que, paradoxalmente, é um grande produtor e exportador de alimentos (carne , açúcar, café, soja e suco de laranja, entre outros itens). Por isso, a pergunta que fica no ar é como um país que está entre os maiores exportadores de alimentos do mundo permite que uma parte significativa de sua população não coma.
Segundo esta pesquisa, seis em cada dez brasileiros não têm segurança alimentar. Isso representa mais de 125 milhões de pessoas, o que confirma um aumento de 60% em relação aos números de 2018. Dentro desse número, há 33 milhões de pessoas que passam fome no país. O documento destaca ainda que a fome atinge especialmente as populações negras, já que 65% dos domicílios chefiados por pretos e pardos convivem com problemas de abastecimento de alimentos. Em termos concretos, o número de pessoas que sofrem com o flagelo da fome no Brasil hoje é muito superior ao registrado há 30 anos, quando os primeiros programas de combate à pobreza e à fome começaram a ser promovidos desde a redemocratização do país.
De acordo com o mesmo relatório, neste ano de 2022, 1 em cada 3 brasileiros já teve que procurar alguma fórmula para conseguir alimentos dos quais se envergonham ou ficam tristes. São milhares de famílias que tiveram que recorrer a aterros sanitários para buscar comida diária entre as sobras que devem lutar com urubus, javalis e outros necrófagos. O Brasil sempre foi um país desigual, mas os níveis de indignidade a que milhões de cidadãos foram lançados é algo que não se via desde tempos imemoriais. São dilacerantes as imagens de famílias inteiras aproveitando a escassa carne que fica entre os ossos depositados nos lixões para saciar uma fome excessiva. Há, aliás,
Especialistas que trabalham com a questão da pobreza têm demonstrado enorme preocupação com o desmantelamento dos programas Fome Zero ( Fome Zero ) e Bolsa Família , implementados nos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff no governo do Partido dos Trabalhadores (P.T.). O governo de extrema-direita de Bolsonaro substituiu este último por um chamado Auxilio Brasil, que não tem o alcance, nem a capilaridade, nem o impacto que o programa Bolsa Família teve.
Nesse programa, 44 milhões de famílias receberam a contribuição direta do Estado, reduzindo -já nos primeiros anos- a pobreza (extrema ou moderada) entre 25 milhões de habitantes. No caso da Ajuda Brasil, apenas 14 milhões de famílias recebem ajuda. Isso significa que cerca de 30 milhões de famílias ficaram sem receber esse benefício, cujo corte foi feito sem nenhum critério técnico. Muitas famílias foram excluídas simplesmente porque se decidiu arbitrariamente destinar menos recursos para as políticas sociais. Tal situação contrasta radicalmente com o conjunto de benefícios concedidos às Forças Armadas, que recebiam auxílio até na aquisição de artefatos bizarros e suspeitos para reforçar a virilidade dos militares, a saber, próteses penianas, viagras e outros acessórios semelhantes.
Da mesma forma, o atual governo pretende encerrar o programa no final deste ano, o que deixaria milhões de famílias sem assistência monetária para enfrentar os déficits alimentares que vivenciam há anos, deficiências que também foram agravadas pela pandemia. Para adicionar obstáculos aos potenciais beneficiários da transferência de renda, o governo impôs um sistema que opera pela Internet por meio de um computador ou telefone celular. Ou seja, as famílias em situação de extrema pobreza estão excluídas de qualquer tipo de auxílio por não terem as condições mínimas para acessá-lo.
Outro fato que preocupa os especialistas é o fato de que a população que sofre o impacto da fome e da desnutrição tem muitas possibilidades de comprometer seu desenvolvimento físico e intelectual no futuro, o que só reproduz as estruturas de exclusão e limitação de oportunidades para milhares de crianças e jovens pessoas que foram afetadas por deficiências nutricionais. Como se vê, este cenário só aumenta os níveis de incerteza vividos pela população mais vulnerável antes das eleições de outubro.
Quando assumiu seu primeiro governo, em 1º de janeiro de 2003, Lula da Silva prometeu tirar o Brasil do mapa da fome. Para isso, o governo começou a trabalhar para garantir dois elementos essenciais para esse fim. Primeiro, apoiar a agricultura familiar para aumentar a produção de alimentos para consumo doméstico e, segundo, que a população mais pobre tenha acesso a renda suficiente para comprar esses alimentos.
Considerando que Lula da Silva pode vencer a próxima disputa eleitoral, é de se esperar que ele substitua aqueles programas sociais emblemáticos dos 18 anos do governo petista, embora o revés causado pelo governo Bolsonaro seja de tal magnitude que um esforço será necessário redobrar para restabelecer as condições de segurança alimentar da população brasileira.
Fernando de la Cuadra é doutor em Ciências Sociais, editor do blog Socialismo y Democracia e autor do livro De Dilma a Bolsonaro: itinerário da tragédia sociopolítica brasileira (Editora RIL, 2021).Rebelión publicou este artigo com a permissão do autor através de uma licença Creative Commons , respeitando sua liberdade de publicá-lo em outras fontes.
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