segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Chegou a hora de parar de ter medo do fascismo

Jair Bolsonaro (Foto: Alan Santos/Presidência da República)

"É a hora em que o sistema de Justiça precisa deixar de temer Bolsonaro e os delinquentes que estiveram ao lado do derrotado", defende Moisés Mendes

Por Moisés Mendes

Não queriam que Lula desfilasse em carro aberto porque poderia levar um tiro. Ele desfilou. Não queriam que subisse a rampa do Planalto. Ele subiu.

O medo despejado sobre Lula e sobre o povo que iria a Brasília vinha não só de lideranças da extrema direita e dos terroristas. Partia também, com ênfase surpreendente, de setores da esquerda.

Mas Lula não se submeteu ao terror e não seguiu a recomendação de quem dizia estar ao seu lado como conselheiro do bom senso e do sempre oportunista alerta do eu-to-avisando.

Lula fez o que deveria ser feito, e o povo esteve ao seu lado o tempo todo, apesar do clima criado pelos espalhadores de medos.

No discurso no Congresso, Lula relembrou que na eleição de 2002 também havia sido assim. A esperança precisava vencer todos os medos.

Lembrou que estava ali de novo, eleito e diplomado para o terceiro mandato, porque temores infundados haviam sido vencidos.

Mas o medo disseminado em 2022 não era mais o mesmo medo de duas décadas antes.

O medo na primeira eleição vinha do esforço para passar insegurança diante da terceira tentativa de um operário de esquerda de chegar à presidência. A direita espalhava que não deveriam confiar naquele barbudo.

O medo de 2022, que vem desde antes do golpe de 2016 contra Dilma, é o que dissemina as várias formas de terror do fascismo na carona do lavajatismo.

O brasileiro passou a ter medo de Bolsonaro, dos filhos dele, dos militares, dos milicianos e de toda a estrutura de poder aparelhada em torno de quem ameaçou matar inimigos na ponta da praia.

O medo paralisou o sistema de Justiça. Permitiu que extremistas perseguissem jornalistas, sem reação das suas corporações. Imobilizou autoridades que deveriam estar cumprindo com suas obrigações e prerrogativas.

O medo venceu as instituições, com as exceções conhecidas. Bolsonaro avisava que, num segundo mandato, tudo seria muito pior.

Criminosos agiram com desenvoltura em várias frentes, das milícias digitais aos vampiros das vacinas e pastores das barras de ouro.

E todos ficaram impunes, com a contenção pontual apenas de integrantes do terceiro time do bolsonarismo e de manés e patriotas.

O vacilo das instituições trouxe todo tipo de bandido graúdo livre e solto até aqui, com Bolsonaro à frente deles.

O ponto alto da afronta foi a fuga do derrotado para Orlando. E num avião da FAB.

Bolsonaro fugiu como quis porque não vai temer agora o que não o atemorizou em quatro anos de desmandos e de crimes.

O brasileiro comum tinha medo desse poder sem limites, porque as autoridades que deveriam defendê-lo estavam recolhidas e, nos casos mais graves, acovardadas.

Os militares, os milicianos, os cúmplices de Bolsonaro no setor privado, os milionários financiadores do golpe, os manés, os patriotas armados, os garimpeiros, todos eles disseminaram medos.

A grande imprensa frouxa passou a trabalhar com medo. Servidores públicos sofreram perseguições. O fascismo caçou artistas e matou negros, pobres, índios, gays, trans.

A universidade foi amordaçada por mandaletes da família e não reagiu. Os estudantes sumiram.

O Brasil com medo quase reelegeu Bolsonaro. Mas a eleição e a festa da posse começam a encerrar o período de propagação do terror.

O povo foi a Brasília para dizer que nem os setores medrosos da própria esquerda conseguiriam sabotar seu direito de estar com Lula.

Lula e o povo ofereceram uma lição de destemor, principalmente a quem tem agora a obrigação de dar encaminhamento às reparações.

Não é hora de caçar bruxas, como dizem certos emissários dos garimpeiros da Faria Lima. Bruxas, não.

É a hora em que o sistema de Justiça precisa deixar de temer Bolsonaro e os delinquentes que estiveram ao lado do derrotado.

Não tenham medo. Não peguem as bruxas. Peguem os criminosos, mas não só os manés.

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